terça-feira, 27 de outubro de 2009

O "Ortega" da Pacific Steam


Nm “ Ortega “
1906 – 1927
Pacific Steam Navigation Co.
Liverpool, Inglaterra

O navio representado neste postal, faz parte duma colecção
de imagens obtidas em La Pallice - Rochelle, aquando da
passagem dos transatlânticos por esses portos, seguindo
para a América do Sul. O nome “Ortega” sugere o transporte
de emigrantes e / ou turistas com destino ao México.

Cttor.: Harland & Wolff, Ltd., Belfast, Escócia, 28.06.1906
Arqueação : Tab 8.075,00 to > Tal 4.510,00 to
Cpmts.: Pp 141,82 mt > Boca 17.16 mt > Pontal 10,94 mt
Máq.: Harland & Wolff, 1906 > 2:Qe > 1.125 Nhp > 15,5 m/h
Vendido para demolição em Briton Ferry, a 27.06.1927.

Coincidências

Após editar esta mensagem, não imaginam a minha surpresa, por encontrar durante o período de pesquisas, o anúncio da passagem do navio por Leixões, como possivelmente terá acto contínuo feito escala por Lisboa. Ficamos a saber, ter estado colocado a operar na carreira para o Chile e o Perú. Descobrimos uns quantos portos, nesses países, que desconheciamos por completo, motivo pelo qual o publico agora, pelo interesse que julgo merecer.

terça-feira, 20 de outubro de 2009

O navio Nº 108 do Lloyd Brasileiro


O “ Itu “ e / ou “ Almirante Alexandrino “

O paquete "Almirante Alexandrino" em Santos
Postal da colecção de Laire José Giraud

Em Junho de 1917, durante a época coincidente ao 1º grande conflito mundial, o governo do Brasil mandou capturar 45 embarcações Alemãs, que se encontravam refugiadas nos portos brasileiros, para reparação dos prejuízos causados por actos de guerra. Do total dessa frota, 34 navios ; 11 paquetes, 22 cargueiros e 1 veleiro, foram postos à disposição do Lloyd Brasileiro, que os manteve em actividade, durante o período entre 1922 e 1927, funcionando numa base de fretamento continuado.
Os anos de paz e prosperidade vividos no pós-guerra, levaram o governo a propor a compra desses navios pelas empresas de navegação, em 1927, tendo o Lloyd optado pela aquisição de diversas unidades, entre os quais estava incluído o paquete “Itu” (nome de baptismo com origem numa cidade no interior do Estado de São Paulo). Confirmado o negócio, houve desde logo a intenção de rebaptizar o vapor, homenageando um destacado oficial, a título póstumo, o ex-ministro da Marinha Almirante Alexandrino.
Apresentava então as seguintes características :

Nome : “ Almirante Alexandrino “ (P.A.U.C.)
Registo : Rio de Janeiro
Construtor : Reiherstiegs Schiffswerft, Hamburgo, 15.6.1900
ex : “Cap Roca”, Hamburg-Sud., D.G., 1900 até 1914
Refugiado no porto do Rio de Janeiro, desde Agosto de 1914. Capturado a 1 de Janeiro 1917.
ex : “Itu”, Governo Brasileiro, 1917 - 1927
Arqueações : Tab 5.786,00 to > Tal 3.690,00 to > Pm 7.062 to
Cpmts. : Ff 129,50 mt > Pp 125,38 mt > Bc 14,72 mt > Ptl 8,84 mt
Motor do construtor, Hamburgo, 1900 > 1:Qe > 413 Nhp > 12 m/h

Avisos de chegada e partida de Leixões
no jornal "O Comércio do Porto", 5 e 6 de Junho, 1927

Depois de percorrer o périplo europeu, com escalas em Hamburgo, Roterdão, Antuérpia e o Havre, chegou com 3 dias de viagem pela 1ª vez ao porto de Leixões, no dia 4 de Junho de 1927, para efectuar operações de carga, trazendo a bordo 25 passageiros e 4.505 toneladas de mercadoria em transito. Saiu no dia seguinte para Lisboa, onde iniciou a viagem de regresso ao Brasil.
Comemorando a passagem inicial por Leixões, a direcção e os agentes da Companhia, convidaram um alargado número de personalidades da cidade do Porto, merecendo a distinção de notícia de 1ª página no jornal “O Comércio do Porto”, no dia 6 de Junho, cujo relato transcrevemos pelo valor histórico do acontecimento, respeitando a grafia arcaica da época, que só viria a ser alterada posteriormente em 1940.
Em tempo, aproveito para relembrar a importância do encontro promovido pelo director do Lloyd Brasileiro, comandante Cantuária Guimarães e lamentar o facto de ter sido barbaramente assassinado, no Rio de Janeiro, no decorrer desse mesmo ano de 1927.

Jornal "O Comércio do Porto"
Notícia de 1ª página no dia 6 de Junho de 1927

Aproveitando a passagem do seu magnifico paquete «Almirante Alexandrino», - nome que só por si lembra a nobre figura do fallecido ministro da marinha da Republica irmã – pelo porto de Leixões, a direcção da Companhia de Navegação Lloyd Brazileiro, deu, ante-hontem à noite, realisação à ideia de levar a effeito uma festa de confraternização luso-brazileira, em que as nossas auctoridades, commercio, imprensa, etc., podessem avaliar da importancia dos serviços por e’la prestados às relações – espirituaes e commerciaes – dos dois paizes irmãos.
Deve estar satisfeita a direcção do Lloyd Brazileiro e com ella o agente geral da importante companhia em Portugal, snr. A. Pinheiro Guimarães, e o seu considerado representante n’esta cidade snr. João Diogo, pelo exito obtido.
O banquete de ante-hontem a bordo do «Almirante Alexandrino» revelou a todos quantos a elle assistiram, a par do progresso que o Brazil de hoje attingiu, quanto o Lloyd Brazileiro – Companhia que nos dá um exemplo que não soubemos imitar com os nossos lamentaveis T.M.E. – se esforça por aproximar dentro das suas possibilidades as relações entre Portugal e o Brazil, isto é, entre todas as forças marcantes dos dois paizes irmãos.
A fiel execução d’esse programa, que tem hoje já a melhor das realisações, deve-se, em grande parte, aos snrs. A. Pinheiro Guimarães e João Diogo, que n’elle téem posto o melhor da sua esforçada intelligencia.

== *** ==

O «Almirante Alexandrino» - que ante-hontem visitamos pela primeira vez – é um paquete moderno, cheio de conforto, luxuoso, asseado. Por toda a parte se nota a magnifica organisação da Companhia a que pertence.
Do antigo vapor allemão «Cap Roca» a importante empreza brazileira fez, depois de profundas modificações, o magnifico «Almirante Alexandrino» - um transatlantico modelar.
Deslocando 9.600 toneladas, o «Almirante Alexandrino», que sob a bandeira brazileira teve tambem o nome de «Itu», comporta logares para cerca de 700 passageiros, com 1ª classe, 3ª de camarote e 3ª geral. É seu comandante o snr. Tasso Augusto Napoleão e imediato o snr. Lauro Teixeira de Freitas, dois dos mais distinctos officiaes da marinha mercante brazileira. Vindo de Hamburgo, por Roterdão, Antuérpia e Havre, o «Almirante Alexandrino» entrou na sexta-feira de manhã em Leixões. À noite realizou-se o banquete, de que vamos dar leves notas.

