quarta-feira, 29 de junho de 2011

História trágico-marítima (XV)


A colisão e afundamento do “ Begoña Nº 1 “

Afundamento do vapor hespanhol “ Bigonia “
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Hontem encontrava-se em perigo a sete milhas do Cabo da Roca o vapor hespanhol «Bigonia», em socorro do que tinha ido o rebocador «Walkirien», ao serviço da Mala Real Ingleza.
Quando o «Walkirien» chegou junto do «Bigonia» ainda alli estava o paquete inglez «Avontoron», com o qual chocara o barco hespanhol. Para o «Avontoron» já tinham passado bastantes tripulantes e o «Walkirien», depois de recolher a bordo a tripulação do barco hespanhol rebocou-o até defronte de Cascaes, no intuito de o encalhar. Não se pôde, porém, pôr em pratica este intento, pois que o «Bigonia» se afundou completamente.
O «Bigonia» que tinha 2.298 toneladas e 32 homens de tripulação, procedia de Argel, de onde trazia um carregamento completo de mineral para Brake. O choque com o «Avontoron» deu-se defronte do Cabo da Roca, sendo motivado pelo nevoeiro, começando logo o «Bigonia” a metter agua.
O «Avontoron» tem 1.095 toneladas e 22 tripulantes e procedia de Cardiff, donde trazia um importante carregamento de carvão. O «Avontoron» entrou tambem hoje no Tejo. Estão salvos todos os tripulantes do barco afundado.
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Cópia (sic) da notícia publicada no jornal “O Comércio do Porto”, de 20 de Setembro de 1922.

Depois de algum exercício de pesquisa, para confirmar as características de ambos os navios envolvidos na colisão, concluí tratar-se de:

“ Begoña No. 1”
1920-1922
J.M. de Urquijo & Cia., San Sebastian, Espanha

Construtor: W. Gray & Co., Ltd., West Hartlepool, 02.1899
ex “Craigleith”, Russel Huskie & Co., Inglaterra, 1899-1900
ex “Otoyo”, Garteiz & Mendialdua, Espanha, 1900-1920
Arqueação: Tab 3.460,00 tons - Tal 2.021,00 tons
Dimensões: Pp 100,58 mts – Boca 14,36 mts – Pontal 7,53 mts
Propulsão: Eng. Works, 1898 - 1:Te - 3:Ci - 275 Nhp - 11 m/h
Equipagem: 32 tripulantes
Afundado de acordo com o relato acima transcrito, em 19 de Setembro de 1922.

“ Avontown “
1915-1925
Town Line (London) Ltd.
Harrison, Sons & Co., Londres, Inglaterra

O vapor "Castillo Butron" ex "Avontown" em Leixões
Imagem de autor desconhecido - Col. Francisco Cabral

Construtor: A. Rodger & Co., Port Glasgow, Escócia, 12.1899
ex “Citrine”, William Robertson, Londres, 1899-1915
Arqueação: Tab 1.743,00 tons - Tal 1.095,00 tons
Dimensões: Pp 79,22 mts - Boca 11,40 mts - Pontal 5,15 mts
Propulsão: Muir & Houston, 1899 - 1:Te - 3:Ci - 167 Nhp - 11 m/h
Equipagem: 22 tripulantes
dp “Copeman”, G.A. Harrison, Londres, 1925-1931
dp “Pomaron”, L.W.B. Hitchin, Londres, 1931-1938
dp “Bilbao”, Governo Espanhol, 1938-1939
dp “Castillo Butron”, Governo Espanhol, 1939-1959
dp “Rio Jiloca”, Vasco-Cantabrica, Santander, 1959-1963
Demolido em Santander em Setembro de 1963

Esteve igualmente presente no local da colisão o salvadego “Valkyrien”, que esteve posicionado durante um longo período de tempo nos portos da costa ocidental portuguesa, tendo prestado relevantes serviços de assistência a larga quantidade de navios em perigo. Apresentava os seguintes detalhes:

“ Valkyrien “
1907-1948
A. SemZ. Svitzer’s Bjorg Enterprise, Copenhaga, Dinamarca

O salvadego "Valkyrien" no rio Douro
Imagem de autor desconhecido - Col. Francisco Cabral

Construtor: Akt. Burneister & Wain, Copenhaga, 09.1907
Arqueação: Tab 343,00 tons - Tal 118,00 tons
Dimensões: Pp 46,12 mts - Boca 7,68 mts - Pontal 3,99 mts
Propulsão: Burmeister & Wain, 1907 - 1:Te - 3:Ci - 97 Nhp - 11 m/h
Depois de vendido em 1948 foi adaptado a navio para transporte de carga convencional, tendo ainda navegado com os nomes “Knudshoved” e “Ingela”. Seguiu finalmente para abate a 1 de Agosto de 1974.

