quarta-feira, 27 de março de 2019

Leixões na rota do turismo! (2-19)


Navios de passageiros em porto no mês de Fevereiro

Começam a chegar os primeiros navios a Leixões, ainda poucos como abaixo se pode constatar. No caso do "Mein Schiff 2", estava ainda a cumprir a viagem inaugural, tendo saído recentemente do estaleiro, com uma única escala anterior no porto da Corunha.
Continuou a viagem até ao porto da capital, onde permaneceu durante alguns dias, para receber o baptismo da praxe.
Quanto ao movimento de cruzeiros para este ano, a previsão aponta para um continuado aumento de escalas, turistas e tripulantes, com eventuais novidades a curto prazo.

Navio de passageiros "Mein Schiff 2"
No dia 7, chegou procedente da Corunha, saiu para Lisboa

Navio de passageiros "AidaMar"
No dia 23, chegou procedente de Lisboa, seguiu com destino ao Ferrol

terça-feira, 19 de março de 2019

Histórias do mar português!


Há salva-vidas, falta a tripulação (1)

Foto do barco salva-vidas "Patrão César Martins"
Imagem da colecção de Rui Picarote Amaro / I.S.N.

Chegou à Póvoa de Varzim, vindo de Aveiro, dos estaleiros Mónica, o novo salva-vidas “Patrão César Martins”, construído especialmente com destino ao porto de pesca. O barco foi tripulado pelos patrões, Augusto do Monte, João Bompastor e Manuel Viana, da Póvoa de Varzim, Caxinas e Vila do Conde, respectivamente.
Recorde-se que este salva-vidas encalhou na praia de Mira quando, em Agosto passado, vinha em viagem para a Póvoa. Os estragos então produzidos foram reparados nos estaleiros onde havia sido construído, levando cerca de três meses (com demora provocada também pelo mau tempo que ultimamente tem assolado o Norte).
Agora já há salva-vidas, mas não tem tripulação, uma vez que terminou o serviço da anterior e actualmente não há voluntários. Também o patrão, Augusto do Monte, está demissionário, por razões de ordem económica (escassa remuneração para tão arriscada profissão). O novo barco necessita de, pelo menos, seis tripulantes – para o que está aberto concurso.
Entretanto, foi sugerido ser revisto o nome do salva-vidas, substituindo-o pelo nome de um herói poveiro, pois o actual nome, atribuído em Aveiro, nada diz à gente desta praia.
O nome do “Cego do Maio”, uma vez destruído o velho barco que ostentava o do herói máximo da Póvoa, seria o mais indicado para o novo salva-vidas. Há esperança que tal possa suceder, sem desprestigio para o “Patrão César Martins”, certamente merecedor da homenagem, mas na parcela da costa onde se notabilizou (mestre de um rebocador de Viana do Castelo, que morreu em serviço no seu posto).

Notícia publicada no jornal “Comércio do Porto”, em: (1) Quinta-feira, 18 de Novembro de 1976

Foto do salva-vidas "Cego do Maio", no Museu Municipal
Imagem da minha colecção

A notícia em si tem contornos interessantes, mas é questionável, sem haver o mínimo conhecimento in loco das condições, que se apresentavam na estação do I.S.N. poveiro.
Posto isto, como se entende a presença do arrais local na condução do salva-vidas de Aveiro para a Póvoa? E, se é verdade que o salva-vidas “Cego do Maio” apresentava sinais de enorme degradação, é vê-lo agora totalmente reparado e recuperado, em exposição no Museu Municipal, memória inesquecível pelos muitos salvamentos que realizou ao longo dos anos.

domingo, 17 de março de 2019

História trágico-marítima (CCCVII)


Encalhe de um vapor (1)

