sexta-feira, 28 de abril de 2017

Memorativo da Armada


O lançamento à água do cruzador “Rainha D. Amélia”

Foto da cerimónia do bota-abaixo do cruzador "Rainha D. Amélia"
Imagem previamente publicada no blog «Restos de Colecção»

Lisboa, 10 de Abril – Efectuou-se hoje, com a presença da família real, do ministério, corpo diplomático, altos funcionários e grandíssimo número de oficiais do exército e da armada, o lançamento à água do novo cruzador “D. Amélia”. Acudiu a presenciar essa cerimónia enorme multidão de povo, que enchia o Arsenal de Marinha e suas dependências, começando de manhã a afluir para ali, havendo grande movimento nas ruas próximas do Arsenal, a cuja entrada se viam milhares de pessoas.
A família real chegou ali cerca das 2 horas da tarde, sendo recebida próxima do estaleiro pelo ministério, vice-almirantes, oficialidade de patente superior da armada, generais da 1ª divisão e dignitários.
Os trabalhos preparativos do lançamento já haviam principiado e SS.MM. dirigiram-se, com o seu séquito, para o pavilhão, às 2 horas e 10 minutos, para assistirem à cerimónia. Quando chegaram eram cortadas as últimas escoras que especavam o novo navio. Terminados os preparativos, o inspector do Arsenal, sr. Croneau informou el-rei de que estavam concluídos os trabalhos, dando em seguida o corte final na escora de proa.
S.M. a rainha disse então nesse momento: «Vai» e os operários tiraram as primeiras cunhas de sob a quilha do cruzador. S.M. repetiu «Vai», e novas cunhas foram tiradas. Quando tiraram as últimas, S.M. a rainha pronunciou estas palavras: «Em nome de el-rei, vai com Deus».
Neste momento foram soltados vivas unânimes e estrondearam entusiásticas salvas de palmas, executando a banda dos marinheiros o hino real e salvando os navios de guerra. O espectáculo no seu conjunto era imponente, fazendo palpitar de júbilo todos os corações.
O novo navio de guerra começou a deslizar com serenidade pelas calhas da carreira e metendo triunfalmente pelo Tejo dentro, descreveu um curva magnífica, tendo as esquadrilhas, compostas de rebocadores, guigas, caíques, lanchas, etc., de desviar-se rapidamente para não sofrerem algum abalroamento.
A canhoneira “Zaire” ainda roçou nessa ocasião pelo cruzador, chegando a produzir bastante susto entre as muitas pessoas que se encontravam a bordo; felizmente não se deu nenhum prejuízo.
O novo cruzador foi por fim rebocado pelo vapor “Bérrio” para a bóia em frente do Arsenal, e aí dar entrada no dique para procederem à montagem da máquina, mastreação e restantes apetrechos.
SS. MM., que permaneceram algum tempo no pavilhão, voltaram à casa da superintendência, onde receberam os cumprimentos do corpo diplomático e de outros personagens. A senhora D. Amélia, ao despedir-se da oficialidade de marinha, dirigiu felicitações em particular ao sr. engenheiro Croneau.
No cruzador, quando entrou no Tejo, levava a bordo apenas o engenheiro naval Carvalho, o patrão-mor do Arsenal João Sampaio, o sota patrão-mor Reynol, o mestre da armada Jorge Bartolomeu, um contra-mestre e os marinheiros de serviço.
O aspecto do Arsenal de Marinha, onde tudo estava apinhado de gente, pavimento, janelas e telhado, era de um efeito soberbo gozado do Tejo; mas a vista do mar, onde se viam as canhoneiras “Diu” e “Zaire”, o vapor “Rei de Portugal”, os rebocadores “Bérrio” e “Lidador” e muitos vaporzinhos particulares, barcos e lanchas, cheios de convidados e famílias, oferecia, apreciado de terra, um espectáculo pitoresco.
No Tejo, a bordo dos navios, houve o mesmo entusiasmo que em terra quando o “D. Amélia” entrou na água, sendo levantados vivas à família real e à marinha, de todos os pontos e por gente de todas as classes.
Achavam-se decorados com bandeiras todos os palanques construídos para os deputados e pares, altos funcionários, etc., etc. As janelas das oficinas e dependências do Arsenal estavam cheias de senhoras, vendo-se muita gente também nos telhados dos edifícios do Arsenal e do ministério da marinha. Junto das vedações e próximo da carreira conservaram-se centenas de pessoas, sob um sol abrasador, para assistirem à cerimónia. Calcula-se em 20.000 o número das pessoas que assistiram ao lançamento do navio.
Infelizmente, deu-se um desastre: na ocasião em que era solta uma das escoras que seguravam o navio, a escora caiu sobre um operário, deixando-o em estado grave. Amanhã deve ficar assente a lista dos agraciados com mercês honoríficas por motivo da construção do novo cruzador.
(In jornal “Comércio do Porto”, terça-feira, 11 de Abril de 1899)

Foto do cruzador "Rainha D. Amélia", em Lisboa
Postal ilustrado de «Martins & Silva» - Minha colecção

O lançamento à água do cruzador “D. Amélia”
O sr. contra-almirante Fernandes da Cunha, inspector do Arsenal de Marinha, fez publicar uma ordem do dia elogiando o director das construções navais sr. Croneau, chefes, engenheiros e mais pessoal das oficinas, por terem contribuído para levantar o bom nome daquele estabelecimento com a construção relativamente rápida do novo cruzador. Entretanto, agravou-se o estado de saúde do operário ferido por ocasião do lançamento do cruzador “Rainha D. Amélia”.
(In jornal “Comércio do Porto”, quarta-feira, 12 de Abril de 1899)

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