sexta-feira, 18 de abril de 2008

A Marinha Portuguesa no Norte


Muitos navios da Marinha de Guerra Portuguesa, porque não tenho a certeza se terão sido todos, mais tarde ou mais cedo fizeram escalas no passado pelo rio Douro, tal como ainda acontece com visitas mais ou menos regulares a Leixões. Quando amarrados no rio Douro, fundeavam no quadro da Marinha no local denominado Bicalho, onde desde 1884 até 1909 a bordo das antigas corvetas Sagres e Estephania existiu a Escola de Alunos Marinheiros, destinada à incorporação dos mancebos que optavam por um futuro marítimo. Quanto a Leixões julgamos saber não existir nenhum local específico para os navios da Armada, excepção feita aos Patrulhas que tem atracação definida no velho cais das Gruas, sempre que as condições de tempo o permite. É das passagens pelo norte, que proponho recordar alguns desses navios.

Corveta " Sagres "


Face à chamada de atenção, feliz e oportuna pelo interesse que esta corveta devia merecer nos meios náuticos de Lisboa e Porto, vou-me valer do excelente trabalho apresentado na revista da Armada, da responsabilidade do Cap. de Fragata António Manuel Gonçalves, a quem publicamente presto a minha homenagem, com o seguinte teor:

O primeiro navio da Marinha Portuguesa com o nome Sagres era uma corveta, em madeira, construída nos estaleiros Young, Son & Magnay, em Limehouse, Inglaterra. Os planos foram elaborados pelo engenheiro Charles Cousins e foi construída sob a supervisão do Almirante Sir George Sartorius. Em termos de armação tratava-se de uma galera de três mastros.
Foi equipada com quatro caldeiras de baixa pressão, construídas pelo fabricante Srs. Humphreys, Tennant & Dyke, de Deptford, que forneciam uma potência de 300 cavalos. Tratava-se pois de um navio misto. Esta característica, numa época em que ainda escasseavam os navios a motor, conferiu-lhe o título de melhor navio da sua categoria. Até porque, exclusivamente a motor, podia atingir uma velocidade de 12 nós.
O navio tinha castelo e tombadilho e ainda uma superestrutura, à ré do traquete. O seu interior encontrava-se dividido em três pavimentos.
A mastreação era toda em madeira e para além dos mastros reais possuia mais dois mastaréus. O gurupés prolongava-se com o pau da bujarrona. Em cada um dos mastros cruzavam quatro vergas. Nos mastros traquete e grande encontrava-se fixa uma carangueja e na gata uma carangueja e uma retranca, onde envergava pano latino.
Quando o navio foi lançado à água, em Junho de 1858, encontrava-se presente o Conde do Lavradio, ministro português.
Depois de efectuar as provas de mar o navio largou de Portsmouth, no dia 14 de Setembro de 1858. Após uma viagem tranquila, que durou apenas quatro dias, o navio chegou a Lisboa, onde fundeou, no dia 18 do mesmo mês.
Em Janeiro de 1863, encontrava-se o Comandante Álvaro Soares Andreia na posse da «carta de prego», o navio largou de Lisboa. A comissão deveria ser efectuada sob o comando da Estação Naval de Angola, com a importante missão de reprimir o tráfico de escravos e o contrabando, e proteger o comércio lícito.
Em 1866 a Sagres foi sujeita a grandes fabricos que incluíram a substituição das peças de artilharia, das caldeiras e da mastreação. No final de 1868 voltou à Estação Naval de Angola, com os mesmos objectivos da comissão anterior.
Em 1873, após um reparação prolongada, o navio regressou a Luanda, transportando o Almirante José Baptista de Andrade, recentemente nomeado Governador-Geral e Comandante da Estação Naval de Angola. Durante cerca de 18 anos efectuou inúmeras e variadas missões, ao serviço da Marinha Real.
O navio estava armado com 10 peças de artilharia e esteve integrado, por diversas vezes, em missões de carácter diplomático, chefiadas pelo Infante D. Luís, que era Oficial de Marinha. Efectuou também algumas viagens de instrução.
Nas suas missões a corveta Sagres visitou, entre outros, os seguintes portos estrangeiros: Southampton, Greenhithe, Antuérpia, Bordéus, Tânger, Gibraltar, Vigo, Génova, Rio de Janeiro, Salvador e Pernambuco.
No dia 13 de Novembro de 1876 passou ao estado de desarmamento. Abrigou a partir de então a recém criada Escola de Alunos Marinheiros do Porto. Para o efeito o navio foi sujeito a um período de fabricos durante o qual lhe foi retirado o motor propulsor, bem como feita a adaptação dos espaços livres a fim de servirem como salas de aula, cobertas e camarotes. O armamento, já obsoleto, foi substituído por outro mais recente, para fins de instrução.
Depois de devidamente adaptada a corveta Sagres foi então rebocada até ao rio Douro, no Porto, onde permaneceu fundeada. Recebeu os seus primeiros alunos em Maio de 1884.
Em 1898, devido ao estado de degradação da corveta Sagres, a Escola de Alunos Marinheiros do Porto foi transferida para a corveta Estephânia. No dia 7 de Setembro desse mesmo ano a corveta Sagres foi abatida ao efectivo dos navios da Armada. Viria a ser desmantelada pouco tempo depois.