segunda-feira, 27 de junho de 2011

História trágico-marítima (XIII)


O encalhe e naufrágio do iate “ Modêllo “

Nota conforme a notícia publicada
no jornal “O Comércio do Porto”, de 23 de Abril de 1907

Também em Ílhavo foi noticiado este naufrágio, como segue:

No último Domingo, 21 de Abril, próximo das 11 horas da manhã, encalhou em frente ao farol de Ílhavo, na barra de Aveiro, o hiate “Modêllo”, da praça do Porto, de que eram mestre e contra-mestre, respectivamente, os Srs. Júlio António da Silva e João Chuvas. O navio que ia a sair a barra, a reboque, como desse em seco, o rebocador deu um esticão na amarreta, para o safar; nisto, porém, a amarreta partiu e o hiate guinou e como o mar estivesse muito bravo foi impelido à praia despedaçando-se, no embate das ondas.
In (Jornal “O Nauta”, Nº 131 de 25 de Abril de 1907)

O iate “Modêllo”, cujo construtor foi ignorado no registo da companhia classificadora, a “Bureau Veritas”, sugere ter sido uma construção da responsabilidade do mestre António Maria Bolais Mónica, no decorrer do ano de 1898.
Foi inicialmente concebido como palhabote, sendo utilizado na cabotagem internacional. Perde ambos os mastaréus em 1905, desde quando passa à classificação de iate, operando na cabotagem nacional. Conforme noticiado pertenceu a uma Sociedade, que teve como sócio maioritário o armador Amândio de Jesus Teixeira, do Porto.
Navegou com as seguintes características:

Nº Oficial: Não tinha - Iic.: H.F.S.L. - Porto de registo: Porto
Construtor: António Maria Bolais Mónica (?), Aveiro, 1898
Arqueação: Tab 137,30 tons - Tal 130,00 tons.
Dimensões: Pp 25,09 mtrs - Boca 7,48 mtrs - Pontal 2,75 mtrs
Propulsão: À vela
Capitães embarcados: António dos Santos Redondo (1898 até 1903) e Júlio António da Silva (1904 até 1907)
De acordo com a notícia que se explica por si, o navio perdeu-se por encalhe na barra de Aveiro, no dia 21 de Abril de 1907.

sexta-feira, 24 de junho de 2011

Regata de barcos rabelos no Douro - 2011


A regata de S. João no Porto

Não costumo faltar à tradicional corrida de rabelos, no rio Douro, que ano após ano, tem lugar no dia em que a cidade celebra o santo popular. Acontece quando a maré de enchente é propícia, tendo tido início pelas 17,45 horas, com as margens do rio bem preenchidas de assistência curiosa e atenta. A grande diferença deste ano em relações às edições anteriores, prende-se ao facto de estar munido da minha camera, com o intuito de partilhar algumas imagens com os amigos, cuja distancia os impede de estarem presentes.
Como seria também algo previsível houve um pouco de tudo; desorganização na largada, ligeiras colisões entre as embarcações e um breve encalhe no novo paredão da Afurada, que sugere ter sido simplesmente ignorado pelo rabelo da Offley. Mas não faltou a claridade dum dia magnifico, quente, mas com uma brisa de norte, fundamental para ajudar à festa. Enfim, passemos às imagens...

A concentração dos rabelos próximo ao Cabedelo

A navegar para o local de partida

A passagem do rabelo da Calem no Ouro

A chegada à ponte da Arrábida

A partida

O rabelo da "Dow's", que este ano fez equipa com a U.P.

O rabelo da "Ferreira"

Os rabelos da "Sandeman", "Taylor's" e "Dalva"

Os rabelos mais rápidos - da "Croft" e da "Calem"

E o rabelo da "Offley", por trás do molhe da Afurada,
resultado duma colisão, encalhe, que a regata não previu...

quinta-feira, 23 de junho de 2011

História trágico-marítima (XII)


O encalhe do “ Siva “

nm " Siva "
1923 - 1941
J.T. Salvesen & Co., Ltd., Grangemouth, Inglaterra

Notícia do jornal "O Comércio do Porto",
publicada em 2 de Fevereiro de 1941

Após desencalhado e rebocado para Lisboa, o navio foi vendido pelo proprietário inglês à Sociedade Geral, que o reparou nos seus estaleiros, tendo ainda navegado com o nome “Foca”, durante cerca de 20 anos, com as seguintes características:

O "Foca" numa das muitas escalas em Leixões
Imagem (c) Fotomar, Matosinhos

Nº Oficial: G-440 - I.i.c.: C.S.A.G. - Registo: Lisboa, 19-06-1942
Cttr.: Stavanger Stoeberi & Dok, Stavanger, Noruega, 1921
ex “Slotholm”, A/S Malm, Christiania, Noruega, 1921-1923
ex “Siva”, J.T. Salvesen, Ltd., Grangemouth, Inglaterra, 1923-1941
Arqueação: Tab 1.383,39 tons - Tal 776,34 tons - Pm 2.018 tons
Dim.: Ff 77,72 mts - Pp 73,83 mts - Boca 11,38 mts - Ptl 4,91 mts
Prop.: Stavanger Sloeberi, 1921 - 1:Te - 3:Ci - 132 Nhp - 9 m/h
Equipagem: 29 tripulantes
Demolido em Lisboa, durante o ano de 1961.

segunda-feira, 20 de junho de 2011

História trágico-marítima (XI)


O naufrágio do “ Hammonia “ (3)
Mais pormenores
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Demos ontem a explicação do sinistro, que parece realmente confirmar-se: a entrada de água no depósito do carvão de estibordo, por não ter sido bem fechado, ou por um golpe de mar ter feito ceder as porcas dos parafusos. Só a 120 milhas a oeste é que o capitão se apercebeu da avaria, mandando regressar o “Hammonia” a toda a velocidade. Infelizmente passadas poucas horas a água invadiu a casa das máquinas, sendo preciso apagar um grupo de caldeiras, o que retardou o salvamento. Podemos reconstituir hoje com mais precisão e novos detalhes a cena apavorante do naufrágio.
Desde as primeiras horas da madrugada alguns passageiros notaram a inclinação do transatlântico sobre estibordo, supondo contudo que era devida ao estado do mar. Só das 6 para as 7 é que todos se levantaram e dirigiram para a coberta, onde os mais animosos procuravam sossegar as mulheres e as crianças. A confusão era grande. O capitão dava ordens enérgicas procurando manter a ordem e a disciplina a todo o custo. Os passageiros que não estavam munidos de cintos de salvação voltaram aos seus camarotes, conforme instruções rigorosas recebidas nesse sentido, voltando depois a reunir-se aos seus companheiros na coberta. Entretanto os S.O.S. cruzavam-se em todas as direcções, pedindo desesperadamente um socorro, que já tardava a chegar.
Naturalmente devido ao grande número de passageiros e com o receio de que o transatlântico se afundasse dentro em pouco, às 10 e meia da manhã arriaram-se os escaleres do “Hammonia”. Desgraçadamente a confusão aumentou com as precipitações da manobra e com os primeiros náufragos que se debatiam nas ondas. Quando se avistou ao longe uma coluna de fumo, engrossando constantemente, e apareceram os mastros e o casco de um vapor que vinha em auxílio do “Hammonia” a toda a velocidade, a coragem e a esperança, que já tinham abandonado quase toda a gente, renasceram naqueles pobres corações. Era o “Kinfauns Castle”.
Logo que chegou à fala com o “Hammonia” recomeçou a faina trágica dos escaleres. O primeiro bateu contra o costado. As pessoas que o ocupavam caíram à água. Uma criança foi arrebatada dos braços de sua mãe. Quatro mulheres conseguiram suster-se, por espaço de 2 horas e meia, agarradas a tábuas que flutuavam, sendo finalmente salvas por um bote, que as recolheu ao “Euclid”. Uma menina e dois homens, ao voltar-se o segundo escaler, agarram-se a uma corda que pendia do costado. Ela esteve assim muito tempo, fazendo um enorme esforço, até que puderam iça-la por meio dum «croque», habilmente manejado. Eles parece que foram arrastados pelas ondas.
Durante 8 horas duma faina extenuante o “Kinfauns Castle” trabalhou no salvamento do “Hammonia”. À 1 da tarde apareceu o “Euclid”, que lutou com o mesmo denodo. Houve um passageiro do transatlântico alemão, o súbdito inglês M. Jubb, que praticou actos da maior valentia e heroicidade, chegando a atirar-se ao mar para salvar uma criança.
(In jornal “O Comércio do Porto”, de 15 de Setembro de 1922).

O naufrágio do “Hammonia”
Mais pormenores
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Segundo uma nota do capitão Day, comandante do “Kinfauns Castle” o “Hammonia” tinha a bordo aproximadamente 360 passageiros e 197 tripulantes, ao todo umas 557 pessoas. O “Kinfauns Castle” salvou e desembarcou em Southampton 150 homens, 70 mulheres e 40 crianças e 122 homens e 3 mulheres da tripulação. Total 385. O “Euclid” transportou para Vigo 42 tripulantes e 46 passageiros. Total 88. O “Soldier Prince” levou para Gibraltar 40 passageiros e 21 tripulantes, ao todo 61. O “City of Valencia” tomou a bordo 4 homens e 3 mulheres, salvos num escaler do “Kinfauns Castle”. Total 7.
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Por informação da «Hamburg Amerika-Linie» sabe-se que mais alguns passageiros e tripulantes foram recolhidos pelo “Darro”, “Bolway” e “City of Chester”.
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A «Hamburg Amerika-Linie» mandou abonar as seguintes quantias aos náufragos desembarcados em Vigo: 5 libras aos de 3ª classe, 10 libras aos de 2ª e 15 libras aos de 1ª. Os que desejarem seguir viagem podem faze-lo, embarcando no dia 23, no transatlântico holandês “Leerdam”. Os que desejarem rescindir o contrato podem faze-lo recebendo o preço do bilhete por inteiro, desde Vigo, sem desconto algum.
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O “Hammonia”, primitivamente “Hollandia” da Mala Real Holandesa, foi construído nem 1909 por Stephen & Son, de Glasgow e deslocava 7.197 toneladas.
(In jornal “O Comércio do Porto”, de 16 de Setembro de 1922)

Detalhes dos navios que participaram nas operações de salvamento:

“ City of Valencia “
1919 - 1934
City Line Ltd.
W.S. Workman, Glasgow, Escócia

O "City of Valencia" - Imagem Photoship.Uk

Construtor: Reiherstigs Schiffswerft, Hamburgo, 04.1908
ex “Roda”, Deutsche Damp. Kosmos, Hamburgo, 1908-1919
Arqueação: Tab 7.329,00 tons - Tal 4.539,00 tons
Dimensões: Pp 134,85 mts - Boca 16,13 mts - Pontal 9,02 mts
Propulsão: Reiherstigs, 1908 - 2:Te - 6:Ci - 532 Nhp - 11 m/h
Vendido para demolir em Blyth, a 20 de Maio de 1934.

“ Darro “
1912 - 1933
Elder Dempster Lines
Royal Mail Steam Packet Co., Belfast

O "Darro" - Imagem Photoship.Uk

Construtor: Harland & Wolf, Ltd., Belfast, 30.10.1912
Arqueação: Tab 11.484,00 tons - Tal 7.252,00 tons
Dimensões: Pp 152,61 mts - Boca 19,29 mts - Pontal 12,25 mts
Propulsão: Harland & Wolf, 1912 - 2:Qe - 8:Ci - 680 Nhp - 15 m/h
Vendido para demolir em Osaka, Japão, a 28 de Julho de 1933.

(Por associação de possibilidades)
“ Boldway ”
1922 - 1923
Saint Mary Steam Shipping Co., Ltd., Hull, Inglaterra
Cttor.: Furness, Withy & Co. Ltd., Hartlepool, 04.1906
ex “Bessborough”, Hull Steam Shipping, Hull, 1906-1910
ex “Gothic”, W.H. Cockerline & Co., Hull, 1910-1920
ex “Gothic”, Bride Steam Shipping, Hull, 1920-1922
Arqueação: Tab 3.807,00 tons - Tal 2.463,00 tons
Dimensões: Pp 103,63 mts - Boca 14,33 mts - Pontal 6,22 mts
Prop.: Richd., Westgarth, 1906 - 1:Te - 3:Ci - 317 Nhp - 12 m/h
dp “Dimitrius”, S. & C. Daniolos, Andros, 1923-1925
dp “Dimitrius L. Daniolos”, S. & C. Daniolos, 1925-1934
Vendido para demolir em La Spezia, Itália, a 20.07.1934

“ City of Chester “
1910 - 1934
Ellerman Lines Ltd.,
G. Smith & Sons, Ltd., Glasgow

O"City of Chester" - Imagem Photoship.Uk

Construtor: Barclay, Curle & Co. Ltd., Glasgow, 06.1910
Arqueação: Tab 5.413,00 tons - Tal 3.521,00 tons
Dimensões: Pp 125,12 mts - Boca 15,84 mts - Pontal 9,27 mts
Propulsão: Barclay, Curle, 1910 - 1:Te - 3:Ci - 362 Nhp - 11 m/h
Demolido em Dalmuir, Escócia, a 30 de Janeiro de 1932.

