segunda-feira, 13 de abril de 2015

História trágico-marítima (CXLV)


O naufrágio do paquete "Ruy Barbosa"
2ª Parte

Ainda o encalhe do “Ruy Barbosa”
Continua a ser do interesse geral o encalhe do paquete “Ruy Barbosa”, pois à praia de Pampelido (Mindelo) tem afluído muitas pessoas, não só dos lugares próximos, como do Porto, que se transportam em automóveis, a fim de presenciarem o vapor encalhado.
As pessoas, ontem, conservaram-se na praia muito tempo na eventualidade de assistir a qualquer ocorrência, que pudesse surgir ao “Ruy Barbosa”, em virtude do mar apresentar maior ondulação. No entanto, os trabalhos para salvamento do diverso recheio do vapor puderam prosseguir durante o dia. E assim, foi possível retirar do interior do “Ruy Barbosa” vários utensílios de bordo, no valor de centenas de contos, tais como: pratas, mobiliário, ventoinhas, trens de cozinha, etc.
À noite, apenas ficaram a bordo o comandante e o imediato do vapor, um criado e um marinheiro. Os rebocadores que tem rebocado as barcaças com aqueles valores, foram o “Tritão” e o “Mars II”, tendo o salva-vidas a motor “Carvalho Araújo” feito a devida assistência aos tripulantes que, até ontem, à tarde, se conservavam a bordo e que, depois retiraram para Leixões, com ordem das autoridades marítimas.
Quanto à carga, aparte os volumes de certa importância e as malas do correio, que vinham no porão nº 1, nada mais foi descarregado, prosseguindo hoje, caso o mar permita, esses trabalhos. Além das barcaças com carga que o rebocador “Mars II” rebocou para Leixões, trouxe mais sete escaleres pertencentes ao “Ruy Barbosa”. Quando trazia estes escaleres a reboque, próximo da entrada de Leixões, rebentaram as amarrações de seis destes escaleres, ficando os mesmos à mercê da ondulação do mar, até que foram apanhados pela lancha-motor “Pátria”, que depois os rebocou, para dentro do porto.
Quanto ao outro escaler, que o “Mars II” ainda tinha a reboque, ao entrar no porto de Leixões voltou-se, seguindo submerso até ao porto de serviço.
O capitão do rebocador de alto mar “Cabo Raso”, que tinha vindo para colaborar nos trabalhos que fossem necessários ao salvamento do paquete, declarou ser esse salvamento impossível, não só devido aos rombos que o navio sofrera, como, ainda, à abundância de água que se conserva nos porões e casa da máquina, e que as bombas seriam impotentes para a esgotar.
No entanto, são ainda esperados os vapores salvadegos dinamarquês “Gier” e alemão “Seefalke”, para ser ouvida a opinião dos seus capitães, bem como a chegada de Lisboa de um engenheiro, a fim de passar uma vistoria ao vapor encalhado.
Outras notas
- A Companhia Lloyd Brasileiro resolveu que os passageiros que transitavam no “Ruy Barbosa” aguardassem nos hotéis e pensões, onde estão hospedados, a chegada do vapor “Cuyabá”, da mesma Companhia que deve chegar a Leixões, no dia 13 do corrente, a fim de prosseguirem viagem nesse vapor. E, aos passageiros que em Leixões deviam embarcar no “Ruy Barbosa”, com destino aos portos do Brasil lhes fosse dado um subsídio para poderem regressar às suas terras, onde aguardarão a chegada desse mesmo vapor.
- O posto de socorros, que a Cruz Vermelha montou na praia de Pampelido, já retirou do local por ali ser desnecessário. Apenas se conserva ainda, o cabo de vai-vem que foi montado pelos Bombeiros Voluntários de Matosinhos-Leça, estando lá um piquete de prevenção.
- O vapor que guinou um pouco para estibordo, apesar do mar se ter alterado um pouco durante o dia, não modificou a sua inclinação.
(In jornal “Comércio do Porto”, sexta, 3 de Agosto de 1934)