Mais um encalhe acaba de ocorrer na barra do Douro. Há longos anos que se discutem e se esperam os indispensáveis melhoramentos, e os anos passam, sem que essa legítima aspiração seja realizada! E se é preciso melhorar as condições na barra do Douro, revela-se igualmente da maior importância terminar as obras no porto de Leixões.
Completado aquele porto, dotado que fique com os elementos precisos para o trafego mercantil, ambos os portos ficarão em condições de corresponder às contingências do comércio e da navegação actual.
Postas estas considerações, relatamos o sinistro de ante-ontem.
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No Domingo, perto das 6 horas da tarde, quando vinha a entrar a barra, o vapor espanhol “Cresalubi”, apanhando uma violenta volta de mar, descaiu para o sul e encalhou na restinga do Cabedelo, tendo ficado numa situação bastante perigosa.
Dado o alarme, acudiram com presteza os salva-vidas da Foz e Afurada e pouco depois chegaram os rebocadores “Burnay 2º” e “Magnete”, juntando-se na praia e paredões do Passeio Alegre muita gente.
Os dois rebocadores lançaram amarretas para o “Cresalubi”, realizando várias manobras para o safar; mas, como nada conseguiram até ao fim da tarde, suspenderam os trabalhos, para prosseguirem em melhor oportunidade.
A tripulação sob o comando do capitão, veio para terra nos barcos salva-vidas. Antes, porém, de abandonar o navio, tiraram o vapor à caldeira e tomadas outras providências. O vapor “Cresalubi” foi construído nos estaleiros de Newcastle, em 1881. Tem 766 toneladas de registo e mede 244 pés de comprido e 33 de largo. Pertence à Saracho & Menchaca, da praça de Bilbao.
O navio veio de Cardiff com carvão, tendo entrado no dia 6 do corrente em Leixões, onde, para aliviar parte da carga, descarregou 500 toneladas, vindo no Domingo com o fim de fundear no rio Douro para descarregar mais 1.000 toneladas de carvão, destinado à firma Leonardo A. dos Santos. O navio veio consignado aos srs. Vareta, Santos & Cª., Lda., sendo que as empresas são da praça do Porto.
O vapor por muito tempo de propriedade inglesa, esteve por lá encalhado, algum tempo antes da guerra, foi entretanto salvo por uns espanhóis, que o compraram à companhia a que pertencia. O casco está seguro em quatro companhias estrangeiras.
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A delegação da Afurada do Instituto de Socorros a Náufragos, através de uma nota do respectivo delegado, sr. Joaquim Pereira dos Santos, na qual informa que no sinistro de ante-ontem se salientou o pessoal do salva-vidas a cargo daquela delegação, salvando os 24 homens da tripulação do “Cresalubi”.
Afirma também que os milhares de pessoas que se encontravam no cais, ovacionaram a tripulação do salva-vidas durante muito tempo, pela coragem que mostrou e pelo risco que correu.
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A tripulação do vapor “Cresalubi” ficou hospedada no Hotel Boavista, na esplanada do Castelo, à Foz.
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Durante a noite de ante-ontem para ontem o navio impelido pelas vagas um tanto alterosas e arrastado pela corrente da água, andou um pouco para o norte, ficando com a proa na ponta do Cabedelo.
De manhã os tripulantes foram a bordo buscar os seus haveres, retirando logo para terra. De tarde foram iniciados os trabalhos para tentar pôr o navio a flutuar. Como o capitão e os restantes tripulantes se negassem a ir para bordo auxiliar esses trabalhos, o chefe do Departamento Marítimo do Norte, conseguiu que fossem para ali algumas praças de marinha, embarcados nas canhoneiras “Ivo” e “Mandovi”, bem como vários pescadores da Afurada.
Para o local foram os rebocadores “Lusitânia” e “Magnete”, bem como alguns barcos da Afurada. Os dois rebocadores passaram amarras para bordo do “Cresalubi” e, por volta das 5 horas da tarde, apesar do mar estar agitado, começaram os trabalhos para o desencalhe. As tentativas foram infrutíferas, pois que as amarretas rebentaram.
Como às 7 horas a maré começasse a vazar, suspenderam os trabalhos, retirando os rebocadores e o pessoal que estava a bordo, vindo para terra no salva-vidas. Os trabalhos devem prosseguir esta manhã.
Durante os trabalhos estacionaram na praia e no paredão do Passeio Alegre centenas de pessoas, muitas das quais, devido às vagas alterosas, foram surpreendidos por verdadeiros banhos de chuva, que as deixava encharcadas.
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Ao que consta o navio não tinha até ontem nenhum rombo; mas tem algumas chapas amolgadas, a máquina deslocada, os tubos de descarga avariados e a chaminé partida. O lastro, que é de cimento, também ficou deslocado.
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Segundo parece, um dos proprietários do vapor deve chegar hoje ao Porto para, com ele, ser combinado a descarga de parte do carvão, pelo que ficando o navio com o casco aliviado, será mais fácil deslocar o “Cresalubi”, se na maré da manhã de hoje nada fôr conseguido.

Imagem do navio “Cresalubi” encalhado na barra do Douro
Foto da minha colecção

Características do vapor espanhol “Cresalubi”
1912 – 1921
Armador: Saracho & Menchaca, Bilbao
Nº Oficial: N/d - Iic: H.J.L.S. - Porto de registo: Bilbao
Construtor: Palmers' Shipbuilding & Eng. Co., Ltd., Newcastle
ex “Tredegar”, Tredegar S.S. Co., Ltd., Cardiff, 1881-1907
Operador: Morel Brothers & Co., Cardiff
ex “Cresalubi“, Urtiaga & Castillo, Bilbao, 1907-1912
Arqueação: Tab 1.341,00 tons - Tal 755,00 tons
Dimensões: Pp 74,42 mts - Boca 10,08 mts - Pontal 4,67 mts
Propulsão: Palmers' Co., Ltd - 1 Compósito - 2:Ci - 162 Nhp
Equipagem: 24 tripulantes

Vapor naufragado (2)
Ficou ontem partido a meio o vapor espanhol “Cresalubi”, que encalhara à entrada da barra do Douro. Oxalá não resulte desta catástrofe ficar prejudicado o canal da barra, de modo a dificultar a passagem dos navios. Seria o cúmulo da calamidade e mais um elemento para descrédito da barra do Douro.
Tudo aconselha que se cuide com afã dos melhoramentos marítimos, procurando realizar sem detença os planos já aprovados. Em casos como o que se dá agora, de ser preciso salvar os restos de navios naufragados em condições de poderem prejudicar a navegação, a intervenção da Junta Autónoma das Instalações Marítimas (Douro-Leixões) deveria ser obrigatória, quando mais não fosse para regular o que mais conviesse aos interesses da cidade.
De outra maneira, poderão conduzir-se os trabalhos por forma que prejudiquem a navegação e concorram para lesar o bom nome do porto. Descuidos, condescendências, adiamentos, em matéria tão delicada, poderão acarretar consequências seríssimas, que por todas as formas devem ser evitadas.
Narremos o que ontem se passou:
O vapor partido
A despeito de todos os esforços empregados para o pôr a flutuar, está perdido o vapor espanhol “Cresalubi”, que encalhou Domingo último, na restinga do Cabedelo.
Ontem, de manhã, devido à agitação do mar, não foram para o lugar nenhuns barcos ou rebocadores proceder a qualquer trabalho tendente a safar o navio. O mar continuou agitado, indo as vagas açoutar com certa violência o casco do navio, que não modificou a posição que tomara no dia anterior, tendo afluído à praia crescido número de pessoas a ver o vapor, que os mais entendidos já julgavam irremediavelmente perdido.
Efectivamente, ontem, por volta das 11 horas e meia da manhã foi ouvido um enorme ruído, quase como a detonação de uma explosão, vendo-se que o navio partira a meio, por altura da casa das máquinas. Houve certo alvoroço, acudindo à praia muita gente na informar-se do que se tratava.
As autoridades aduaneiras
Considerado assim perdido por completo o navio, que começou a ser invadido pela água das vagas, foram ao lugar onde se deu o sinistro alguns funcionários aduaneiros e oficiais e praças da Guarda-fiscal, que tomaram conta do navio para efeito da posse dos salvados, estabelecendo-se um serviço de vigilância por praças da referida guarda, no Cabedelo e na Foz.
Os serviços de salvamento de materiais começa hoje, procurando desde logo retirar tudo que diz respeito à instalação de telegrafia sem fios, que é valiosa.
Várias notas
O navio ainda tem arvorada a bandeira espanhola. A tripulação já encetou negociações com o Sr. cônsul de Espanha no Porto para efeito da sua repatriação.

Vapor naufragado - Defesa da barra (3)
A situação em que se encontra o vapor “Cresalubi”, naufragado à entrada da barra do Douro, é de molde a inspirar as mais sérias preocupações. Se o navio continuar a descair sobre o canal da barra, poderá constituir um impedimento para a navegação.
Se a Junta Autónoma das Instalações Marítimas (Douro-Leixões) tivesse intervenção no assunto, certamente faria adoptar as providências indispensáveis para obstar a esse gravíssimo inconveniente e outros desastres supervenientes. A Junta Autónoma não tem, porém, intervenção alguma, porque os regulamentos aduaneiros lho vedam.
Desta maneira, a única corporação com capacidade para velar pelas condições do porto vê-se indevidamente deslocada, sem vantagens para ninguém, antes com prejuízo e descredito sensível para esta praça.
Convençam-se os poderes públicos de que, enquanto assim suceder, este porto estará sujeito às mais graves contingências. Os serviços aduaneiros deveriam ter definida a sua esfera de acção, reservando-se os do salvamento e de defesa das condições do porto para a Junta Autónoma, para esse fim devidamente preparada. O contrário do que aqui apontamos não passa de flagrante contrassenso.
O salvamento do carvão
Ontem foram iniciados os preparativos para ser principiada a descarga do carvão, sendo colocada uma prancha do areal para bordo.

O vapor naufragado (4)
Não se modificou a situação do vapor espanhol “Cresalubi”, naufragado, como é notório, à entrada da barra do rio Douro.
Ontem, a tripulação do navio passou alguns cabos dos mastros para estacas colocadas no Cabedelo, a fim de mantê-lo em equilíbrio.
Hoje, de manhã, devem começar a proceder à descarga do carvão, por conta da firma que o arrematou.

O vapor naufragado (5)
Começou ontem a ser feita a descarga do carvão que se encontra a bordo do vapor “Cresalubi” naufragado, como é sabido, no Cabedelo, à entrada da barra do Douro.
De bordo do vapor para o Cabedelo foi construída uma ponte-prancha, sendo a descarga feita por mulheres, que conduzem o combustível para uma barcaça.
Ante-ontem o piloto-mor e outros membros da corporação, tomaram lugar em duas catraias, procedendo a uma ligeira sondagem na barra, constando que, em alguns pontos a encontraram bastante assoreada.

Encalhe do vapor “Cresalubi” (6)
Referindo-se ao encalhe do vapor “Cresalubi”, o sr. presidente da Associação Comercial lamentou o facto, que mais uma vez veio pôr em evidência o desgraçado estado em que se encontra a barra do Douro, devido ao seu assoreamento, situação esta ainda mais agravada por falta de cheias no rio.
Ao calamitoso estado da barra, que não só impossibilita o acesso à grande navegação, como dificulta a entrada aos navios de menor calado, há a acrescentar a carência de meios de salvação, como foi notado durante os esforços empregados para safar o “Cresalubi”, da critica situação em que ainda se encontra.
É, realmente, lamentável que os rebocadores de maior potencia, como o “Mars” e o “Tritão”, que excelentes serviços podiam prestar para o salvamento do vapor, nada pudessem fazer em tal conjuntura, devido ao mau estado desses barcos.
Porque todos os reparos são justificados contra semelhante incúria, que bem patenteia o desamor com que continuam a ser olhados os interesses desta terra, o sr. presidente propôs que se oficiasse as estações competentes, reclamando adequadas providências.
O sr. Carlos de Lima, referindo-se também ao assunto, alvitra que no ofício a enviar pelo Centro Comercial se acentue a imperiosa necessidade de serem tomadas, desde já, providências no sentido de evitar que o casco do “Cresalubi” venha a obstruir por completo a barra, o que afetaria grandemente os interesses económicos desta praça.

Três meses depois, muito naturalmente voltou a acontecer, o que devia ter sido evitado, ou seja, desfazer o casco do navio atravessado no canal de navegação!...

O vapor “Cresalubi” – A sua destruição (7)
Tem continuado a ser destruído com dinamite o casco do vapor espanhol “Cresalubi”, que vindo a entrar a barra do Douro, no dia 13 de Março último, naufragara na ponta do Cabedelo.
Ontem foram feitos bastantes tiros, ouvindo-se na cidade as fortes detonações, que muito excitaram a curiosidade das pessoas que desconheciam a causa.
Bom será que, dentro em pouco, o canal da barra fique livre dos fragmentos do naufragado vapor.

Notícias publicadas no jornal “Comércio do Porto”, em: (1) Terça-feira, 15 de Março; (2) quarta-feira, 16 de Março; (3) quinta-feira, 17 de Março; (4) sexta-feira, 18 de Março; (5) terça-feira, 22 de Março; (6) quinta-feira, 24 de Março; e (7) quarta-feira, 15 de Junho de 1921

sábado, 9 de março de 2019

História trágico-marítima (CCCVI)


O naufrágio do vapor de pesca “Regal”

Naufrágio (1)
No dia 27 último, pela 3 horas e meia da manha, deu à costa a norte da Torreira, o navio de pesca inglês “Regal”, com 11 homens de tripulação, que foram salvos. Compareceram no local o Capitão do porto de Aveiro e o comandante da secção fiscal, após o que deram início aos trabalhos de salvação dos aparelhos. O casco do navio está perdido.

Naufrágio (2)
Naufragou no dia 27, na praia da Torreira, um pouco ao norte dos palheiros, o vapor de pesca “Regal” GY158, de nacionalidade inglesa.
A tripulação, que é composta por 11 homens foi salva. O navio acha-se perdido. Muitos dos nossos pescadores, tem andado todo o dia de hoje ocupados a salvar apetrechos, rancho, etc.

Naufrágio (3)
Perto da Torreira naufragou na semana passada o vapor de pesca “Regal GY158”, da praça de Grimsby. A tripulação que era composta de 11 homens, salvou-se toda.

O vapor encalhado na Torreira (4)
Tem sido muito visitado o navio inglês de pesca, que há dias encalhou na costa da Torreira, ao norte, em frente da ermida de S. Paio.
Diz-se que o motivo do naufrágio foram a cerração imensa e a quebra de uma parte do leme, causando a desorientação à tripulação, que deve ter passado horas de desânimo e de aflição.
O navio entrou pela costa, a ponto dos tripulantes poderem sair de bordo de pé enxuto. Como ali não encontrassem ninguém que os entendesse, foi participado o caso à Capitania de Aveiro, e os náufragos seguiram para o Porto, onde foram apresentar-se ao seu cônsul.
O navio julga-se perdido, tendo sido salvo tudo o que trazia a bordo, porém, consta que antes de terem chegado as autoridades, alguns objectos foram roubados.

Imagem do vapor "Regal", encalhado a norte da Torreira
Foto de Henrique Ramos - Colecção Arquivo Digital de Aveiro

Características do vapor de pesca “Regal” (GY158)
1919 – 1923
Nº Oficial: 123573 - Iic: N/d - Porto de registo: Grimsby
Armador: William A. Butt & Outros, Grimsby
Operador: Loyal Steam Fishing, Grimsby
Construtor: Cook, Welton & Gemmell Ltd., Hull Julho 1906
ex “Regal”, Marinha Inglesa (FY 1539), Londres, 1915-1919
ex “Regal”, Armador: William A. Butt & Outros, Grimsby
Operador: Loyal Steam Fishing, Grimsby, 1906-1915
Arqueação: Tab 212,00 tons - Tal 195,00 tons
Dimensões: Pp 35,36 mts - Boca 6,55 mts - Pontal 3,48 mts
Propulsão: Amos & Smith, Ltd., Hull - 1:Te - 63 Nhp - 10,5 m/h
Equipagem: 11 tripulantes

O encalhe do vapor “Regal” (5)
Continua na mesma posição o vapor “Regal, que encalhou ao norte da Torreira. Tem aqui vindo diversos representantes das casas do Porto a fim de estudarem o meio de o salvarem, mas até à data não lhe mexeram, continuando o navio guardado por praças da Guarda-fiscal.
Ao contrário do que afirma o Jornal d’Estarreja, é falso terem havido roubos antes da chegada das autoridades, visto que estes foram os primeiros a chegar ao navio.

O encalhe do vapor “Regal” (6)
Principiaram os trabalhos para salvarem este navio, que aqui encalhou. Quando este jornal voltar a circular já deve estar salvo.

O encalhe do vapor “Regal” (7)
No dia 24 último, procuraram mais uma vez salvar o navio “Regal”, encalhado ao norte da Torreira, tendo vindo para esse fim o rebocador “Lusitânia”, da praça do Porto, não tendo sido possível salvá-lo, devido à pouca força que empregaram, como também ao estado do mar.

O encalhe do vapor “Regal” (8)
Após todas as tentativas para salvarem o vapor, encalhado ao norte da Torreira, resolveram tirá-lo aos bocados, o que já há muito se previa.

Notícias publicadas em: (1) Revista da Torreira, Domingo, 1 de Julho; (2) Jornal d’Estarreja, Domingo, 1 de Julho; (3) Jornal “O Ilhavense”, quinta-feira, 5 de Julho; (4) Jornal d’Estarreja, Domingo, 8 de Julho; (5) Revista da Torreira, Domingo, 15 de Julho; (6) Revista da Torreira, segunda-feira, 31 de Julho; (7) Revista da Torreira, sábado, 1 de Setembro; e (8) Revista da Torreira, Domingo, 16 de Setembro de 1923

sexta-feira, 8 de março de 2019

Divulgação!


Conferência do Seminário do Mar
"Portugal, a CPLP e o Mar: das palavras aos atos?"


quarta-feira, 6 de março de 2019

História trágico-marítima (CCCV)


O vapor “North Pacific” incendiado em Leixões (1)
Importantes prejuízos – Socorros – O navio salvo

A bordo do vapor inglês “North Pacific”, fundeado na bacia de Leixões, deu-se, ante-ontem, de madrugada, alarme de fogo, pedindo socorros para terra, pois a tripulação descobrira que lavrava incêndio no porão nº 2, da proa.
Compareceram os Bombeiros Voluntários de Matosinhos-Leça que trabalharam com a tripulação, mas uns e outros eram impotentes para dominar o incêndio, que tomara grande incremento no mencionado porão, onde havia grande quantidade de milho, farinha de pau, açúcar e cortiça, esta ultimamente embarcada em Lisboa.
Dada a impossibilidade de conseguirem um ataque eficaz, foram solicitados os socorros dos Bombeiros Voluntários e Municipais do Porto, que logo avançaram para Leixões.
Entretanto acudiram os rebocadores “Douro” e “Lusitânia” para inundar o porão incendiado, utilizando as suas bombas de bordo.
Para facilitar os trabalhos de extinção, fizeram encalhar a proa do “North Pacific” na praia de Matosinhos, junto à foz do rio Leça, onde encostaram os citados rebocadores e a draga “Porto”, lançando para o porão grande quantidade de água.
Os trabalhos, muito fatigantes, porque o calor era intenso, prosseguiram todo o dia de ante-ontem; pelo final da tarde, já havia sido rendido o pessoal, verificando-se que o fogo se havia propagado ao porão nº 1, também da proa, onde existiam muitas mercadorias.
Os bombeiros e mais pessoal mantiveram-se a trabalhar toda a noite, havendo grande dificuldade nos serviços para evitar que a casa das máquinas fosse inundada.
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O vapor inglês “North Pacific”, comandado pelo capitão W.A. Donnely, entrou em Leixões no dia 22 do corrente, procedente de Buenos Aires, Rio de Janeiro, e Pernambuco (via Lisboa), com carga geral para o Porto e em transito.
O navio, todo de ferro, foi construído nos estaleiros J.L. Thompson & Sons, Ltd., de Sunderland, praça onde ficou registado. Tem 116 metros de comprimento, 16 metros de largo e 7 metros de altura. Pelo Lloyd foi este vapor classificado como de 1ª classe e pertence a Nicholas E. Ambaticlos (Felix S.S. Co., Ltd.). O vapor vinha consignado à casa Garland Laidley & Cª., da praça do Porto.
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Para melhor trabalharem foi atracado um lanchão, onde manobravam os bombeiros, bem como alguns alunos da Escola de Marinheiros. Os trabalhos demoraram ontem durante o dia, tendo sido feito uns rombos a certa altura do costado do casco, para por ali se posicionarem alguns jactos de água, o que deu o melhor resultado. Também prestou serviços o rebocador “Mars”.
Para Leixões foi o pessoal da Cruz Vermelha, com algum material, pronto a prestar socorro, em caso de desastre.
A bordo do vapor incendiado estiveram o chefe do Departamento Marítimo do Norte, Sr. contra-almirante Alfredo Howell e o capitão do porto, Sr. comandante Carlos Braga.
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Os trabalhos de extinção do incêndio prolongaram-se durante o dia, até que às 4 horas da tarde estava extinto o incêndio, passando o pessoal a tratar dos serviços de rescaldo e de algumas remoções.
Às 5 horas e meia retiraram os bombeiros de bordo, assim como se afastou a draga “Porto”. Ficaram perto, de prevenção, os rebocadores “Lusitânia”, “Douro” e “Mars”.
O vapor “North Pacific” deve ser hoje desencalhado e levado para novo fundeadouro. Os prejuízos, que são grandes, no vapor e na carga, estão cobertos por diversas companhias de seguros.
Durante os dias de ante-ontem e ontem afluíram à praia de Matosinhos numerosas pessoas, a ver o vapor incendiado.

Desenho de navio mercante, sem correspondência ao texto

Características do vapor “North Pacific”
1913 – 1946
Nº Oficial: 132072 - Iic: J.C.G.Q. - Porto de registo: Sunderland
Armador: Newfoundland Maritime Co. Ltd., 1920-1923
c/o: Japp, Hatch & Co. Ltd., Sunderland, Montreal
Operador: E. H. Mundy & Co. Ltd., Sunderland
Construtor: J.L. Thompson & Sons, Ltd., North Sands, 9.5.1913
ex “North Pacific”, Pacific Shipping Co. Ltd., Sunderland, 1913-1915
ex “North Pacific”, Felix S.S. Co., Ltd., Londres, 1915-1920
dp “North Pacific”, Exmouth S.S. Co. Ltd., Exmouth, 1923-1934
Operador: Anning Brothers, Cardiff
dp “Csikos”, Anglo-Hungarian Shipping Co., Budapest, 1934-1940
Operador: G. Barta, Budapest
dp “Csikos”, Kentships Ltd., Londres, 1940-1942
Operador: Craggs & Co., London
dp “Vinlake”, Kentships Ltd., Londres, 1942-1944
dp “Vinlake”, Ministério dos Transportes de Guerra, Londres, 1944
Arqueação: Tab 3.931,00 tons - Tal 2.492,00 tons
Dimensões: Pp 115,65 mts - Boca 16,15 mts - Pontal 6,93 mts
Propulsão: J. Dickinson & Sons Ltd., 1:Te - 399 Nhp - 1 hélice
O navio foi afundado propositadamente em 9 de Junho de 1944, no porto de Gooseberry, Normandia. Em 1946 foi reposto a flutuar e rebocado para encalhar na praia de St. Maws, em Falmouth. Ainda no decorrer do mesmo ano seguiu rebocado para o porto de Milford Haven, onde foi desmantelado pela firma T.W. Ward, Ltd.

