terça-feira, 21 de março de 2017

Navios portugueses!


As experiências do novo paquete “Quanza”
A mais moderna unidade da Marinha Mercante Nacional
1ª. Parte

Imagem do navio "Quanza" da Companhia Nacional de Navegação
Desenho de Luís Filipe Silva

Hamburgo, 4 de Setembro – De acordo com o teor da prévia mensagem telegráfica, é amanhã que se realiza a viagem de experiência do novo paquete “Quanza”, da Companhia Nacional de Navegação, construído nos estaleiros mais importantes de Hamburgo – Blohm & Voss.
Faremos, portanto, amanhã, uma madrugada para assistir à viagem até Helgoland, no mar do Norte, estando previsto o regresso à noite.
Algumas personalidades de destaque no comércio, indústria e imprensa de Hamburgo, o sr. ministro de Portugal em Berlim, o sr. cônsul de Portugal em Hamburgo, os srs. almirante Pinto Basto, visconde de Atouguia e capitão Correia Leal, representando a C.N.N., assim como os seis jornalistas portugueses, tomarão parte na viagem.
É, portanto, interessante informar acerca do novo paquete português. Eis os detalhes de maior interesse:
O “Quanza” é um navio de tipo semelhante ao dos paquetes alemães da Woermann Linie, D.O.A.L., etc. O projecto que serviu de base ao contrato que a C.N.N. obteve por conta das reparações alemãs, foi, mais ou menos, delineado sobre as características do “Admiral”, que hoje se chama “Lourenço Marques” e que tendo pertencido aos Transportes Marítimos do Estado, pertence hoje à C.N.N., sendo um dos seus navios mais apreciados.
Este projecto, enquadrado nas dimensões principais do “Admiral”, com um aumento da boca, foi completamente modificado para melhor adaptação às necessidades da C.N.N., principalmente no que se refere às instalações de carga e descarga e ao conforto e segurança dos passageiros. Tiveram ainda em vista melhorar a aparência exterior do navio, atendendo muito especialmente às suas condições de navegabilidade e estabilidade.
Mereceu também especial atenção o estudo da ventilação artificial, sendo este o primeiro navio português dotado com o sistema Punkah-Louvre, hoje geralmente adoptado não só nos navios de África, mas ainda nos mais modernos transatlânticos.
As características principais são as seguintes: Comprimento, 126,5m; comprimento máximo, 133.5m; boca máxima, 16,0m; pontal até o convés, 9,45m; pontal até ao poop-deck, 11,9m; tonelagem bruta, 6.656,75; tonelagem liquida, 3.776,28; deslocamento, 11.560 toneladas. O navio tem alojamentos para 329 passageiros de 1ª., 2ª. e 3ª. classe e mais 100 de 4ª. classe (indígenas, tropas, etc.).
Estes passageiros são assim distribuídos por cabines: De luxo,10, sendo 4 com duas camas e um sofá-cama, comportando assim 12 passageiros; 5 com uma cama, para 5 passageiros; 1 com duas camas, 2 passageiros; total dos passageiros de luxo, 19. Cabines de 1ª. classe, 37, sendo: 18 com três camas, 54 passageiros; 19 com duas camas, 38 passageiros; total dos passageiros de 1ª. classe, 92.
Cabines de 2ª. classe, 45, sendo: 30 com duas camas, 60 passageiros; 15 com quatro camas, 60 passageiros; total dos passageiros de 2ª. classe, 120. Cabines de 3ª classe, sendo: 3 com seis camas, 18 passageiros; 20 com quatro camas, 80 passageiros; total dos passageiros de 3ª. classe, 98. Coberta de 4ª. classe, lugar para 100 passageiros, 100. Soma, 429.
Guarnição: Comandante e oficiais, 5; maquinistas oficiais, 8; médico, 1; comissários, 2; telegrafistas, 2; estado menor, 3; dispenseiros, 3; cozinheiros, padeiros e pastel, 11; barbeiro, 1; enfermeiro, 1; lavadeiros, 4; criadas, 4; criados, 46; marinheiros, 24; fogueiros, chegadores e azeitadores, 36; número total de pessoas a bordo, 580. A capacidade de carga do “Quanza” é de 7.291 m3 para grão a granel e de 6.676 m3 de carga de medição. O porão frigorifico comporta 248 m3 e está disposto para o transporte de carnes congeladas e outras mercadorias. Os mantimentos para passageiros e tripulação ocupam diferentes paióis, uma parte dos quais é constituída por uma instalação frigorífica do mais moderno sistema e feita pelo Atlas-Werke, especialistas nestas instalações, que fizeram também todos os frigoríficos dos grandes transatlânticos “Bremen” e “Europa”. O navio tem tanques onde pode transportar 1.400 toneladas de água doce para alimentação das caldeiras e consumo dos passageiros.
Todas as cabines, de luxo, 1ª,. 2ª., e 3ª. classe, tem água encanada e esgoto directo. As cabines de luxo nºs. 1 e 2, bem como a dos oficiais, maquinistas e as enfermarias, tem casas de banho privativas com água doce fria e quente. As outras cabines de luxo têm também casas de banho com água salgada fria e quente. Os lavatórios de 1ª,. 2ª., e 3ª. classe, as lojas de barbeiro, etc., têm água doce fria encanada.
O aparelho motor do “Quanza” é constituído por duas máquinas alternadas de triple expansão de 2.000 c.v. cada uma, ou seja um total de 4.000 c.v. indicados. Estas máquinas imprimem ao navio uma velocidade de 13,5 milhas. O aparelho gerador de vapor é constituído por três caldeiras cilíndricas do tipo Scotch, com duas fachadas e seis fornalhas em cada caldeira. A superfície de aquecimento total é de 1.365 m2 e a superfície de grelha é de 31,5 m2. As fornalhas são do tipo ondulado Morison. Estas caldeiras trabalham à pressão de 15 atmosferas.
O navio tem três grupos electrogéneos de 40 kw a 115 voltios, sendo a tensão média, na rede de distribuição, de 110 voltios. Esta energia eléctrica é utilizada na iluminação do navio, na ventilação artificial, T.S.F., etc.
De tudo isto se depreende que, pelo facto de ter mandado construir um novo paquete, a C.N.N. não se limitou só a aumentar a sua frota mercante, mas pensou, acima de tudo, na comodidade e conforto dos seus passageiros.
A viagem de experiências de menos de 24 horas, que amanhã se realiza, provará bem de que classe o “Quanza” é, e estamos certos, dará os melhores resultados.
O “Quanza” deve entrar na quinta-feira em Leixões
Foi ontem recebido um rádio, com origem de bordo do novo paquete “Quanza”, relatando a partida do navio às 5 horas da tarde, tendo tido uma despedida grandiosa. Informam ainda que o paquete deverá chegar a Leixões, na próxima quinta-feira, à tarde.
(In jornal “Comércio do Porto”, terça-feira, 10 de Setembro de 1929)

Sem comentários: