sexta-feira, 9 de novembro de 2018

Construção naval


O lançamento à água do navio-motor "São Macário"

O navio-motor “São Macário” foi ontem lançado à água,
em Lisboa, na presença do Chefe do Estado
Com a assistência do Sr. Presidente da República, membros do Governo e demais entidades oficiais, realizou-se, ontem, como estava anunciado, o lançamento à água do navio mercante “São Macário”.
Desde manhã cedo que os estaleiros da Administração Geral do porto de Lisboa, adjudicados à C.U.F., onde o novo navio-motor foi construído e de onde seria lançado à água, estavam profusamente embandeirados, com o ar festivo dos grandes dias. Pouco antes da hora marcada para o lançamento do navio à água, começaram a chegar aos estaleiros, na Rocha do Conde de Óbidos, as entidades convidadas.
Quando o Sr. Presidente da República chegou, já ali estavam, entre muitas outras pessoas, os Srs. ministro da Marinha e das Colónias, sub-secretários de Estado das Obras Públicas e do Comércio e Indústria, Major-General da Armada, chefe do E.M. Naval, Superintendente Geral da Armada, Diretor-geral de Marinha, chefe do Departamento Marítimo do Centro, chefe de gabinete do ministro da Marinha, etc.
Pelas empresas de navegação, estavam presentes os Srs. Bernardino Correia e capitão José Pessoa, da Companhia Colonial de Navegação; Jaime Thompson, da Companhia Nacional de Navegação; Melo e Silva, da Soc. Geral de Transportes; engº Gago de Medeiros, da Companhia de Navegação Carregadores Açoreanos, muitos oficiais da Armada, funcionários dos Ministérios das Obras Públicas e da Marinha, etc.
Junto à carreira, sobre a qual o “São Macário” deslizou para a água, formava, em frente da tribuna, propositadamente ali construída, a guarda de honra ao Chefe do Estado, constituída por um batalhão de Marinha, com banda de música, fanfarra de clarins e bandeira.
Eram 16 horas em ponto quando chegou aos estaleiros o Sr. Presidente da República, acompanhado pelo Sr. general Amilcar Mota, chefe da sua casa militar. O Sr. general Carmona foi recebido pelo Sr. ministro da Marinha e pelo Sr. D. Manuel de Melo, conde do Cartaxo, como director da C.U.F., empresa construtora do novo navio. Enquanto a banda tocava o Hino Nacional, o Chefe de Estado passou revista à guarda de honra, acompanhado pelo Sr. ministro da Marinha, após o que tomou lugar na tribuna.
Imediatamente procederam à cerimónia, que foi breve, do lançamento à água do navio. O Sr. general Carmona impulsionou a alavanca, que fez estilhaçar uma garrafa de vinho espumoso, em jeito de baptismo, enquanto a banda de Marinha voltava a tocar o Hino Nacional.
E o “São Macário” deslizava pela carreira, entrando no Tejo, no meio das aclamações de numerosos operários que assistiam à cerimónia e dos silvos das sereias dos navios que estavam perto. Um rebocador lançou depois um cabo ao “São Macário”, que ficou a pairar a uma centena de metros de terra.

Postal ilustrado com a imagem do navio-motor "São Macário"
Edição da empresa proprietária - minha colecção

Características do navio-motor “São Macário”
Registo na capitania de Lisboa, em 11 de Abril de 1944
Armador: Soc. Geral de Comércio, Indústria e Transportes, Lisboa
Nº Oficial: G-464 - Iic: C.S.C.H. - Porto de registo: Lisboa
Construtor: Companhia União Fabril, Lisboa, 1944
Arqueação: Tab 1.038,72 tons - Tal 772,03 tons
Dimensões: Ff 66,97 mts - Pp 61,47 mts - Bc 10,83 mts - Ptl 4,09 mts
Propulsão: Sulzer Frérès - 1:Di - 5:Ci - 500 Bhp - Veloc. 9 m/h
Equipagem: 19 tripulantes com acomodações para 6 passageiros