Na luxuosíssima sala de jantar de 1ª classe, decorada a primor com flores e bandeiras do Brazil e Portugal, tomaram logar, em pequenas e elegantes mezas, cerca de 100 convidados da direcção do Lloyd Brazileiro : Na mesa de honra, os snrs, Consul do Brazil, o commandante Tasso Napoleão, secretario geral do governo civil, sub-chefe do Estado Maior da 1ª Região Militar e Chefe do Departamento Maritimo do Norte ; nas restantes, auctoridades civis e militares, altas individualidades do commercio, da industria, da finança, imprensa, etc.
Ao iniciar-se o banquete, servido primorosamente e durante o qual reinou o maior enthusiasmo, a orchestra de bordo - distinctos artistas allemães - executou os hynos Portuguez e Brazileiro, saudados com quentes salvas de palmas.
Ao champagne, o distincto commandante Tasso Napoleão pronunciou as palavras seguintes :
- A directoria da Companhia de Navegação «Lloyd Brazileiro», desejando manifestar o elevado apreço que lhe merecem os seus bons amigos do honrado commercio da cidade do Porto, dignou-se conceder-me a honra, de os vêr n’este momento aqui reunidos.
O snr. Commandante Cantuária Guimarães, que é o mais eminente e esforçado dos directores da nossa Companhia, sob cuja administração tem ella progredido, incumbiu-me de apresentar-vos as suas cordeaes saudações e os seus vivos agradecimentos pelo apoio que nos tendes dispensado, e ainda, assegurar-vos que o «Lloyd Brazileiro» não regateará esforços para melhorar os seus serviços, correspondendo à vossa confiança e ao vosso efficaz concurso para a prosperidade da nossa linha Rio - Lisboa - Hamburgo, que acaba de ser augmentada de mais um vapor por mez, e cujo objectivo principal é contribuir para a continuação e desenvolvimento das relações commerciaes entre os nossos dois paizes, que tantos interesses de ordem material e mormente moral, hão de para sempre unir em leal e immorredoura amizade.
Finalizando, agradeço ao snr. consul do Brazil o ter-se dignado comparecer e presidir à nossa festa, às respeitaveis auctoridades aqui presentes, aos dignos representantes da imprensa e a todos os nossos bons amigos, por cuja felicidade levanto a minha taça.
Em seguida, o snr. Adhemar de Mello, illustre consul do Brazil n’esta ciadade, - diplomata cuja obra para uma maior aproximação luzo-brazileira tem já feito sentir beneficos effeitos - leu o seguinte discurso, que os convidados aplaudiram calorosamente :
- Não foi sem grande sentimento de jubilo que recebi a resolução do meu distincto amigo, snr. A. Pinheiro Guimarães, agente geral do Lloyd Brazileiro em Portugal, de offerecer em nome da empreza que tão dignamente representa n’esta grande terra, um jantar, às altas auctoridades, ao commercio e à imprensa. E maior alegria e jubilo tive ainda quando vi o meu modesto nome incluido n’esta justa homenagem de agradecimento, realisada a bordo de uma unidade da marinha mercante da minha Patria. Explica-se perfeitamente a minha alegria pelas affinidades de coração e espirito que mo ligam ao agente geral do Lloyd Brazileiro em Portugal e, ainda, por que esta bella festa dá ensejo a que seja visitado e melhor conhecido um dos barcos da mais poderosa empreza de navegação da America do Sul.
O Lloyd Brazileiro, que servindo como effectivamente serve, a todos os portos do meu paiz, mantem, ainda, carreiras regulares, de carga e passageiros, entre o Brazil, as Americas e a Europa.
Tocam mensalmente em Leixões, nas suas viagens para o Norte e para o Sul, quatro navios. Verificando, de modo crescente, a preferencia dos carregadores para os seus barcos deliberou acertadamente a Directoria do Lloyd Brazileiro augmentar as suas escalas pelos portos portuguezes e, d’esse modo, muito em breve, dois novos navios tocarão normalmente em Leixões e em Lisboa.
Do que é, na realidade, o Lloyd Brazileiro, este bello paquete, que não é dos maiores, ancorado no seio carinhoso das aguas de Portugal, continue uma opulenta mostra.
Na direcção da companhia de navegação encontram-se administradores experimentados, entre os quaes prazeirosamente saliento o Commandante Cantuária Guimarães, official dos mais distinctos da Marinha de Guerra da minha pátria. É e’le o heroe das grandes transformações ultimamente introduzidas, para melhor, n’esta poderosa empreza, que hoje pode competir com qualquer companhia congénere. O trabalho verdadeiramente notavel que vem desenvolvendo está já sendo devidamente apreciado e muito ainda o Brazil pode esperar e reclamar da sua grande inteligencia, da sua formidavel capacidade e patriotismo.
Os commandos das varias dezenas de unidades que constituem a frota do Lloyd foram entregues a officiaes competentes, a marinheiros na verdadeira concepção da palavra e eu desejo deixar aqui registado o meu reconhecimento de brazileiro e funccionario ao Senhor Commandante Tasso Napoleão, pelo muito que vi e pude apreciar a bordo do «Almirante Alexandrino».
Todos vós conheceis, sem duvida, o papel que representam ao desenvolvimento commercial entre patrias differentes as companhias de navegação. De mim, vos direi que n’este terreno, o Lloyd tem contribuido efficazmente para o progresso do Brazil.
E já que falo, aqui, no desenvolvimento commercial, seja-me licito uma apreciação pessoal, nascida do conhecimento que tenho do meu paiz e do que até hoje pude observar em Portugal, minha segunda Patria. É necessario que não se desconheça que existe no Brazil formidavel preferencia para os produtos portuguezes. A concorrencia é grande e se não attingiu, até hoje, felizmente, essa preferencia, isto de fórma alguma poderá significar que a situação continue assim no futuro. Estejamos vigilantes e não nos deixemos seduzir por falsas asserções, phantasticamente prejudiciaes. O consumidor brazileiro é exigente e chega ao ponto de se desinteressar da parte pecuniaria quando deseja obter um bom producto.
