quarta-feira, 19 de dezembro de 2018

História trágico-marítima (CCC)


O naufrágio do iate "Maria Alice Primeira", em Viana do Castelo

Naufragou, ao entrar a barra, o iate “Maria Alice Primeira”
Como se deu o naufrágio – Salvamento dos tripulantes
Viana do Castelo, 31 – Quando hoje, pela meia hora da tarde, o iate “Maria Alice Primeira” transpunha a barra do porto, uma volta de mar fê-lo desgovernar, indo encalhar junto ao cais da praia do Cabedelo.
Dado sinal de alarme, saiu o barco salva-vidas, bem como alguns barcos da Ribeira, cujas tripulações empregaram todos os esforços para salvarem a tripulação do navio encalhado, que devido à má posição e ao local onde se encontrava a fazia perigar. Devido, porém, à agitação do mar, não conseguiram atracar ao navio.
De bordo foi lançada uma retenida para o salva-vidas, sendo assim salva a tripulação, composta de sete homens, incluindo o mestre.
Eis como se deu o naufrágio: O “Maria Alice Primeira” pairava fora da barra, que, com o “Elvira Covão”, aguardava ocasião de a transpôr. O mar estava um tanto agitado, mas o barco dos pilotos saiu, e, em lugar seguro, fez sinais ao navio, que obedecia. Porém, ao passar na direcção do Bugio, a popa bateu no fundo, dando origem a que a proa, com a violência das vagas, mudasse de posição, sendo arrastado para terra e indo de encontro às pedras que existem próximo do cais do Cabedelo, de onde não sairá mais senão desfeito.
O “Maria Alice Primeira” era um navio elegante, de 117 toneladas, e pertencia à praça de Lisboa. Saíra de Setúbal em 23 do corrente mês, com cimento, consignado à firma Magalhães, Filhos, de Viana. Arribou a Peniche no dia 26, e no dia 29 fez rumo a Viana, onde o esperava tão trágico fim! Considera-se perdido.
A sua tripulação era composta por António Cadilha, mestre já experimentado em bastantes naufrágios; é filho do valente marinheiro Manuel Cadilha, lobo do mar que muitas vidas salvou e que um volvo fez sucumbir há muitos anos; Sebastião de Sousa, contra-mestre; José Pereira, José Maria, Manuel O. Iglésias e João de Sousa, marinheiros, e Dioclécio de Castro Lomba, moço, todos de Viana do Castelo.
Os haveres dos náufragos foram salvos por um barco tripulado por pilotos da barra e alguns pescadores. Ao cais acorreram centenas de pessoas para presenciar o naufrágio.
Um dos náufragos, em virtude de se ter tomado do frio, foi conduzido ao posto de vigia, recebendo ali o tratamento, que lhe foi ministrado pelo enfermeiro Bernardo Cruz. Os bombeiros também compareceram.
O rebocador existente em Viana, se não estivesse fechado na doca, poderia ter prestado bons serviços. É de toda a conveniência conservá-lo fora da doca, quando o mar estiver como hoje.

Desenho de navio do tipo iate, sem correspondência ao texto

Características do iate “Maria Alice Primeira”
1932 - 1934
Armador: Sociedade Além-Mar, Lda., Lisboa
Nº Oficial: A-300 - Iic: H.M.L.P. - Porto de matrícula: Lisboa
Construtor: Não identificado, Aveiro, 1918
ex “Adelaide II”, Junceiro, Nestório, Pereira & Cª., F. Foz, 1918-1921
ex “Estrela do Mar”, Luiz Moço & Cª., Figueira da Foz, 1921-1928
ex “Maria Alice 1º”, Joaquim António Rodrigues, F. Foz, 1928-1932
Arqueação: Tab 116,71 tons - Tal 95,79 tons
Dimensões: Pp 25,68 mts - Boca 7,25 mts - Pontal 3,28 mts
Propulsão: À vela
Equipagem: 7 tripulantes

Ainda o naufrágio do iate “Maria Alice Primeira”
Viana do Castelo, 2 – O iate “Maria Alice Primeira” que ante-ontem naufragou na ponta do cais da Tornada, ainda se conserva na mesma posição. O mar que ante-ontem estava bastante agitado, galgava o casco do navio de bombordo a estibordo, arrebatando-lhe a gaiuta, cozinha e anteparas.
Os mastros ainda se conservam ao alto e assim se conservarão se o cimento se o cimento, que está no porão se solidificar. Se tal suceder, terão de ser picados.
É de crer que esta circunstância acarrete entraves à construção do cais, pois será difícil a destruição do bloco que o cimento formará. O iate naufragou por lhe ter faltado o vento. Foi por esse motivo que as vagas o encarreiraram para a Tornada.
Dizem que o rebocador que existe em Viana, quando o mar está agitado, devia permanecer ancorado no rio e nunca fechado na doca. Se estivesse no rio, logo que o navio navegasse para a barra teria saído e dar-lhe-ia reboque.
Dizem também, que o gasolina dos pilotos também estava na doca e na ocasião em que o “Maria Alice Primeira” vinha para a barra as portas da doca não podiam ser abertas por causa da ondulação.
O navio e a carga estão no seguro.

O naufrágio do “Maria Alice Primeira”
O iate “Maria Alice Primeira” continua no mesmo local onde naufragou. Começaram os trabalhos de salvamento de velas e outros utensílios de bordo. O navio naquele ponto após solidificado o cimento que tem no porão, há de ser um escolho a dificultar a entrada aos navios de vela.

O naufrágio do “Maria Alice Primeira”
Caíram ontem os mastros do iate “Maria Alice Primeira”, naufragado na ponta do cais da Tornada. Parte do casco desfez-se com a violência do mar. Se o cimento que vinha em sacos assentou no fundo, é um bloco que ali fica e que muito dificultará a continuação das obras.

Noticias publicadas no jornal “Comércio do Porto”, em:
(1) Domingo, 1 de Abril de 1934; (2) terça-feira, 3 de Abril de 1934; (3) quinta-feira, 5 de Abril de 1934; e sábado, 7 de Abril de 1934

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