O vapor incendiado (2)
Tem continuado afanosamente, de dia e de noite, os serviços de esgotamento da água atirada para os porões nºs 1 e 2 do vapor inglês “North Pacific”, onde foi detetado um incêndio, quando o navio se encontrava na bacia de Leixões.
Nesse serviço têm sido empregadas as bombas dos rebocadores ali presentes. Na baixa-mar de ontem foram tapados os rombos feitos no casco do vapor, para o inundar. O “North Pacific” deve ser transferido, durante a maré, do local onde se encontra para novo fundeadouro, onde vão dar início à descarga da mercadoria que o navio transporta.

As notícias (1 e 2) estão publicadas no jornal “Comércio do Porto”, de sábado, 26 de Março e Domingo, 27 de Março de 1921

segunda-feira, 4 de março de 2019

Histórias do mar português


O lugre “Fernanda”, de Viana do Castelo

Dizia o comandante Villiers, em determinado momento da sua admirável e profícua existência, que ninguém melhor que os portugueses para identificarem um bom navio.
O lugre “Fernanda” pode ter sido um dos tais navios a justificar tal apreciação, muito embora a vox populi defenda, que também era mau porque o mar não o quis.
De uma forma ou outra, permite relatar várias histórias que merecerem ser lembradas, independentemente do facto de encontrarmos situações semelhantes ou paralelas, que possam ter acontecido com outros navios, ao longo dos anos.
Senão, vejamos, no decorrer do ano de 1930:

Lugre “Fernanda” (1)
«Entrou no dia 1 o lugre "Fernanda", capitão Bazílio Vieira de Carvalho. O barco ficou em seco de popa, no canal da doca e, torcendo, devido à corrente, aproximou a proa do cais, em risco de bater no alicerce do mesmo. Vinte e tantos homens que observavam o risco que o navio corria, preparam-se imediatamente para evitar o embate do barco contra o cais, correndo para ele, dispostos a sofreá-lo com as costas e a pulso.
Felizmente não foi preciso isso, visto que de bordo lançaram uma espia para o molhe sul, que aguentou o navio.
A atitude daqueles homens deve-se ao navio pertencer ao sr. João Alves Cerqueira, que tem na maioria dos nossos pescadores verdadeiros amigos. Manifestaram assim a sua gratidão a quem sabe ser amigo do seu amigo e é um grande protetor dos necessitados. O sr. João Alves Cerqueira tudo merece, que o digam os seus empregados e nós próprios».

Características do lugre “Fernanda”
De 1919 a 1925
Armador: Sociedade Vianense de Cabotagem, Viana do Castelo
Nº Oficial : -?- - Iic: H.F.E.R. - Registo: Viana do Castelo
Construtor: Fr. Cerzon, Noya (Galiza), Espanha, 1918
ex lugre “Galicia“, D. M. Linares, Vilagarcia, Espanha, 1918-1919
Arqueação: Tab 135,16 tons - Tal 115,88 tons
Dimensões: Pp 32,00 mts - Boca 7,53 mt - Pontal 3,01 mts
Propulsão: À vela
Equipagem : 7 tripulantes
De 1925 a 1927
Armador: Bernardo Pinto Abrunhosa, Viana do Castelo
Nº Oficial: 64 - Iic: H.F.E.R. - Registo: Viana do Castelo
Arqueação: Tab 135,16 tons - Tal 115,88 tons
Dimensões: Pp 32,00 mts - Boca 7,53 mts - Pontal 3,01 mts
Propulsão: À vela
Equipagem: 7 tripulantes
A compra do lugre pelo referido armador, foi formalizada a 19 de Julho de 1924, pelo valor de 50.000$00 (escudos), tendo o registo para operar no pequeno trafego costeiro, sido realizado na Capitania do porto de Viana do Castelo, a 24 de Maio de 1925.

De 1927 a 1931
Armador: Herdeiros de Bernardo Pinto Abrunhosa, Viana do Castelo
Nº Oficial: 64 - Iic: H.F.E.R. - Registo: Viana do Castelo
Arqueação: Tab 146,95 tons - Tal 125,93 tons
Dimensões: Pp 28,62 mts - Boca 7,50 mts - Pontal 3,11 mts
Propulsão: À vela
Equipagem: 7 tripulantes
Por motivo do falecimento do armador, o lugre foi transferido para a propriedade dos seus herdeiros, que entretanto o mantiveram sob fretamento a João Alves Cerqueira. Já em 23 de Abril de 1931, foi concretizado o negócio de venda do navio, ao operador em exercício, pela importância de 3.000$00 (escudos), a que se seguiu a oficialização do registo, também para o pequeno trafego costeiro, ainda na Capitania do porto de Viana do Castelo, a 18 de Maio de 1931.

