terça-feira, 24 de março de 2009

Construção naval


Carta de Mercês de El-Rei D. Manuel I, dada aos carpinteiros e calafates de Fão, datada de 28 de Janeiro de 1491

Num livro que me tem servido de companhia nestes últimos dias, retiro algumas passagens sobre a construção naval em portos do Alto-Minho, sendo que esta carta de Mercês, pela importância que lhe reconheço, justifica a respectiva publicação, como segue :

Dom Manuel por graça de Deus, Rey de Portugal e dos Algarves de aquém e de além Mar, em África, Senhor da Guiné, avisa a quantos esta Nossa carta virem;
Fazemos saber, que os Nossos Carpinteiros das Nossas Vilas de Vila do Conde, e Viana, e Fão, nos ousarão dizer, que eles eram constrangidos a que pagassem sempre nos pedidos, quando eram lançados, e se temiam de lhe darem suas roupas de aposentadoria;
Pedindo-nos que porquanto estavam sempre prestes para Nos servirem de seus ofícios os privilegiasse-mos deles;
E visto por Nós seu requerimento, querendo-lhes fazer graça, e mercê, sentindo assim por Nosso Serviço, e bem da terra;
Temos bem e privilegiamo-los, que daqui em diante dos melhores, que nas ditas vilas houverem até vinte carpinteiros, usando um dos ditos ofícios não paguem nos pedidos, que por Nós forem lançados, nem lhes deem suas casas, nem roupas de aposentadoria nenhuma pessoa que seja;
Os quais serão examinados por Affonso Vaz, Nosso Mestre de Carpintaria do Porto.
Dada na cidade de Évora a vinte e oito dias do mês de Janeiro, Antão Luiz a fez, no ano do Nascimento de Nosso Senhor Jesus Cristo, de mil quatrocentos e noventa e um.
In “Carpinteiros da Ribeira das Naus”, de A. Sousa Gomes, 1931

Este é mais um documento que corrobora as minhas ideias, quanto ao ano em que os marítimos portugueses se aventuram em viagens de longo curso e que estimo possam ter começado por volta de 1300. Continuo igualmente a pensar que essas navegações deviam seguir rumo a norte, e quando a sul não passariam além das ilhas Açoreanas. Isto porque essas navegações, que visavam a exploração da costa africana, tiveram início no reinado de D. João I, depois de aberto o caminho com a tomada de Ceuta aos Mouros.

A teoria que tenciono desenvolver numa próxima oportunidade, baseia-se ainda no tratado entre o rei Eduardo III de Inglaterra e os mercadores marítimos e comunidades de marinha das cidades e vilas marítimas de Portugal, assinado a 20 de Outubro de 1353. A oitava clausula do tratado estipulava “que os PESCADORES das ditas cidades marítimas poderiam ir pescar livremente, sem incorrer em nenhum perigo, nos portos de Inglaterra (1) e da Bretanha, e nos outros portos e lugares que eles julgassem oportunos, pagando somente os direitos devidos ao senhor do país”.

(1) Nesta conformidade, acredito estar perto da verdade ao considerar que já nesta época os pescadores Portugueses pescavam nos bancos da Terra Nova, ocupando o mar e portos que Eduardo III tinha como seus.

Donos de mau feitio e mau perder, nunca os pescadores portugueses devem ter pago coisa alguma ao rei de Inglaterra. A sua extraordinária capacidade e os conhecimentos de navegação, permitiam-lhes viajar em mar aberto, longe da costa Inglesa, pelo menos até 1585, quando o rei Inglês reconhecendo a natural habilidade dos portugueses, armou uma esquadra comandada por Bernardo Drake, para os desapossar do grande banco, apreendendo-lhes e afundando-lhes os navios carregados de peixe. Esteve essa frota pesqueira radicada durante largos anos nos portos de entre Douro e Minho, pois que a sul os armadores e pescadores temiam os constantes ataques dos piratas, estrategicamente ancorados ao largo de Lisboa, roubando as cargas e destruindo as embarcações.
Para terminar, o mais interessante nesta e noutras histórias que se conhecem deste período, é que aconteceram 41 anos antes do nascimento do Infante D. Henrique, 129 anos antes da descoberta da América, 147 anos antes da descoberta do Brasil e melhor ainda, quase 160 anos antes de Corte Real ter descoberto a Terra dos Bacalhaus.

Bibliografia: “Os estaleiros navais de Esposende e Fão, nos séculos XIX e XX”, de Bernardino Amândio, 1989

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