O "Ruy Barbosa" numa escala anterior em Leixões
Bilhete postal - Minha colecção

O encalhe do “Ruy Barbosa”
Não se deu qualquer modificação na posição do paquete
Os trabalhos de descarga – Conferências a bordo – Outras notas
Conferências a bordo
Chegou na madrugada de ontem a Leixões, o salvadego dinamarquês “Gier”, que veio para prestar auxílio. O capitão deste salvadego, acompanhado do capitão do porto de Leixões, sr. Pais do Amaral foi num gasolina a bordo do “Ruy Barbosa” e, após ter conferenciado com o capitão daquele paquete e, ainda, depois de ter verificado estar aquele paquete em más condições de se salvar, o que justificou, assim, a opinião mantida dos técnicos portugueses desde o seu encalhe, tendo retirado para Leixões para bordo do seu barco. Mais uma vez se confirma que o “Ruy Barbosa” está completamente perdido. No entanto é ainda aguardada a chegada do salvadego alemão “Seefalk” para ser ouvida, também, a opinião do seu comandante.
Várias notas
- Pelas 4 horas e meia da tarde, de ontem, os Bombeiros Voluntários de Matosinhos-Leça que se tem conservado na praia de Pampelido desde terça-feira última, dia do encalhe, e como vissem que já não era precisa a sua permanência ali retiraram o cabo de vai-vem e as espias que tinham sido lançadas para o paquete. - De noite, junto ao “Ruy Barbosa”, ficaram os rebocadores “Tritão” e “Mars II”, a fim de prestarem assistência caso seja necessária.
(In jornal “Comércio do Porto”, sábado, 4 de Agosto de 1934)

O encalhe do paquete “Ruy Barbosa”
O vapor mantém-se na mesma posição
Prosseguiram, ontem, os trabalhos de descarga das mercadorias
Outras notas
Muito tem contribuído para que o “Ruy Barbosa” não tenha sofrido mudança de posição, o facto do mar se apresentar bastante sereno. Mesmo no enchimento das marés, que ocasiona muitas vezes uma certa alteração do mar, não se tem registado grande ondulação das águas, o que muito tem beneficiado o “Ruy Barbosa”, que não se mexe do lugar onde encalhou. Essa circunstância tem permitido fazerem a descarga de muitas mercadorias que o vapor transportava. A bordo do paquete, já não existe quase nada do seu mobiliário, haveres e utensílios, pois já foi tudo retirado.
Ontem, procederam à recolha das canalizações mais importantes, que foram postas a salvo. A bordo já não existem os tanques de água, que eram utilizados para o fornecimento das comidas e para outros serviços dos passageiros e da tripulação. A água agora é fornecida de terra. Prosseguiram, ontem, normalmente, os trabalhos da descarga das mercadorias, que foram transportadas em barcaças para Leixões, e que eram rebocadas, ora pelo rebocador “Tritão”, ora pelo “Mars II”, empregando-se todo o dia nesse serviço.
Para que pudessem ser retiradas do navio as mercadorias mais pesadas, foram colocadas no convés do vapor, duas gruas que movimentavam os guindastes de bordo. Essas gruas pertencem à Administração dos portos do Douro e Leixões, tendo, ontem, funcionando uma delas, que prestou relevantes serviços, tornando-os menos morosos. Além disso, braçalmente, foi continuada a ser feita a descarga das mercadorias mais leves.
Mercadorias há que já não se podem aproveitar, pois encontram-se no porão nº 1, que está completamente inundado. Entre essas mercadorias contam-se aparelhos de rádio e dois automóveis, bem como sedas, fazendas, etc. Hoje, Domingo, prosseguirão os trabalhos de descarga das mercadorias, começando esse serviço de manhã cedo.
Ontem, a afluência de gente à praia de Pampelido, ainda foi grande, sendo que no dia de hoje também ali acorram numerosas pessoas para presenciarem o navio.
(In jornal “Comércio do Porto”, Domingo, 5 de Agosto de 1934)