Lugre “Fernanda” (2)
«Este navio da nossa praça, propriedade do nosso bom amigo sr. João Alves Cerqueira, esteve em grande perigo, no alto mar, quando em viagem para Vila Real de Santo António foi acometido pelos temporais de Janeiro. Já ninguém contava com notícias suas, tão violentos e demorados foram esses temporais que tantos naufrágios e vitimas causaram.
Sob a maior tormenta que se tem desencadeado no oceano, o “Fernanda” navegou por esse mar imenso, indo arribar a Gibraltar. O que foi essa viagem relatou-nos o seu capitão, sr. Bazílio de Carvalho, já experimentado nas lutas do mar e em naufrágios terríveis.
Os marinheiros, exaustos, sem forças, tamanhos haviam sido os esforços de sete dias de luta, navegando sem faróis, pois o temporal não consentia que essa pequena luz abrisse um clarão nas trevas, nem acendessem lume para aquecer uma gota de água que, ingerida, os animasse e lhes tirasse, por um momento que fosse, o frio que os regelava e entorpecia os membros, não descrendo da Fé que os acalenta, imploraram o auxílio da Virgem. E Ela não lhes negou esse auxílio. Protegeu-os. Levou-os a Gibraltar. A entrada do “Fernanda” naquele porto causou admiração a toda a gente, pois custava a crer que um barco quase desmantelado, com os panos em tiras, o cordame e as enxárcias afrouxadas pelo vergar dos mastros, desgornidos os amantilhos, resistisse a tão formidável temporal.
Homens crentes, apegaram-se à Virgem. Cheios de Fé, sob o fuzilar do relâmpago e o ribombar do trovão, quando uma vaga enorme lhes arrebatava um companheiro, que a mesma vaga tornou a colocar no convés, prometeram uma missa à Senhora da Agonia e outra à Virgem da Bonança. E aí andam, percorrendo as ruas da cidade, com a giba colhida e enflorada – a vela que mais resistiu à procela – entoando o Bendito, a pedirem para cumprirem o voto feito à Virgem.
Bendita a Crença! Abençoada a Fé!
A cerimónia, que é tradicional, comove. Os marinheiros, tal como estavam no mar, na ocasião do perigo, assim pedem. E ninguém lhes nega a esmola. Todos lançam no «sueste» do marinheiro uma moeda ou uma nota para a missa prometida no alto mar, no grande perigo, antes do «fogo de Santelmo» aparecer nos mastros, precedendo a bonança ou trazendo uma esperança ao coração amargurado dos pobres nautas).

De 1931 a 1935
Armador: João Alves Cerqueira, Viana do Castelo
Nº Oficial: 64 - Iic: H.F.E.R. - Registo: Viana do Castelo
Arqueação: Tab 146,95 tons - Tal 125,93 tons
Dimensões: Pp 28,62 mts - Boca 7,50 mts - Pontal 3,11 mts
Propulsão: À vela
Equipagem: 7 tripulantes

Depois de uma arribada forçada num porto no Norte de Espanha, em Outubro de 1932, por ter perdido grande parte do pano, devido a forte temporal com ventos de Oeste, decorrido um ano volta a ser vitimado em novo sinistro.

Foi encontrado abandonado um lugre português (3)
Na estação da Boa Nova, da Rádio Marconi, foi interceptado um aviso à navegação, feito pelo comandante do vapor francês “Ange Schiaffino”, que vem de Rouen para Oran, informando que pelas 13 horas e 5 minutos, na latitude 41º40’ Norte e longitude 9º25’ Oeste, encontrou abandonado o lugre “Fernanda” da praça de Viana do Castelo.
Mais informou que recolhera a tripulação, que tentará desembarcar para os barcos dos pilotos da barra de Lisboa, se o tempo e as condições de mar o permitirem. Se os não puder desembarcar, seguirão para Oran, porto para onde se dirige aquele navio.
O navio é de 2.800 toneladas brutas e pertence à praça de Algiers.

Características do navio francês “Ange Schiaffino”
Nº Oficial: N/d - Iic: O.S.R.U. - Porto de registo: Algiers
Armador: Soc. Algerienne de Naveg. pour l’Afrique du Nord, Algiers
Operador: Ch. Schiaffino, Algiers
Construtor: Howaldtswerk A.G., Kiel, Alemanha, 1929
Arqueação: Tab 2.800,00 tons
Dimensões: Pp 98,96 mts - Boca 14,63 mts - Pontal 7,34 mts
Propulsão: Do construtor - 1:Te - 3:Ci - 227 Nhp

O naufrágio do lugre “Fernanda”, de Viana do Castelo (4)
A tripulação foi salva pelo vapor “Ange Schiaffino”
O que contam os náufragos
O vapor “Ange Schiaffino”, que faz a carreira Argélia-Rouen, desembarcou hoje, pelas 10 horas da manhã, para a lancha dos pilotos da barra de Lisboa, seguindo depois a sua rota, os tripulantes do lugre “Fernanda”, da praça de Viana do Castelo, que ontem naufragou a 20 milhas a Noroeste daquela cidade.
Os oito marítimos dirigiram-se à Capitania do porto de Lisboa, onde o mestre se apresentou. Apresentam-se depois no Instituto de Socorros a Náufragos, a fim de receberem subsídios para regressarem à sua terra.
Todos os náufragos, naturais de Viana do Castelo, são:
Basílio Vieira de Carvalho, capitão; José Gonçalves, contra-mestre; Luiz Vieira de Carvalho, Custódio Vieira, Leopoldo do Vale e Manuel Rodrigues, marinheiros; António Fernandes Verde, moço; e Eduardo Alves dos Santos, cozinheiro.
O lugre naufragado, de 190 toneladas, pertencia ao Sr. João Alves Cerqueira, de Viana, que é também proprietário de outro navio. Nada estava no seguro.
Os náufragos que nada mais salvaram que as roupas que tinham no corpo, relataram a sua emocionante odisseia que terminou felizmente sem qualquer consequência pessoal grave:
«Tínhamos saído de Viana para Lisboa onde carregamos cimento, dirigindo-nos depois a Setúbal, onde tomamos um carregamento de sal. Partimos para o Norte, mas depois de passar pelo farol da Boa Nova fomos forçados pelo temporal a arribar novamente a Lisboa.
Retomando a nossa viagem para o Norte, fomos no dia 26 surpreendidos por um violento temporal – mar furioso, vento fortíssimo, nevoeiro e chuva – que se prolongou durante dois dias. O mar rebentou a amura de bombordo e as ondas entravam despegando os encerados das escotilhas e invadindo o convés sem que houvesse possibilidade de dar vasão à água, por mais esforços que fizéssemos.
Durante dois dias e duas noites não se dormiu a bordo, vivendo-se horas angustiosas de desespero, mal havendo possibilidade de alimentação, pois não havia forma de cozinhar a comida.
Todos os minutos e todas as forças eram preciosas e indispensáveis para a luta contra o mar, que invadia tudo. Com muita dificuldade conseguimos prender diversas vezes os encerados que as vagas, novamente, despegavam. A certa altura, quebrou-se também uma verga e muito dificilmente metemos outra.
Tudo, porém, era inútil para salvar o navio, só servindo para permitir que aguardássemos qualquer socorro providencial. Quando o lugre metia a proa, onde a água invadia tudo, não havia maneira de a despejar. Já poucas esperanças tínhamos, quando avistamos um navio americano.
Pedimos socorro por meio de sinais, mas nada conseguimos. O navio seguiu o seu destino e só pelas 13 horas de ontem quando nos encontrávamos a umas 20 milhas ao Noroeste de Viana surgiu à distância outro navio, o “Ange Schiaffino”.
Pedimos socorro e apesar das tremendas dificuldades com que tiveram de lutar os nossos camaradas franceses, não descansaram enquanto não nos salvaram. O temporal era enorme e foi difícil para eles arriarem uma grande baleeira e mais difícil ainda foi encostarem essa baleeira ao “Fernanda”, que já estava completamente perdido.
O mar era tanto que, por vezes, receamos um choque entre os dois barcos, que podia ser fatal para todos. Felizmente conseguiram salvar-nos e a bordo, tanto o comandante como toda a tripulação, foram da maior amabilidade para nós, fornecendo-nos comida e todas as facilidades necessárias e assim nos livramos daquele mau bocado, que durou dois dias e duas noites.»

Náufragos do lugre “Fernanda” (5)
Os quatro náufragos do lugre “Fernanda”, que haviam ficado em Lisboa seguiram hoje, a expensas do Instituto de Socorros a Náufragos, para Viana do Castelo.

«Lugre “Fernanda” abandonado (6)
«Passado um dia, na noite de quarta-feira, o tempo amainou e o vapor dinamarquês “Signe”, que seguia para Norte, encontrou-o abandonado e rebocou-o para Vigo, tendo partido algumas amarras em consequência da ondulação larga proveniente do mau tempo, que assolou a costa portuguesa nos dias anteriores.»

Características do navio dinamarquês “Signe”
Nº Oficial: N/d - Iic: N.W.P.F. - Porto de registo: Copenhaga
Armador: Dampskibsselskabet Torm, Copenhaga
Construtor: Kjoebuhavns Flydedok & Skibsverft, Copenhaga, 1919
Arqueação: Tab 1.191,00 tons - Tal 696,00 tons
Dimensões: Pp 71,73 mts - Boca 11,02 mts - Pontal 4,14 mts
Propulsão: Do construtor - 1:Te - 3:Ci - 83 Nhp

O lugre “Fernanda” que tinha saído de Viana no dia 15 de Outubro, com um carregamento de madeira para Setúbal, onde carregou sal e cimento, estava avaliado em Esc. 40.000$00, mais Esc. 15.000$00 da carga, indemnizou pelos salvados, de acordo com o Direito Marítimo, um terço destes valores ao armador do navio “Signe”.
Tratadas as condições de navegabilidade do lugre, permitindo realizar o seu regresso a Viana do Castelo, onde deve ter terminado as necessárias reparações, o navio continuou a navegar pertença do mesmo proprietário, todavia alterou a matrícula em 1935, mudando de nome para "Santa Madalena".

Imagem do lugre "Santa Madalena"
Foto de autor desconhecido - minha colecção

(1) Jornal “Aurora do Lima”, 10 de Janeiro de 1930; (2) Jornal “Aurora do Lima”, 2 de Maio de 1930; (3) Jornal “Comércio do Porto”, quarta-feira, 29 de Novembro de 1933; (4) Jornal “Comércio do Porto”, quinta-feira, 30 de Novembro de 1933; (5) Jornal “Comércio do Porto”, sexta-feira, 1 de Dezembro de 1933. As notícias (1 e 2) publicadas no jornal “Aurora do Lima”, foram amavelmente  cedidas pelo amigo Manuel de Oliveira Martins.
Bibliografia (6) Martins, Manuel de Oliveira, Naufrágios no «Mar de Viana», Colecções Cer-Seiva, Viana do Castelo, 2016