Ficha da corveta Sagres

Deslocamento máximo: 1.382 toneladas
Comprimento Ff 79 mt > Boca 9,9 mt > Pontal 6,15 mt
Altura do mastro grande: 32,50 mt > Calado: 4,47 mt

Quero igualmente agradecer o comentário do Sr. Luís Filipe Morazzo, complementando várias informações ao texto acima, excelente achega para um melhor conhecimento e esclarecimento, relativamente ao valor e importância que o navio reconhecidamente merece.


Corveta " Estephania "

Desarmada em 1898. Naufragou durante a cheia no Douro de 1909.

Corveta "Tavira"

Deslocamento: 204 to > Em serviço desde 1878.

Imagem de autor desconhecido, eventualmente feita em 25.02.1894, por ocasião da visita ao Porto, onde descarregou um bloco de pedra extraído na ponta de Sagres e que serve de base ao monumento ao Infante D. Henrique. Regressou a Lisboa a 08.03.1894.

Corveta " Rio Ave "

Deslocamento: 378 to > Em serviço desde 1879

Imagem de autor desconhecido. Regista a entrada no rio Douro em 25.04.1892 para render a canhoneira Zambeze, ficando às ordens do Governador Civil. Foi posteriormente rendida pela canhoneira Zaire em 31 de Maio, data que marca o seu regresso a Lisboa.

Canhoneira " Bengo "

A canhoneira "Bengo" em Leixões - imagem de autor desconhecido.

Canhoneira " Diu "

Construção Arsenal do Alfeite em 1929 > Deslocamento: 403 to
Comprimentos.: Ff 45 mt > Boca 8,30 mt > Pontal 4,50 mt
A entrar em Leixões nos anos 50 - imagem (c) Fotomar


Navio hidrográfico " Ibo "

Construído em 1911 > Deslocamento: 403 to
Comprimentos.: Ff 45 mt > Boca 8,30 mt > Pontal 4,50 mt
No rio Douro - imagem de autor desconhecido.

Patrulha " Terceira "

Construção em aço durante 1942 > Deslocamento: 545 to
Comprimentos: Pp 45,72 mt > Boca 8,35 mt > Pontal 4,57 mt
Em Leixões nos anos 50 - imagem (c) Fotomar

2 comentários:

Rui Amaro disse...

Cá estou eu. Altera.
A foto que mostra o vaso de guerra identificado com a letra T não é a lancha de fiscalização fluvial Tete, que fazia a fiscalização no rio Zambeze, Moçambique, e jamais veio a Leixões, mas sim o draga-minas NRP Terceira (Classe Faial) ex HMS Hayling, const. 1942 por Cook Welton & Gemmelles, Beverley,UK. Cedido a Portugal
em 10/1943 tomando o nome de P3. Devolvido ao Royal Navy em 07/1945 e adquirido por Portugal em 11/06/1946 NRP Terceira, juntamente com os gémeos Faial, S.Miguel, e Santa Maria: Desloc. 770t, cff 45,72m, boca 8,78m, pontal 4,50m. 1 máquina 850 cavalos, v.max. 13 nós, 3 oficiais e 42 sargentos e praças. Deve ter sido abatido por volta de 1960. A foto deve ser da década de 50, pois nessa altura o Terceira andava na fiscalização das pescas..
Rui Amaro

Luis Filipe Morazzo disse...

Bem haja amigo Reimar por ter postado a fotografia da primeira Sagres

Tem sido para mim uma grande surpresa constatar que, alguns dos grandes historiadores, escritores e comentadores marítimos da nossa praça, com responsabilidades adquiridas, continuem teimosamente a ignorar a existência deste navio, o qual facilmente se reconhece que, será sempre considerado cronologicamente o primeiro navio-escola da armada, apelidado de “Sagres”.
Este navio como já alguns sabem,foi construído no estaleiro Joung em Londres e lançado à água em Julho de 1858. Era uma corveta com casco em madeira, gabada pela leveza da sua construção e a firmeza das suas formas. O navio deslocava cerca de 1380 toneladas, tinha um aparelho de galera e estava equipado com uma máquina de baixa pressão de 300 HP.
Considerada uma máquina possante para a época, a “Sagres”, alcançou durante as provas de mar a significativa velocidade de 12,6 nós. Os paióis tinham capacidade para dez dias de carvão à velocidade máxima, mas para uma velocidade de cruzeiro de 10 nós, a autonomia chegava às 4500 milhas. No entanto, com vento favorável e a vapor esta corveta podia navegar distâncias superiores a seis mil milhas.
Este navio estava equipado com dez peças de artilharia, tinha uma guarnição de 132 homens, e todos os seus comandantes foram unânimes em relação às suas boas qualidades náuticas, dizendo que capeava bem com os latinos e sabia aguçar-se de bolina como os bons navios.
Ao longo dos 40 anos que esteve no activo, a corveta “Sagres”, participou em numerosas missões, havendo uma a destacar, em Outubro de 1862, quando na companhia da corveta “Sá da Bandeira”, vai levar o rei D.Luis e toda a família real a visitar vários portos europeus. Desarmada por volta de 1876 acabou os seus dias fundeada no rio Douro servindo como navio-escola, para alunos marinheiros, entre 1882 e 1898, altura em que finalmente foi abatida ao efectivo.
Esperando que não haja mais equívocos no futuro em relação a este tema

Saudações Marinheiras para todos

Luis Filipe Morazzo