Paquete “Ruy Barbosa”
É a mesma a situação do vapor – Chegada do salvadego alemão
Os trabalhos de descarga de mercadorias prosseguem normalmente
Depois da leve inclinação para estibordo do paquete “Ruy Barbosa”, não se deu qualquer alteração na sua posição, atendendo às circunstâncias do mar se ter mantido calmo, até à presente ocasião.
Deu entrada no último Domingo, à tarde, para a bacia do porto de Leixões, o salvadego alemão “Seefalke”, procedente de Bremerhaven, e que já, há dias, era aguardado a fim de ser ouvida a opinião do seu comandante, sr. Reents, sobre a possibilidade de salvamento do “Ruy Barbosa”. A meio da tarde, de ontem, aquele senhor dirigiu-se, num barco a gasolina, a bordo do paquete no sentido de averiguar da gravidade das avarias sofridas aquando do seu encalhe.
Ao fim da tarde, porém, regressava a Leixões, sem ter, contudo, tornada pública a sua opinião, que, no entanto, é ansiosamente aguardada por todos aqueles que se interessam pela sorte do vapor.
Os trabalhos de salvamento da carga, existente nos porões não inundados, têm continuado normalmente, tendo de lá sido retirada grande quantidade das mercadorias, no valor de alguns milhares de escudos. O mar continua a favorecer estes trabalhos e a poupar o vapor encalhado.
No transporte das barcaças com as mercadorias retiradas do “Ruy Barbosa”, continuam a ser utilizados os serviços do rebocador “Mars II” e da lancha-motor “Pátria”, deixando o rebocador “Tritão” de prestar esses serviços, bem como o salva-vidas “Carvalho Araújo”.
No Domingo, acorreu numeroso público à praia de Pampelido, a fim de presenciar o navio encalhado, contando-se em centenas as pessoas que afluíram ao local, vendo-se vários grupos com merendeiros. Ao fim da tarde, a chuva que caiu fez dispersar todas essas pessoas, depois de uma boa molhadela.
(In jornal “Comércio do Porto”, terça, 7 de Agosto de 1934)

Ainda o encalhe do “Ruy Barbosa”
Prosseguiram ontem, os trabalhos da descarga do “Ruy Barbosa”, que foram dificultados, devido à forte ondulação do mar. Apesar disso, ainda procederam à remoção de bastante mercadoria para Leixões, que foi transportada nas barcaças rebocadas pelo “Mars II” e pela lancha-motor “Pátria”.
Os salvadegos dinamarquês “Gier” e alemão “Seefalke”, que estão ancorados em Leixões, ainda não procederam a qualquer trabalho para safarem o “Ruy Barbosa”, do local onde está encalhado. Segundo consta, esses serviços ficariam tão dispendiosos, que não valeria a pena realizá-los, em função das despesas que já foram feitas, pela perda das mercadorias que estão nos porões inundados, que ascendem a algumas centenas de contos, e também pelas grandes reparações que o vapor precisaria fazer. Contudo, o sr. Reents, capitão do salvadego alemão “Seefalke”, está a elaborar o seu relatório para o apresentar à Companhia Lloyd Brasileiro que, em seguida decidirá sobre a sorte do paquete. São aguardadas estas resoluções, para ser tentado o desencalhe do navio, visto que o capitão do salvadego alemão, ter declarado ser possível retirar o navio daquele local.
Entretanto, no caso de o mar permitir, os trabalhos da descarga da mercadoria dos porões não inundados prosseguirão durante o dia de hoje, com a mesma actividade como até agora tem sido feitos.
(In jornal “Comércio do Porto”, quarta, 8 de Agosto de 1934)

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