Exporte Portugal para o Brazil, como até aqui, mas em maior escala os seus melhores vinhos e a collocação será fácil. Está no interesse do honrado commercio portuguez fazer uma exacta demonstração d’aquillo que realmente produz e em grande quantidade e não será licito acceitarmos, sem estudo, as declarações que véem de lá e que aqui me téem sido varias vezes repetidas de que o vinho de alto preço não interessa ao consumidor brazileiro.
O tempo dirá com quem fica a razão. O Lloyd Brazileiro espera corresponder à confiança que n’elle vem depositando, desde muito, o commercio do Porto, aqui representado brilhantemente pelas suas mais salientes figuras.
Tomo como uma nova demonstração de sympathia e amizade pelo Brazil a vossa presença n’este jantar. Lamento sinceramente que, por motivo de molestia, não possamos contar entre nós a figura insinuante, respeitada e querida de sua exca. o snr. tenente-coronel Nunes da Ponte, governador civil, aqui dignamente representado pelo snr. Dr. Costa Lobo, secretario geral do governo civil. A ausencia do Porto do illustre official a quem o governo da Republica confiou o commando da Região Militar, sua exca. o snr. coronel Craveiro Lopes, priva-nos tambem da satisfação de vel-o incluído entre os convivas. Como seu representante destaco o meu nobre amigo, sua exca. o snr. Capitão Joviano Lopes, chefe do Estado Maior, official dos mais distinctos do glorioso exercito portuguez, disciplinado e disciplinador, homem de grandes qualidades de intelligencia e coração, amigo certo do Brazil.
Vejo, ufano, ainda, entre as mezas que nos rodeiam, figuras respeitaveis da magistratura portugueza, numerosos legitimos representantes do honrado commercio, tendo à frente os illustres directores das associações de classe, todos os chefes e altos funccionarios das repartições officiaes e, ainda, a imprensa do Porto, altamente representada pelos seus maiores expoentes. A essa imprensa, que é um modelo, que aprecia sem apaixonamentos e exaggeros prejudiciaes, todas as occorrencias, vendo em tudo, exclusivamente, a grandeza e o bem estar da patria, o agente geral do Lloyd Brazileiro está effusivamente reconhecido pelas repetidas attenções que sempre recebeu, desde o primeiro dia da sua chegada a Portugal.
- O commercio é o baluarte das companhias de navegação, e o Lloyd Brazileiro, que tanto conforto traz hoje ao coração dos filhos do Brazil ausentes da sua terra, está sinceramente commovido pelo fidalgo acolhimento que tem encontrado em Portugal, a ponto de serem os seus navios os que mais carga recebem d’aqui para o Brazil.
Em nome do agente geral do Lloyd em Portugal e no meu próprio ergo a minha taça pela grandeza de Portugal, pela felicidade de seus grandes mandatarios, pela prosperidade do seu honrado e laborioso commercio e da sua nobre imprensa.
Por Portugal !
Pelo seu governo !
Pelo seu commercio !
Pela sua imprensa !
O snr. capitão Joviano Lopes, distincto sub-chefe do Estado Maior da 1ª Região Militar, fallando em nome do snr. comandante, que alli representava, saudou calorosamente a nação brazileira, que disse ser a continuação da nossa razão historica… Dissertou largamente sobre o Brazil moderno, àcerca da sua literatura, progresso artístico, exercito, marinha, etc.
- O Brazil – disse – perpetuará o nome portuguez se algum dia Portugal desapparecer !
Uma voz brazileira – Nunca !
E o snr. Joviano Lopes com um sorriso de patriota satisfeito pelo áparte d’além atlantico, passou a expôr o que tem sido a administração do Lloyd Brazileiro, deficitaria ainda há poucos annos e já hoje grandemente superada, realizando em três annos uma obra grandiosa devida aos seus gerentes competentíssimos, entre os quaes destacou os nomes do Comandante Cantuária Guimarães e do Dr. Andrade Figueira.
E concluindo :
- Como as mães, as irmãs e as noivas brasileiras ensinarão certamente aos seus filhos, irmãos e noivos os “Luzíadas”, eu saberei ensinar à minha filha um novo poema, esplendoroso, grande – que é o Brazil !
O snr. Ricardo Spratley, illustre presidente da Associação Comercial do Porto, referiu-se à prosperidade do Lloyd Brazileiro e chamou a attenção dos presentes para o que disse reputar um erro económico que, depois da guerra, começou a ser divulgado como remédio para a crise dos povos :
Os paizes devem bastar-se a si próprios – diz-se. O snr. Ricardo Spratley aponta as consequencias contraproducentes que esta theoria acarretaria, porquanto é evidente que as permutas commerciaes entre os paizes deixariam de existir e com ellas desapareceriam quási todas as relações entre os povos.
- O Lloyd Brazileiro – affirma – não teria então razão de existir. Por isso, me permitto chamar a attenção de v. exas. para esse erro económico.
Após algumas considerações do snr. A. Marques de Souza, considerado presidente do Centro Commercial do Porto, o eminente jornalista brazileiro B. Vianna Junior brindou, em elegantes e calorosas palavras, pela mãe-Pátria, por Portugal.
A assistencia, enthusiasmada pela brilhante oração do illustre brazileiro, ergueu-se para o aplaudir e a orchestra repetiu então os hymnos dos dois paizes.
Usaram ainda da palavra os snrs. secretario geral do governo civil e o capitão Joviano Lopes, afirmando este ultimo que o Brazil não foi descoberto por acaso, o que provou, relatando varios factos historicos. Na pessoa de Bazilio Viana o illustre sub-chefe do estado maior saudou, finalmente, a grande imprensa brazileira.
B. Vianna Junior ergueu-se, de novo, emocionado, referindo-se de esta vez ao emerito aviador Gago Coutinho.
- Vai inaugurar-se brevemente - diz - a linha aerea Tolosa - Buenos Ayres, atravez o Atlantico. Sabem quem está traçando o plano d’essa grande empreza? O venerando Gago Coutinho, que lá, no Rio, no seu quarto do Palace Hotel trabalha para a realisação da grandiosa empreza.
Foi, então, uma verdadeira apotheose à amizade luzo-brazileira. Vimos lagrimas em alguns olhos. É que, de facto, os corações de Portugal e do Brazil mais uma vez tinham dado o ósculo de irmãos queridos.