domingo, 19 de junho de 2011

História trágico-marítima (XI)


O naufrágio do “ Hammonia “ (2)

Há vitimas – O seu número
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Vigo, 12 de Setembro – Chegou a este porto o vapor “Euclid”, desembarcando os náufragos do transatlântico “Hammonia”. Os restantes sobreviventes foram transportados para Gibraltar no vapor “Soldier Prince” e para Liverpool no “City of Valencia”.
O último barco que prestou auxílio e ficou nas proximidades do “Hammonia”, até que este se afundou, foi o transatlântico “Kinfauns Castle”, que se dirigiu para Southampton com o maior número de náufragos, entre eles o capitão e o comissário do barco. O número de pessoas que iam a bordo era de 559, das quais 180 tripulantes. Os passageiros perderam todos os haveres. Contam os náufragos que, ao iniciar-se a submersão, a confusão foi completa a bordo do “Hammonia” entre a tripulação, sendo por esse motivo que o número de vítimas foi grande, afirmando alguns que se eleva a 50. Alguns náufragos dizem também que viram flutuar à superfície da água vários cadáveres de crianças.
Por enquanto ignora-se o número exacto de pessoas que pereceram na catástrofe. O capitão do “Kinfauns Castle” tentou rebocar o “Hammonia”, mas teve de cortar o cabo ao verificar que o afundamento se tornava rápido.
(In o jornal “O Comércio do Porto”, de 13 de Setembro de 1922).

O naufrágio do “Hammonia”

Mais pormenores
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O primeiro vapor a chegar em auxílio do transatlântico alemão foi o “Kinfauns Castle”. O segundo foi o “Euclid”, que aportou a Vigo com 85 náufragos – 41 tripulantes e 44 passageiros. Continua a ignorar-se a causa do sinistro.
Um dos sobreviventes, cozinheiro a bordo declarou o seguinte:
Pouco depois de sair de Vigo os passageiros notaram varias irregularidades no andamento do “Hammonia”, que não sabiam contudo explicar. No dia seguinte às 5 da manhã, notaram que o vapor voltava para trás com grossas avarias. O mar estava agitado. Às 6-½ os passageiros começaram a levantar-se e a subir à coberta, inteirando-se do perigo. O navio tombava um pouco sobre estibordo.
Às 7 todos estavam a pé na coberta, aguardando os acontecimentos, com um nervosismo fácil de explicar. Às 6 da manhã a água entrava em grande quantidade, ameaçando invadir as padarias e as cozinhas. À mesma hora foi preciso apagar um grupo de caldeiras, por igual motivo. A marcha do “Hammonia” retardou-se muito.
Um fogueiro atribui o afundamento à via de água, que atingiu a porta do depósito de carvão a estibordo. Talvez o compartimento não tivesse sido bem fechado em Hamburgo, ou as trancas ou as roscas dos parafusos tivessem cedido a um golpe de mar, permitindo a entrada de água.
O transatlântico tinha percorrido 120 milhas, a rumo de oeste, quando teve de regressar a toda a velocidade. Isto foi à meia-noite. A essa hora já era acentuada a inclinação sobre estibordo. Só às 7 horas da manhã é que os passageiros tiveram conhecimento exacto do perigo. Lançaram-se rádios pedindo socorro.
O primeiro navio a chegar foi o “Kinfauns Castle”, que se aproximou tanto quanto o permitia o estado do mar. Deu-se logo princípio ao salvamento, lançando-se à água os botes do transatlântico alemão. O primeiro com a precipitação da manobra, devido a não safar-se a tempo do aparelho foi bater contra o costado, afogando-se vários passageiros. O segundo não foi mais feliz. Ao cair na água um golpe de mar voltou-o, perecendo quase todos os seus desgraçados tripulantes. À 1 e meia da tarde chegou também ao local da catástrofe o “Euclid”, a toda a força das máquinas, começando imediatamente a ajudar o “Kinfauns Castle”.
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O terceiro oficial do “Hammonia” ao subir por uma escada de corda para o “Euclid” escorregou, ficando esmagado contra o costado do vapor.
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Um dos episódios mais lancinantes, a que os passageiros salvos se referem com profunda amargura, foi o sucedido a uma mãe, que, ao descer para o bote com três filhos pequenos, dois caíram às ondas, sendo impossível salvá-los.
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Ignora-se o número dos náufragos, porque os sobreviventes foram transportados uns para Vigo, outros para Gibraltar, Southampton e Liverpool. Fala-se porém em 20 passageiros, a maioria crianças e 40 a 50 homens da tripulação.
Todas as pessoas fazem os mais rasgados elogios ao capitão, que empregou os maiores esforços ao seu alcance para evitar a catástrofe e quando ela era irremediável, procurou manter a todo o custo a ordem e a disciplina a bordo, dando as melhores provas de abnegação e de sacrifício. Parece que não sucedeu o mesmo com a tripulação, porque 10 ou 12 homens, que faziam parte dela, só pensaram em si, embaraçando as manobras e dando causa a um tão elevado número de vítimas.
(In jornal “O Comércio do Porto”, de 14 de Setembro de 1922)

Detalhes dos navios que participaram nas operações de salvamento:

“ Kinfauns Castle “
1899 - 1927
Union-Castle Mail Steamship. Co. Ltd., Londres

O "Kinfauns Castle" - Imagem Photoship.Uk

Construtor: Fairfield Co. Ltd., Glasgow, 08.1899
Arqueação: Tab 9.656,00 tons - Tal 4.908,00 tons
Dimensões: Pp 157,06 mts - Boca 18,04 mts - Pontal 10,58 mts
Propulsão: Fairfield, 1899 - 2:Qe - 8:Ci - 1.663 Nhp - 16 m/h
Demolido em Hendrik-Ido-Ambacht, Holanda, 03.10.1927

“ Euclid “
1912 - 1931
Liverpool, Brazil & River Plate Steam Navigation
Lamport & Holt, Liverpool, Inglaterra

O "Euclid" - Imagem Photoship.Uk

Cttr.: Northumberland Ship Building Co. Ltd., Newcastle, 07.1911
ex “Horley”, Duo Steam Shipping, Ltd., Londres, 1911-1912
Arqueação: Tab 4.770,00 tons - Tal 3.096,00 tons
Dimensões: Pp 125,03 mts - Boca 15,85 mts - Pontal 8,53 mts
Propulsão: Earl’s Co. Ltd., 1911 - 1:Te - 3:Ci - 587 Nhp - 12 m/h
dp “Benvannoch”, Petrograd Steamers, Leith, Ingl., 1931-1935
dp “Marie Moller”, Nils & A. Moller, Leith, Inglaterra, 1935-1937
Danificado por incêndio em Holyhead Bay a 22.03.1937 e demolido em Troon, Escócia, a 15.07.1937

“ Michael L. Embiricos “ (petroleiro)
1919 - 1952
S.G. Embiricos, Andros, Grécia
Construtor: Caird & Co. Ltd., Greenock, 06.1918
ex “War Malayan”, Governo Inglês, 1918-1919
Arqueação: Tab 5.197,00 tons - Tal 3.158,00 tons
Dimensões: Pp 122,01 mts - Boca 15,94 mts - Pontal 8,69 mts
Propulsão: Caird & Co., 1918 - 1:Te - 3:Ci - 420Nhp - 11 m/h
dp “Dimitrius”, Bogiazides & Rallias, Grécia, 1952-1953
Perda total por encalhe em Flashes Reef, em 14.12.1953

“ Niceto de Larrinaga “
1916 - 1941
Larrinaga Steam Ship Co. Ltd., Liverpool
Construtor: Russel & Co., Port Glasgow, Escócia, 08.1916
Arqueação: Tab 5.591,00 tons - Tal 3.506,00 tons
Dimensões: Pp 134,05 mts - Boca 17,07 mts - Pontal 8,02 mts
Prop.: Rankin & Blackmore, 1916 - 1:Te - 3:Ci - 483 Nhp - 11 m/h
Torpedeado por submarino alemão na posição 27º32’N 24º24’W em 22.01.1941, com registo de 3 vítimas mortais.

“ Soldier Prince “
1901 - 1932
Prince Line Ltd.
Furness, Withy & Co. Ltd., Newcastle

O "Soldier Prince" - Imagem Photoship.Uk

Construtor: W. Dobson & Co., Newcastle, 12.1901
Arqueação: Tab 3.118,00 tons - Tal 2.029,00 tons
Dimensões: Pp 101,04 mts - Boca 13,50 mts - Pontal 5,30 mts
Propulsão: Blair & Co.,1901 - 1:Te - 3:Ci - 361 Nhp - 10 m/h
Vendido para demolir em Port Glasgow, em Junho de 1932.

quinta-feira, 16 de junho de 2011

História trágico-marítima (XI)


O naufrágio do “ Hammonia “ (I)

“Hammonia”
1922 - 09.09.1922
Hamburg America Packet A.G., Hamburgo, Alemanha

Imagem do "Hammonia" ex "Hollandia" ainda Holandês
Foto de autor desconhecido - Col. Photoship.Uk

