sábado, 9 de julho de 2011

História trágico-marítima (XVII)


Ataque de submarino próximo a Esposende

Lembro-me de ter havido, vai para 4 anos, um discussão acalorada sobre o naufrágio do lugre -patacho “Venturoso”, tendo permanecido dúvidas, que a informação disponível nessa época dificultava a cabal compreensão dos factos. Porque a procura favorece o conhecimento, foi com alguma surpresa que deparei com os textos abaixo publicados, cujo teor se explica por si, como segue:

Em substituição da notícia que tínhamos para publicar acerca dos afundamentos de três navios, nas alturas de Esposende, lamentavelmente amputada, damos em seguida o texto publicado pelo “Diário de Noticias”, de Lisboa e que escapou à censura.

«Nota oficiosa - Foram afundados ante-ontem de tarde, na costa norte, por submarinos inimigos, o vapor norueguês “Lockshy”, o iate português “Bertha” e o lugre português “Venturoso”, tendo sido salvas as tripulações, que seguiram para o Porto».

Segundo um telegrama de Esposende, sabe-se que ante-ontem pelas 4 horas da tarde se deram 3 tiros de peça de vapor à vista e em perigo, saindo imediatamente o salva-vidas da Póvoa de Varzim em seu socorro. Era o vapor norueguês “Lockshy”, que tinha sido torpedeado por um submarino inimigo a 12 milhas de Esposende, que vinha com carvão de Liverpool para Gibraltar. Foi afundado com 4 bombas, às 6 e meia da tarde, tendo-se salvo a tripulação composta de 23 homens e todas as bagagens e instrumentos de bordo. A seguir foi afundado o lugre português “Venturoso” com carregamento de vinhos para Bordéus, sendo salvos os 11 homens da tripulação e respectivas bagagens e o iate “Bertha” da praça do Porto, pertencente à firma Castro, que ia para Bordéus, sendo salvos os 8 homens que o tripulavam e as bagagens, recolhendo os oficiais ao hotel e as tripulações à hospedaria, onde comeram e pernoitaram, tendo partido na manhã seguinte de comboio para o Porto, estando todos bem.

Esposende, 28 – Desde o meio dia que se tem ouvido um prolongado bombardeamento no mar, supondo-se que se trata do ataque de um submarino a duas embarcações que foram vistas da estação de socorros a náufragos. A tripulação das mesmas embarcações parece seguir para a Póvoa de Varzim, rebocadas por lanchas de pescadores da mesma praia.

Póvoa de Varzim, 28 – Trazidos por heróicos pescadores poveiros chegaram agora aqui as tripulações de dois vapores e um navio bombardeados por um submarino alemão nas alturas de Esposende. Foram recebidos carinhosamente pelo povo povoense.

Vila do Conde, 28 – Hoje, às 2 horas da tarde, foram torpedeados próximo a Esposende o lugre “Venturoso”, o iate “Bertha”, da praça de Lisboa e um vapor norueguês. As tripulações, todas salvas, foram recolhidas no posto de socorros a náufragos da Póvoa de Varzim.
(In jornal “O Comércio do Porto”, de 29 de Julho de 1917)

Achados no mar
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Viana do Castelo, 29 - O barco de pesca de João Gavinho encontrou ontem, a légua e meia a oeste da barra de Viana, dois escaleres, tendo um deles, na popa, a tinta branca - “Locksley - Trondheim” e uma bóia salva-vidas com a mesma inscrição.
O barco de Manoel de Castro encontrou uma jangada, composta de doze câmaras de ar, de zinco. Escaleres e jangada estão na doca dos barcos.

Viana do Castelo, 30 - Além do achado pelos pescadores, de escaleres e jangada, há mais um bote em perfeito estado de conservação, com o letreiro “Locksley - Trondheim”, encontrado por pescadores de Anha, bem como alguns barris vazios.
(In jornal “O Comércio do Porto”, de 31 de Julho de 1917)

Relativamente às noticias publicadas, apurei com alguma facilidade que o ousado ataque aos três navios, por se encontrarem relativamente próximo da costa, foi da responsabilidade do cap. Erwin Wassner, comandante do submarino alemão U-69, no dia 26 de Julho de 1917. Sendo uma unidade do tipo U-66, o U-69 foi construído no estaleiro Germaniawerft, em Kiel, tendo entrado ao serviço a 4 de Setembro de 1915. Durante as 6 campanhas em que participou, de 4 de Março de 1916 até finais de Julho de 1917, afundou 31 navios e danificou um outro dos países aliados. Foi nessa altura tido como perda total, quando em viagem para a estação de control ao largo da Irlanda, sendo os seus 40 tripulantes considerados mortos/ desaparecidos.

Quanto aos navios afundados, cujas tripulações foram salvas pelo salva-vidas “Cego do Maio”, da Póvoa de Varzim, limitei-me a conseguir alguns elementos relativos ao navio norueguês, afundado na posição 41º23’N 08º51’W, quando em viagem de Liverpool para Gibraltar, carregado com carvão, seguindo-se as características mais detalhadas, de ambos os navios nacionais.

Vapor “ Locksley “
1913-1917
Det Selmerske Rederi, Trondheim, Noruega

Construtor: Tyne Iron Shipbuiding Co. Ltd., Newcastle, 10.1903
ex “Alumwell”, Northern Steam Shipping, Newcastle, 1903-1917
Arqueação: Tab 2.506,00 tons
Dimensões: Pp 95,40 mtrs - Boca 13,70 mtrs
Propulsão: 1 motor de tripla-expansão
Equipagem: 23 tripulantes

Lugre-patacho “ Venturoso “
1915-1917
Manuel P. Serrão e outros, Lisboa

Nº Oficial: 440-C - Iic.: H.G.T.V. - Porto de registo: Lisboa
Construtor: Johnson, Bideford, Inglaterra, 11.1871
ex “Aretas”, The Dennery Co. Ltd., Londres, 1871-1911
ex “Aretas”, Luiz da Naya e Silva, Porto, 1911-1913
ex “Silva”, Luiz da Naya e Silva, Aveiro, 1913-1915
Arqueação: Tab 290,53 tons - Tal 276,00 tons
Dimensões: Pp 38,35 mtrs - Boca 7,88 mtrs - Pontal 4,58 mtrs
Propulsão: À vela
Equipagem: 11 tripulantes

Iate “ Bertha “
1917-1917
Firma Castro?, Lisboa

Nº Oficial: A-188 - Iic.: H.B.E..T. - Porto de registo: Lisboa
Cttr.: José Martins de Araújo Jr., Vila do Conde, 14.07.1904
ex “Américo Faria”, Américo de Souza Faria, Porto, 1904-1907
ex “Américo Faria”, José de Souza Faria, Porto, 1907-1917

Publicidade relativa às viagens do iate "Américo Faria"

Arqueação: Tab 107,00 tons - Tal 101,65 tons
Dimensões: Pp 26,52 mtrs - Boca 7,20 mtrs - Pontal 2,57 mtrs
Propulsão: À vela
Equipagem: 8 tripulantes

Ambos os navios navegavam com destino a Bordéus, França.

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