== *** ==

Era de madrugada quando os convivas começaram a retirar de bordo, trazendo inexquecíveis impressões das horas passadas n’essa encantadora festa que o «Almirante Alexandrino» marcará no seu diário como das mais gloriosas para a sua missão.

quarta-feira, 14 de outubro de 2009

Construção naval - Os grandes lugres...


Porquê ?

Lugre "Francisco Manoel" - o anúncio da venda

Em função do anúncio do navio supra, apuramos tratar-se dum lugre de 4 mastros, que à época mereceu rasgados elogios, pela capacidade apresentada pelos construtores navais, na tentativa de fazer mais e melhor.
Feliz coincidência : afinal a proposta abarcava três lugres, para construção simultânea nos estaleiros de Esposende, entre 1918 e 1919, correspondendo a um período de grande agitação laboral, decorrente dos primeiros anos no pós Iª Grande Guerra Mundial.
Com uma marinha mercante depauperada, urgia a necessidade de dispor duma frota capaz, para navegações costeiras e de longo curso, para em paralelo com os vapores capturados aos Alemães, suprir a enorme falta de navios, como acontecera anos antes, essenciais ao transporte dos mais elementares bens de consumo para o país. Puro engano !…
Inexplicavelmente, quase ninguém da ousada construção naval se revelou capaz de construir lugres com 4 e 5 mastros, que apresentassem condições de navegabilidade e durabilidade superior a três anos, sabendo agora, que alguns desses lugres não celebraram sequer um segundo aniversário com utilidade.
Por mais que o tenhamos tentado, ignoramos os comentários e os argumentos, que expliquem tamanho nível de incompetência. Isto, ao ponto de abdicarmos regionalizar os desvarios, porque construções na Figueira, Aveiro e Viana do Castelo, se revelaram igualmente perigosos fracassos.
Em Esposende, a situação das referidas construções foi idêntica, só que pior, quando ao mesmo tempo se multiplicou por três.
Decorridos 80 anos, de que forma se justifica tanta inépcia, sabendo que lugres de menor dimensão, patachos, palhabotes, iates ou chalupas, deram voltas ao mundo, operados e explorados por mãos nacionais e estrangeiras, cumprido o mar desde sempre e por longos anos, com total satisfação !

A construção em Esposende - Foto (c) Col. José Figueiras
Lugres "Espozende 1º", "Francisco Manoel" e "Troviscal"

Lugre de 4 mastros “ Francisco Manoel “
1918 – 1922
Armador : Vinagre, Borges & Cª., Porto

Nº Oficial : ?? > Iic.: ?? > Porto de registo : Porto
Cttor.: Domingos Carlos Ferreira & Filho, Esposende, 15.10.1918
Arqueação : Tab 436,00 to > Tal 392,00 to
Comprimentos : Pp 40,39 metros > Boca 9,60 metros
Máquina : Não tinha motor auxiliar
Capitães embarcados : Joaquim Marques Machado, 1918 a 1921
Vendido no Porto, foi desmastreado e adaptado a fragata de carga, ficando ancorada no rio Douro, a partir do ano de 1922.

Lugre de 4 mastros “ Troviscal “
1919 – 1921
Armador : Sociedade de Construção Naval, Esposende

Nº Oficial : ?? > Iic.: ?? > Porto de registo : Esposende
Cttor.: Domingos Carlos Ferreira & Filho, Esposende, 24.06.1919
Arqueação : Tab 441,00 to > Tal 396,00 to
Cpmts.: Pp 51,18 mtrs > Boca 9,88 mtrs > Pontal 4,72 mtrs
Máquina : Não tinha motor auxiliar
Capitães embarcados : Sebastião Domingos Magano, 1919 a 1921
Vendido em 1919 a Francisco Pinto da Fonseca, manteve o mesmo nome, tendo alterado o registo para a praça do Porto. Novamente vendido, encontrou comprador em Cuba, ficando registado em Havana, durante o ano de 1921.

Lugre de 4 mastros “ Espozende II “
1919 – 1921
Armador : Empresa de Navegação de Esposende, Esposende

O lugre "Espozende 2º" - Col. do Dr Bernardino Amandio
in "Os Estal. Navais de Esposende e Fão nos Séculos XIX e XX"

Nº Oficial : ?? > Iic.: ?? > Porto de registo : Viana do Castelo
Cttor.: José de Azevedo Linhares, Esposende, 15.12.1919
Arqueação : Tab 591,00 to > Tal 534,00 to
Cpmts.: Pp 56,08 mtrs > Boca 10,18 mtrs > Pontal 5,27 mtrs
Máquina : Não tinha motor auxiliar
Capitães embarcados : J. Francisco Ramalheira, 1920 a 1921
Vendido à Companhia da Guiné (Dr. João Pereira de Barros e outros), em 1920, manteve o mesmo nome, tendo alterado o registo para a praça do Porto. Condenado por inavegável, foi abandonado no porto de São Luiz do Maranhão, Brasil, no decorrer do ano de 1921.

segunda-feira, 12 de outubro de 2009

Havia dias assim…


24 de Abril de 1922

Nesta data, pelas 6 horas e meia da manhã, entrou em Leixões o vapor Inglês “Rossmore”, vindo arribado, por ter batido 3 vezes no fundo à saída da barra de Viana do Castelo, obrigando à utilização exaustiva das bombas de escoamento de água, para manter o navio a navegar. Este vapor que esteve no Porto, saiu do rio Douro em lastro, no passado dia 16, com destino a Viana do Castelo, onde carregou uma partida de toros de pinheiro, com destino a Cardiff, na Inglaterra.
A colisão com pedras submersas, que danificaram o casco do navio, teve lugar na véspera, à saída da barra de Viana, na maré da tarde, ainda com o piloto a bordo. Por dificuldade de manobra, o vapor acabou por colidir com uma embarcação de pesca, provocando-lhe o afundamento.
Já fora da barra o vapor emitiu sinais de perigo para terra, optando por seguir para Leixões, onde procedeu à necessária vistoria das avarias e respectiva reparação. Como resultado do inquérito levantado sobre a causa do sinistro, os responsáveis da Capitania do porto de Viana, apuraram ter havido negligência por parte dos pescadores, motivo pelo qual foram severamente punidos e penalizados.