Construtor: A. Stephen & Sons, Ltd., Glasgow, 03.1909
ex “Hollandia”, Mala Real Holandesa, Amesterdão, 1909-1922
Arqueação: Tab 7.291,00 tons - Tal 4.603,00 tons
Dimensões: Pp 127,92 mts - Boca 16,52 mts - Pontal 10,49 mts
Propulsão: A. Stephen, 1909 - 2:Te - 6:Ci - 945 Nhp - 14 m/h

(Notícia do jornal “O Comércio do Porto”,
de 10 de Setembro de 1922)

O naufrágio do “Hammonia”
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Os agentes, no Porto, da companhia Hamburg America Line, snrs. Burmester & Cª. Limitada, receberam carta de Vigo, com data de 9, com os seguintes pormenores:
O paquete “Kinfauns Castle”, “Euclid”, assim como “Niceto de Larinaga” prestaram auxílio, tendo o “Kinfauns Castle” recebido uma parte dos náufragos. A última notícia do dia 9 era que os restantes 200 náufragos tinham sido salvos por 3 vapores, parecendo depois que o “Hammonia” se afundou.
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Ainda acerca do naufrágio há mais os seguintes pormenores:
O naufrágio do “Hammonia” deu-se depois de este barco abandonar o porto de Vigo. O paquete começou a ser açoutado por uma rija ventania, ao mesmo tempo que as vagas avançavam sobre o convés. A bordo tomaram-se logo prevenções, mas as vagas eram alterosas e dentro em pouco algumas iam inundar as carvoeiras. Estancou-se a água, mas, num repente, a casa das máquinas foi inundada, vendo-se o pessoal de bordo impotente para evitar o naufrágio. Então o paquete, devido ao peso da água, começou a adornar.
O capitão do vapor, cerca das 11 horas, ordenou que a telegrafia sem fios mandasse um rádio para o mar, a fim de pedir socorro a qualquer navio que passasse próximo. O posto da telegrafia sem fios da Boa Nova (Leixões) recolheu também o rádio, ao mesmo tempo que outros vapores que por ali passavam. Logo pela rádio-telegrafia se perguntou qual a sua situação e posição, ao que de bordo responderam dizendo estar a 41º55’ de latitude norte e 10º50’ de longitude oeste, ou seja a 100 milhas do porto de Leixões ou a 90 milhas de Viana do Castelo.
O pedido de socorros foi imediatamente participado ao Chefe do Departamento Marítimo do Norte, assim como à Capitania do porto de Leixões. Aqui ordenou-se aos rebocadores “Tristão” e “Júpiter” que se aprontassem a fim de seguirem viagem, mas, pouco depois, era dada contra-ordem em virtude de se saber que eram desnecessários esses socorros. Ainda assim compareceram várias pessoas na Capitania a pedirem autorização de seguirem para o local do sinistro com os seus barcos gasolinas, mas foi-lhes respondido não serem necessários, mesmo porque não chegavam a tempo de prestar qualquer auxílio.
Pouco depois começaram a ser recebidas comunicações rádio-telegráficas informando do que se passava. O paquete só pôde comunicar a latitude e posição, não podendo acrescentar mais nada em virtude de começar a submergir-se lentamente. Foi nesta ocasião que, chamado pelo pedido de socorro, compareceu o paquete inglês “Kinfauns Castle”, de 9.656 toneladas, da The Union Castle Mail S/S Cº., de Londres, que fazia a carreira da África Oriental para Southampton e logo a seguir o vapor inglês “Euclid”, de 4.770 toneladas da Lamport & Holt Ltd., de Liverpool, o qual faz as carreiras para os portos da América do Sul, de onde regressava. Estes dois vapores são de grande lotação.
Quando o “Kinfauns Castle” e o “Euclid” chegaram junto do “Hammonia”, já se viam no mar os escaleres de bordo; os vapores que acabavam de chegar fizeram o mesmo e desta maneira começaram logo a receber os tripulantes. O paquete ia-se submergindo lentamente, o que, felizmente, dava tempo a proceder-se ao salvamento de todos os passageiros que eram, cerca de 1.000 como dissemos.
Daí a pouco, um destes barcos recebia um rádio do vapor grego “Michael E.”, de 5.197 toneladas, da S.G. Embiricos, de Andros, que do Mediterrâneo se dirigia para o norte de Espanha, comunicando que estava a 11 milhas do local do sinistro e que para lá avançava a toda a força das suas caldeiras. Na faina de salvamento, que começou a fazer-se o mais rapidamente possível, não se deu felizmente um único desastre pessoal. Enquanto se procedia a esse salvamento, o paquete “Hammonia” cada vez mais se ia afundando. Pouco depois apareceu, de facto, o vapor “Michael” e, a seguir, o vapor inglês “Soldier Pdin”, que também prestaram relevantes serviços.
Todos estes vapores, dotados com telegrafia sem fios a bordo, estiveram em constante comunicação com Vigo e com a estação da Boa Nova, em Leixões. O paquete começou a submergir-se à 1 hora e 50 minutos da tarde, desaparecendo por completo às 6 horas. Os passageiros salvos, e foram-no todos, dirigiram-se para Vigo uma parte e outros para Inglaterra.
(In jornal “O Comércio do Porto”, de 11 de Setembro de 1922)