Fala o Sr. D. Manuel de Melo
Foi, então, que o Sr. D. Manuel de Melo, como gerente da C.U.F., pronunciou um discurso em que começou por saudar o Chefe de Estado e os membros do Governo, cuja presença agradeceu. Historiou, depois, rapidamente, a acção da C.U.F., em matéria de construção de navios mercantes, dizendo que, embora muito se tenha feito, muito mais é preciso fazer. Portugal precisa de aumentar a sua frota mercante, para que a bandeira portuguesa volte a flutuar nos navios que hão-de aproar aos vários pontos do Império, à Índia, a Macau e a Timor, e, também, às nações onde temos colónias populacionais importantes, como o Brasil e os Estados Unidos da América do Norte.
Alguma coisa se tem feito – repete – mas mais ainda é necessário fazer. Seguidamente, o orador pediu ao Chefe do Estado e aos ministros que olhem para a Marinha Mercante, não só com o carinho posto em tudo quanto é de interesse nacional, mas que a tratem com desvelo e cuidados especiais, como se deve merecer a um pai, ou a um filho. Disse, depois, que, apesar da sua insuficiência, é à Marinha Mercante que se deve, em grande parte, o abastecimento do País, mercê do esforço quase heroico que tem sido possível realizar no transporte de géneros alimentícios de primeira necessidade.
O orador acrescentou que para se construírem os navios que o País precisa há que modificar os estaleiros do porto de Lisboa. No entanto – acentuou – o desenvolvimento da Marinha Mercante só poderá conseguir desde que se estabeleça, em condições interessantes, um subsídio à construção, aliviando-a dos encargos que sobre ela pesam.
E a seguir:
- O “São Macário” é a décima unidade da marinha mercante construída nestes estaleiros. Estão, porém, em construção, mais dois arrastões para a Sociedade Nacional dos Armadores do Bacalhau, e um navio de carga, do tipo do “Alexandre Silva”, último navio que se construiu. Dentro em breve, daremos início à construção do terceiro navio do mesmo tipo. E, logo que se consiga o material indispensável, daremos execução ao projecto de construção de mais dois navios de cerca de 9.000 toneladas, cada, mistos, de passageiros e de carga.
E terminou:
- Levou este navio o nome de “São Macário”, santo patrono dos caldeireiros. E, assim, prestamos homenagem ao esforço e boa vontade demonstrada pelos operários nas construções. Que Deus proteja esta nova unidade e que à Nação ele preste o serviço que inspirou a sua construção, correspondendo ao esforço feito a bem da Nação.

Fala o Sr. Presidente da República
O Sr. general Carmona proferiu, depois, algumas palavras e cumprimentou o Sr. D. Manuel de Melo, como director da organização construtora do novo navio mercante, tendo palavras de grande elogio para todos quantos colaboraram na construção do “São Macário”. Fez votos para que a nova unidade venha contribuir para a expansão económica da Nação e da Sociedade Geral de Transportes, congratulando-se por ter assistido a mais uma cerimónia desta natureza, produto da situação progressiva do País.
O Sr. Presidente da República abandonou, em seguida, a tribuna, sob as aclamações entusiásticas e demoradas da assistência, dando-se por finda a cerimónia.

A nova unidade
O “São Macário” é um navio com todos os requisitos modernos, com deslocamento de 1.774 toneladas, comprimento de 66 metros, accionado por motores «Diesel», a dois tempos, que lhe garantem a velocidade de 9,5 nós, num raio de acção de 9.000 milhas. Toda a aparelhagem de bordo é eléctrica. Dispõe de compartimentos estanques e amplos porões, bem como de alguns camarotes para certo número de passageiros.
O novo navio foi construído sob fiscalização de técnicos da Marinha Mercante, do Ministério da Marinha e dos peritos da Sociedade de Fiscalização «Lloyd’s Register of Shipping». O “São Macário” obterá a mais alta classificação desta Sociedade.
(Jornal “Comércio do Porto”, quinta-feira, 27 de Janeiro de 1944)

O “São Macário” vai fazer a sua primeira viagem
Dentro de dias, a direcção dos estaleiros da C.U.F. fará a entrega do “São Macário” à Soc. Geral de Comércio, Indústria e Transportes, Lda.
O “São Macário”, que há dias foi lançado à água, já em Fevereiro vai fazer a primeira viagem, ao serviço da economia nacional.
Foi designado para ir a Casablanca buscar fosfatos, mercadoria por cuja vinda para Portugal, o Governo tem manifestado grande interesse, para o tratamento das terras, nesta hora de necessidades, em que é preciso garantir uma melhor e mais rendosa produção de artigos essenciais ao abastecimento do País.
Ontem, chegou, com 1.300 toneladas daquele produto o navio “Costeiro Terceiro”, também daquela empresa.
(Jornal “Comércio do Porto”, sábado, 29 de Janeiro de 1944)

Sem comentários: