O " Vera Cruz "
desenho de Fernando de Lemos Gomes
Actualmente em Portugal raramente encontramos o nome "Vera Cruz" associado a empresas, companhias ou lugares, salvo as honrosas excepções de uma Paróquia em Pessegueiro do Vouga, uma Galeria de Arte em Aveiro e uma Hospedaria no Porto. Fazendo jus ao benefício da dúvida, mais não descortinamos, mas talvez haja qualquer coisa, cuja existência ignoramos.
Daí que por motivos óbvios viajamos ao Brasil, onde descobrimos o nome ligado a uma enorme multiplicidade de casas comerciais, uma Cidade, uma Vila, um Clube de Futebol, uma estação de Rádio, um tema musical assinado por Milton Nascimento, interpretado pelo próprio e também imortalizado por Elis Regina, entre outros, mas acima de tudo, uma enorme saudade do "nosso" Vera Cruz.
Escolhemos duas personalidades brasileiras, ligadas ao meio marítimo de quem registamos os seguintes comentários :
O "Vera Cruz" é o navio do meu coração. Fiz nele duas viagens entre Brasil e Portugal, com meus pais. Marcou toda minha infância e também a lembrança dos portugueses que moram em Santos. É um dos belos navios clássicos. Foi o primeiro cartão-postal da imensa coleção de meu particular amigo Laire José Giraud. O navio pertenceu à Companhia Colonial de Navegação, de Lisboa. (Texto da responsabilidade de José Carlos Silvares).
Daí que por motivos óbvios viajamos ao Brasil, onde descobrimos o nome ligado a uma enorme multiplicidade de casas comerciais, uma Cidade, uma Vila, um Clube de Futebol, uma estação de Rádio, um tema musical assinado por Milton Nascimento, interpretado pelo próprio e também imortalizado por Elis Regina, entre outros, mas acima de tudo, uma enorme saudade do "nosso" Vera Cruz.
Escolhemos duas personalidades brasileiras, ligadas ao meio marítimo de quem registamos os seguintes comentários :
O "Vera Cruz" é o navio do meu coração. Fiz nele duas viagens entre Brasil e Portugal, com meus pais. Marcou toda minha infância e também a lembrança dos portugueses que moram em Santos. É um dos belos navios clássicos. Foi o primeiro cartão-postal da imensa coleção de meu particular amigo Laire José Giraud. O navio pertenceu à Companhia Colonial de Navegação, de Lisboa. (Texto da responsabilidade de José Carlos Silvares).
O "Vera Cruz" em Lisboa - postal da Companhia
É sem dúvida interessante ver como se faz história, utilizando as memórias do povo que somos, fora do país onde vivemos. E também através do navio, recebermos uma homenagem musical, fazendo chegar a nossa música, ao outro lado do Atlântico. Foi tempo de termos embaixadas itinerantes, em muitos locais do planeta, onde se inventava "marketing" antes do "marketing" ter sido inventado.
Já Laire José Giraud, conhecido correspondente da "nossa" Revista de Marinha, fazia o favor de nos deliciar, com o relato das suas memórias.
Empolgado, fiz de cada setor do imenso navio pedaços de um mundo só meu, muito particular. Corria da terceira classe, onde estávamos, para a segunda e, quando não me viam, para a primeira, com seu luxo inatingível, mas deslumbrante.
Havia um lugar, em particular, que me fascinava: a casa das máquinas. Sempre que podia, ia até lá. Era um local quente, cheio de vapor, onde enormes pistões subiam e desciam sem parar. Vários operários trabalhavam ali, todos sem camisa e suando as bicas.
Lembro-me de um belo dia ter decidido que, para mim, a partir daquele instante, esse era o coração do navio, de onde a vida era bombeada para o resto da embarcação.
Durante 11 dias, tempo decorrido entre a saída de Lisboa e a chegada a Santos, passando pela Ilha da Madeira e por Salvador, o "Vera Cruz" foi o mais fantástico parque de diversões que uma criança podia ter. Da abafada casa de máquinas ao imenso tombadilho, onde as pessoas alternavam caminhadas, leituras e jogos, passando pelos corredores estreitos, perfeitos para esconde-esconde, tudo era território livre para brincadeiras. Mesmo o fato de a clarabóia de nossa cabine estar quase à altura do nível do mar me encantava: a qualquer momento, pensava eu, podia estender a mão e tocá-lo.
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No segundo dia de viagem, já em mar aberto, percebi a principal diferença entre o "Vera Cruz", o "D. Pedro II" e o "Highland": enquanto um, o "D. Pedro II, se submetia à vontade do mar e o "Highland" lutava para vencer as ondas, o "Vera Cruz" navegava tranquilo, impávido, como se percorresse uma estrada finamente asfaltada.Empolgado, fiz de cada setor do imenso navio pedaços de um mundo só meu, muito particular. Corria da terceira classe, onde estávamos, para a segunda e, quando não me viam, para a primeira, com seu luxo inatingível, mas deslumbrante.
Havia um lugar, em particular, que me fascinava: a casa das máquinas. Sempre que podia, ia até lá. Era um local quente, cheio de vapor, onde enormes pistões subiam e desciam sem parar. Vários operários trabalhavam ali, todos sem camisa e suando as bicas.
Lembro-me de um belo dia ter decidido que, para mim, a partir daquele instante, esse era o coração do navio, de onde a vida era bombeada para o resto da embarcação.
Durante 11 dias, tempo decorrido entre a saída de Lisboa e a chegada a Santos, passando pela Ilha da Madeira e por Salvador, o "Vera Cruz" foi o mais fantástico parque de diversões que uma criança podia ter. Da abafada casa de máquinas ao imenso tombadilho, onde as pessoas alternavam caminhadas, leituras e jogos, passando pelos corredores estreitos, perfeitos para esconde-esconde, tudo era território livre para brincadeiras. Mesmo o fato de a clarabóia de nossa cabine estar quase à altura do nível do mar me encantava: a qualquer momento, pensava eu, podia estender a mão e tocá-lo.
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É desse mesmo "Vera Cruz" que realizou a viagem inaugural, com saída de Lisboa a 20 de Março de 1952, com destino ao Rio de Janeiro, levando a bordo como convidado de honra o passageiro Almirante Gago Coutinho, que nos referimos. É ainda exactamente esse mesmo navio, que foi à India em 1962, em serviço do Estado, buscar o que restou dos militares portugueses, cuja história foi de tal forma sepultada, que ninguém ousa levantar a pedra tumular. É também o navio mais comentado e melhor recordado por muitos militares que cumpriram o serviço militar em África, aparecendo relatos carinhosos alusivos às viagens num ou outro blog, daqueles que saboreiam ainda reviver imagens dum passado recente.
Já no Brasil a postura relativamente ao navio é diferente. Serve de estudo, com base na obra de Rubem Braga, utilizada como prova de Língua Portuguesa, conforme o texto abaixo publicado, que se explica por si.
Já no Brasil a postura relativamente ao navio é diferente. Serve de estudo, com base na obra de Rubem Braga, utilizada como prova de Língua Portuguesa, conforme o texto abaixo publicado, que se explica por si.
É sem dúvida interessante ver como se faz história, utilizando as memórias do povo que somos, fora do país onde vivemos. E também através do navio, recebermos uma homenagem musical, fazendo chegar a nossa música, ao outro lado do Atlântico. Foi tempo de termos embaixadas itinerantes, em muitos locais do planeta, onde se inventava "marketing" antes do "marketing" ter sido inventado.
Por tudo isto e muito mais, que aqui fica por contar, resta um amargor na boca com sabor a pouco, pois certamente este navio se tivesse tido uma única oportunidade do prolongamento à sua curta existência, duplicaria retratos de sonho, recordações inesquecíveis.
O "Vera Cruz" a navegar à saída de Lisboa - postal da Companhia
NºOf.: H-409 > Iic.: C.S.A.J. > Registo: Lisboa, 18.03.1952
Histórico
NºOf.: H-409 > Iic.: C.S.A.J. > Registo: Lisboa, 18.03.1952
Cttor.: Sociétè Anonyme John Cockeril, Hoboken, Belgica, 1951
Tlgns.: Tab 21.765,27 to > Tal 12.603,48 to > Porte 7.832 to
Cpmts.: Ff 185,80 mt > Boca 23,09 mt > Calado médio 8,44 mt
Tlgns.: Tab 21.765,27 to > Tal 12.603,48 to > Porte 7.832 to
Cpmts.: Ff 185,80 mt > Boca 23,09 mt > Calado médio 8,44 mt
Capacidade : 1.242 passageiros > 8 em classe luxo > 190 em 1ª classe > 200 em 2ª classe e 844 em 3ª classe, com uma equipagem permanente de cerca de 300 tripulantes.
Velocidade máxima 22 m/h > velocidade de cruzeiro 20 m/h
Vendido para demolição na Formosa, durante o ano de 1973.
Vendido para demolição na Formosa, durante o ano de 1973.
11 comentários:
Fantástico.
De boca aberta a ler e a reler.
Quanto ao que me diz respeito, sem nada a comentar. Só a aprender.
Obrigado por esta lição de história marítima.
Só uma pequena coisinha:
A cidade de Aveiro tem uma freguesia que se chama de Vera Cruz.
O postal inicial do VERA CRUZ em aprestamento final em Hoboken, Bélgica é um postal editado pelo pintor de marinha Fernando de Lemos Gomes, do Estoril, feito com reprodução de um seu quadro original feito propositadamente para servir de capa do livro
OS NAVIOS DO DESPACHO 100, em preparação por Luís Miguel Correia.
Cumprimentos náuticos...
Eu viajei no Vera Cruz em 1958, vim da Bahia para o Rio de Janeiro. Eu tinha 4 anos de idade e me recordo de todos os detalhes deste lindo, majestoso e elegante navio. Marco que deixou saudades...
Dulce.
Na descrição sobre o "Vera Cruz" quando o narador faz referência à casa das máquinas e que via os grandes pistons girarem para baixo e para cima é simples miragem , o navio era movido a turbinas.
É apenas um pormenor.
Jobersal
Em Junho de 1970 embarquei no Vera Cruz com destino a Luanda. Eramos 9 orgulhosos marinheiros da Armada Portuguesa, os únicos militares a bordo pois íamos em rendição individual a camaradas falecidos ao serviço da Pátria.Ainda hoje recordo a saída de Lisboa como o momento mais tocante da minha já longa vida , mas os momentos vividos a bordo com os colonos que emigravam para Angola rapidamente fizeram esquecer a mágoa da partida. O navio portou-se de forma espectacular e apesar de dois dias de mar cão, nada se notava tal a sua estabilidade. Poderia e muito bem ainda sulcar os mares com a bandeira de Portugal.
A 6 de abril de 1955 saiamos de Lisboa a bordo do Vera Cruz. No dia 7 parou na Ilha da Madeira , onde jogavamos moedas ao mar para os caiçaras apanhá-las com mergulho. Enfim a 19 de abril chegávamos em Santos Minha mãe gravida de 7 meses , meu pai e meu primo Augusto . Recordações maravilhosas e saudosas . Apenas um arrependimento : aos 18 anos me nacionalizei brasileiro por motivos profissionais . Dificil lembrar do Vera Cruz sem lágrimas nos olhos , as lembranças dos patricios acenando lenços brancos.
Boa tarde,
Gostaria de conhecer o nome do médico de bordo nos anos 1954-55-56; era grande amigo dos meus pais e trazia-nos, sempre que voltava do Brasil, uma excelente compota de goiaba que não existia em Lisboa. Boas recordações!
Parabéns pelo belo blog sobre este paquete histórico.
Cumprimentos
Miguel de Paiva Couceiro
Agradeço novos comentários para o email miguel.depaiva@gmail.com
Óla bom dia a todos,tenho em minha posse uma carta timbrada que foi enviada a bordo do navio
Vera cruz 1952 da argentina.
cumprimentos,
José
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