sábado, 11 de junho de 2011

Navios de carga Portugueses


O vapor “ S. Vicente “
1916-1916 e 1920-1927
Transportes Marítimos do Estado

O vapor "S. Vicente"
Desenho de Luís Filipe Silva

Nº Oficial: 398-E - Iic.: H.S.V.I. - Porto de registo: Lisboa
Construtor: Bremer “Vulkan”, Vegesack, Alemanha, 12.1900
ex “Wurzburg”, Norddeutcher Lloyd, Bremen, 1900-1916
Arqueação : Tab 5.085,31 tons - Tal 3.246,30 tons
Dimensões: Pp 122,58 mts - Boca 14,36 mts - Pontal 8,36 mts
Propulsão: Bremer “Vulkan” - 1:Te - 3:Ci - 337 Nhp - 10,5 m/h
dp “Loanda”, Comp. Nacional de Navegação, 1927-1938

O vapor "S. Vicente" em estaleiro para manutenção
Foto de autor desconhecido - Imagem col. Francisco Cabral

O “Wurzburg” era um navio de carga alemão, da companhia N.D.L. (Norddeutcher Lloyd), de Bremen, utilizado regularmente na ligação entre portos europeus e portos na América do Sul. Aquando do início das hostilidades relacionadas com a Iª Grande Guerra Mundial, ao vapor foram dadas instruções para voltar à Alemanha, ou alternativamente, na impossibilidade de conseguir o regresso, deveria procurar refúgio em porto seguro de país neutro. Em função da proximidade das ilhas de Cabo Verde, a opção foi recorrer à protecção no porto de São Vicente, onde amarrou a 14 de Agosto de 1914.
Por força de decreto-lei o governo Português, fortemente influenciado pelo governo Britânico, decidiu-se pela requisição dos navios alemães espalhados pelos portos nacionais, no continente, ilhas e colónias, para aumento da parca tonelagem existente no país e simultaneamente para colaborarem no esforço de guerra. Em resultado dessa decisão, o “Wurzburg” foi capturado pelas autoridades nacionais, em Março de 1916, navegando para Lisboa, onde foi rebaptizado com o nome “S. Vicente”, passando desde então a integrar a frota governamental, sob administração dos T.M.E. (Transportes Marítimos do Estado), empresa pública recém criada para esse efeito.
Face à considerável quantidade de navios apreendidos, o “S. Vicente” seguiu para a Inglaterra com contrato de fretamento à companhia Furness, Withy, que por sua vez o cedeu ao governo Francês, que dele dispôs durante os anos da guerra, em viagens no Mediterrâneo, até proceder à sua devolução no decorrer de 1920. De novo em poder dos T.M.E. foi posicionado no trafego transatlântico, com saídas regulares para Nova Iorque, com escala no porto de Ponta Delgada, ilha de São Miguel, Açores, transportando passageiros e mercadoria.

Anúncio do "S. Vicente" na carreira do Brasil
Jornal "O Comércio do Porto", de 7 de Setembro de 1922

E praticamente em paralelo, por decisão dos T.M.E., ao navio foi-lhe atribuído um serviço regular para o Brasil, fazendo escalas nos portos de Santos e do Rio de Janeiro, para onde transportava todo o tipo de mercadorias, dispondo ainda de camarotes para passageiros. A oferta contemplava acomodações para passageiros em 3 classes económicas, em resultado do fluxo migratório do pós-guerra. Nas viagens de regresso à Europa, era rentabilizado o retorno com os porões carregados com café. Isto até ao governo considerar que era impossível contabilizar os continuados prejuízos da empresa, que há muito se encontrava em colapso financeiro, sendo acordada a venda do navio à Companhia Colonial de Navegação, em 1927, para quem navegou com o nome “Loanda”, até à ordem de venda para demolição, que teve lugar em Itália, numa última viagem para Génova, onde chegou a 26 de Agosto de 1938.