O nm “Rossmore”
1907-1941
Nacionalidade : Cardiff, Inglaterra

Armador : Fort Shipping Co., Cardiff, Inglaterra
Cttor.: Murdock & Murray, Port Glasgow, Escócia, 03.1907
Arqueação : Tab 627,00 to > Tal 253,00 to
Cpmts.: Pp 54,92 mt > Boca 8,41 mt > Pontal 3,35 mt
Máq.: Ross & Duncan, Glasgow, 1907 > 1:Cp > 80 Rhp > 10 m/h
Afundado durante bombardeamento da aviação Alemã, a cerca de 12 milhas de Godrevy, Cornualha, País de Gales, a 25 de Março de 1941.

No mesmo dia, pelas 5 horas e meia da tarde, o vapor Dinamarquês “E.M. Dalgas”, saído do rio Douro, onde esteve a descarregar carvão, seguindo para Barry, na Inglaterra, como não pudesse desembarcar o piloto, por força do vento que se fazia sentir, foi a Leixões desembarcá-lo. Já com o piloto a caminho de terra, a embarcação ao sair do porto, próximo da barra, foi de encontro à ponta do Molhe Norte, sofrendo grave rombo na proa. Escoltado por rebocadores, voltou a entrar no porto para reparar. O molhe ficou igualmente danificado.

O nm “E.M. Dalgas”
1898-1928
Nacionalidade : Copenhaga, Dinamarca

Armador : Dampskibselskab Vendila, Copenhaga, Dinamarca
Cttor.: Grangemouth Dockyard Co., Grangemouth, Ing., 05.1898
dp “Bravo”, Rederi A/B Brantevik, Brantevik, Suécia, 1928-1934
dp “Frode”, Rederi A/B Frode, Estocolmo, Suécia, 1934-1952
Arqueação : Tab 1.554,00 to > Tal 915,00 to
Cpmts.: Pp 77,42 mt > Boca 11,22 mt > Pontal 5,52 mt
Máq.: Hutson & Son, Glasgow, 1898 > 1:Te > 160 Nhp > 12 m/h
Vendido para demolição em Grays, Essex, Inglaterra, em Dezembro de 1952.

terça-feira, 6 de outubro de 2009

Três imagens, uma história - o nm "Iano"


O peso duma boa imagem

Um dos aspectos interessantes quanto à procura de informação sobre navios antigos, acontece muitas vezes devido às imagens soberbas, que vamos encontrando num ou outro sítio da net. Pela capacidade de nos transportar ao local, inegável curiosidade e prazer da descoberta. A pesquisa revela-se tarefa complicada, mas a sorte favorece a teimosia. O texto que adicionamos às imagens, legenda explicativa de um momento, relata uma história. Como no caso deste cargueiro, vencido pela força da natureza…

O nm "Iano" - imagem Photoship.Uk

nm “ Iano “
E. Balducci, Itália
1949 – 1958

O nm "Iano" - imagem Photoship.Uk

Construtor : George Brown & Co., Greenock, Escócia, 03.1922
ex “Terneuzen”, A.C. Lensen, Terneuzen, Holanda, 1922- 1935
ex ”Terneuzen”, A.H. Smith, Londres, Inglaterra, 1935-1938
ex “Alresford”, Sea & Land Securities Ltd., Londres, 1938-1949
Arqueação : Tab 2.488 to > Tal 1.482 to
Comprimentos : Pp 88,45 mt > Boca 13,44 mt > Pontal 6,37 mt
Máq.: J.G. Kincaid, Greenock, 1922 > 1:Te > 258 Nhp > 9 m/h

O nm "Iano" - imagem Photoship.Uk

No dia 4 de Novembro de 1957, quando em viagem no canal de Inglaterra, o navio foi apanhado a meio dum violento ciclone, pelo que por decisão do capitão, a opção foi de resguardar a embarcação na baía de Sandown, na Ilha de Wight. Ainda por acção do vento e da forte agitação do mar, as ancoras garraram, levando o navio a encalhar na costa, em Yaverland, próximo a Culver Cliff. A difícil situação em que o navio se encontrava, levou ao imediato desembarque de 26 dos seus 30 tripulantes, mantendo-se os 4 restantes a bordo para reparar eventuais avarias e para preparar a reflutuação. Após diversas manobras efectuadas, sem resultado, foram chamados bulldozers, para colaborar na remoção de grande quantidade de areia e pedregulhos. Por fim desencalhado, foram constatadas avarias no casco de vária ordem, pelo que o navio seguiu viagem para o porto Belga de Zeebrugge, onde foi demolido, a 25 de Fevereiro de 1958.

