Retratos vianenses!
Imagem do lugre "Gaspar"
Foto de autor desconhecido
Viana do Castelo, 27 – Mar agitadíssimo, ontem (26), na barra. Quase maré feita avistam-se ao largo dois lugres: o “Gaspar e o “Brilhante”, que nos seus porões conduzem o resultado da pesca, que fizeram nos bancos da Terra Nova durante seis longos meses. Em terra, a corporação de pilotos prepara-se para, nas catraias e no gasolina se colocar na boca da barra a fim de, com sinais, indicar a entrada dos navios, que avançam.
De sobre os cais e em pontos altos, muitas pessoas assistem ao grandioso espectáculo que lhes proporciona o mar embravecido, a abrir as suas faces, parecendo querer tragá-los, fugindo, impelidos pelo vento, à sua fúria. O “Gaspar” adianta-se e o “Brilhante” fica-se a perder de vista, parecendo não poder puxar devido a qualquer avaria na mezena.
Do semáforo fazem sinais que do “Gaspar” dizem não distinguir; mas o soberbo veleiro, como que a envaidecer-se da sua marcha, vem garimpando e toma as marcas da barra, como se a bordo viesse o mais experimentado prático. É que o seu arrojado comandante, o sr. Manuel Mendes, bravo e sabedor marinheiro, sempre que entra no porto, toma tento que não desperdiça para dele fazer uso nas ocasiões difíceis, em que o mar, umas vezes brincalhão e outras desleal e cobarde, lhe queira pregar partida. E assim, altivamente, velas enfunadas, a dois rizes, o lindo lugre, umas vezes cortando as vagas, outras vezes por elas varrido de proa à popa, entrou a barra e foi ancorar no Cabedelo, onde se encontra.
No mar ficou o “Brilhante” que, mais tarde, se fez ao largo, visto a noite parecer apresentar-se de mau cariz, como, efectivamente se apresentou, soprando vento rijo e trovejando fortemente. Às 9 da noite ainda foram vistos os seus faróis.
A chuva causou enxurradas. A violência do temporal fez cair o tapamento que separava o recinto da doca de uma cordoaria, que lhe fica adjunta, esgalhou árvores, partiu beirais dos telhados, claraboias e vidraças e escangalhou a barraca de um fotógrafo ambulante, que tinha assentado arraiais na Nova Avenida. No auge da tempestade pareceu que a terra estremecia e, segundo algumas pessoas esse tremor teria mesmo sido ocasionado por um abalo de terra.
Hoje, logo de manhã, mulheres do bairro piscatório e alguns pescadores foram para o alto da Senhora da Conceição da Rocha ver se no mar se divisava o lugre “Brilhante” que, na opinião dos entendidos, deve ter amarado o mais possível. Até agora ainda não apareceu. É provável que arribasse a qualquer porto espanhol.
A bordo do “Gaspar” vem um pescador do lugre “Esposende 3º”, de Caminha, que foi encontrado num dóri, no dia 21 de Agosto. Tinha uma grande ferida no pulso esquerdo, de muito mau aspecto, e que lhe ia contaminando o braço. O capitão do “Gaspar”, sr. Mendes tratou-o carinhosamente. Parece incrível que se deixe ir para o mar, a bordo de um destes navios, um homem no estado como foi encontrado o pobre pescador.
(In jornal “Comércio do Porto”, Domingo, 28 de Outubro de 1923)
De sobre os cais e em pontos altos, muitas pessoas assistem ao grandioso espectáculo que lhes proporciona o mar embravecido, a abrir as suas faces, parecendo querer tragá-los, fugindo, impelidos pelo vento, à sua fúria. O “Gaspar” adianta-se e o “Brilhante” fica-se a perder de vista, parecendo não poder puxar devido a qualquer avaria na mezena.
Do semáforo fazem sinais que do “Gaspar” dizem não distinguir; mas o soberbo veleiro, como que a envaidecer-se da sua marcha, vem garimpando e toma as marcas da barra, como se a bordo viesse o mais experimentado prático. É que o seu arrojado comandante, o sr. Manuel Mendes, bravo e sabedor marinheiro, sempre que entra no porto, toma tento que não desperdiça para dele fazer uso nas ocasiões difíceis, em que o mar, umas vezes brincalhão e outras desleal e cobarde, lhe queira pregar partida. E assim, altivamente, velas enfunadas, a dois rizes, o lindo lugre, umas vezes cortando as vagas, outras vezes por elas varrido de proa à popa, entrou a barra e foi ancorar no Cabedelo, onde se encontra.
No mar ficou o “Brilhante” que, mais tarde, se fez ao largo, visto a noite parecer apresentar-se de mau cariz, como, efectivamente se apresentou, soprando vento rijo e trovejando fortemente. Às 9 da noite ainda foram vistos os seus faróis.
A chuva causou enxurradas. A violência do temporal fez cair o tapamento que separava o recinto da doca de uma cordoaria, que lhe fica adjunta, esgalhou árvores, partiu beirais dos telhados, claraboias e vidraças e escangalhou a barraca de um fotógrafo ambulante, que tinha assentado arraiais na Nova Avenida. No auge da tempestade pareceu que a terra estremecia e, segundo algumas pessoas esse tremor teria mesmo sido ocasionado por um abalo de terra.
Hoje, logo de manhã, mulheres do bairro piscatório e alguns pescadores foram para o alto da Senhora da Conceição da Rocha ver se no mar se divisava o lugre “Brilhante” que, na opinião dos entendidos, deve ter amarado o mais possível. Até agora ainda não apareceu. É provável que arribasse a qualquer porto espanhol.
A bordo do “Gaspar” vem um pescador do lugre “Esposende 3º”, de Caminha, que foi encontrado num dóri, no dia 21 de Agosto. Tinha uma grande ferida no pulso esquerdo, de muito mau aspecto, e que lhe ia contaminando o braço. O capitão do “Gaspar”, sr. Mendes tratou-o carinhosamente. Parece incrível que se deixe ir para o mar, a bordo de um destes navios, um homem no estado como foi encontrado o pobre pescador.
(In jornal “Comércio do Porto”, Domingo, 28 de Outubro de 1923)
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