domingo, 4 de outubro de 2009

O lugre "Gaspar" (Iº) de Viana do Castelo


Ainda sobre a frota Vianense

No sentido de colaborar na identificação de navios outrora construídos em Viana do Castelo, para um melhor conhecimento das embarcações à vela, que em determinadas épocas navegaram com a bandeira nacional, temos tido o privilégio de colaborar com amigos residentes na cidade. Por essa razão, revelou-se um imenso prazer trocar ideias e impressões com o Sr. Manuel Oliveira Martins, a quem publicamente agradeço a gentileza de me deixar publicar a primeira dessas conclusões, crente que pouco a pouco poderemos apresentar outros trabalhos realizados em conjunto.

O lugre “ Gaspar “
1919 – 1921
Armador : Empresa de Pescarias de Viana, Lda.
Viana do Castelo

O lugre "Gaspar", no estaleiro do Campo da Feira

Este lugre de 4 mastros (supostamente com 900 toneladas de arqueação bruta), foi mandado construir pela empresa armadora, no Estaleiro do Campo da Feira, actual Largo 5 de Outubro, sob a responsabilidade do construtor naval Sr. José Lopes Ferreira Maiato e lançado à água a 16 de Abril de 1919. O velame foi riscado e cortado pelo antigo Capitão da Marinha Mercante Sr. Camilo Ferrinho. Na primeira viagem carregou no Porto vinho para Bordéus, saindo em lastro para Nova Orleans, onde carregou aduela com destino ao rio Douro. Depois de uma viagem tormentosa, como a descreveu o Capitão Carrapichano ao jornal “A Aurora do Lima”, arribou a Vigo no dia 9 de Setembro de 1919 com água aberta. Imediatamente seguiu para Vigo o sócio-gerente Sr. João Baptista Ferreira, com o construtor Sr. José Ferreira Maiato, para tentar remediar a situação (conforme notícia publicada no citado jornal, Viana do Castelo, 1919).

O lugre "Gaspar" na cerimónia do bota-abaixo

Depois da comunicação atrás referida, acreditamos que o lugre tenho entrado em estaleiro, não referenciado, para reparar, sem que possamos ajuizar com rigor a gravidade das avarias verificadas. Somos por isso levados a concluir, que o navio possa ter amarrado em Viana, sem posterior utilização, muito embora o capitão Sr. José dos Santos Carrapichano, se mantivesse em funções até 1921.

Isto porque Manuel Maria Bolais Mónica, após terminada a construção dum lugre de 3 mastros na Figueira da Foz, com cerimónia de bota-abaixo a 24 de Agosto de 1919, sob encomenda da Sociedade Novas Pescarias de Viana, Lda., tenha sido registado nessa praça, sensivelmente no mesmo período, igualmente com o nome “Gaspar”.

Como é do nosso conhecimento, o 2º lugre manteve esse nome até 1948, obrigando à alteração do nome ao 1º lugre, que apuramos teria sido rebaptizado “Isabel” (LR 1922) e colocado à venda no mercado internacional. Uma situação deste tipo, leva-nos a especular tratar-se duma construção deficiente, com mau comportamento em ocasiões de mau tempo, como aconteceu noutras ocasiões, com navios de dimensão considerável, construídos em madeira.

Concretizada a venda durante o ano de 1921, o lugre foi adquirido pela empresa F. Benemeles & Cª., ficando registado em Havana, Cuba, com o nome “Esperanza”. Esta alteração permite-nos imaginar que as 900 toneladas de arqueação bruta, teriam correspondência ao peso morto (deadweight), porquanto a arqueação seria de 452 toneladas de registo bruto e 408 toneladas de registo liquido. Em relação ao comprimento, tinha 50,59 metros entre perpendiculares, 10,05 metros de boca e 4,57 metros de pontal (LR 1922).

Como não pesquisamos a continuação da história comercial deste navio, queremos apenas referir que as imagens utilizadas neste relato, foram retiradas do livro “Viana e o Mar”, editado pelo Grupo Desportivo e Cultural dos Estaleiros Navais de Viana do Castelo (GDCENVC).