sexta-feira, 21 de junho de 2013

Resumo histórico do vapor "Corte Real"


O afundamento
1ª Parte

Depois do violento impacto que teve lugar na opinião pública, referido anteriormente relacionado com o afundamento do vapor “Ganda”, primeira grande vítima dos submarinos alemães na IIª Grande Guerra Mundial, é já percetível um amaciamento nos comentários publicados nos jornais quanto ao torpedeamento do vapor “Corte Real”, e mais interessante ainda, é a constatação do alheamento na defesa feroz dos valores e interesses nacionais, face aos governos dos países beligerantes.
Depreende-se portanto que depois do primeiro caso, os afundamentos seguintes já são aceites como parte de uma rotina, não aceitável mas compreensível, ao ponto de se terem levantado suspeitas relacionadas com a possibilidade do navio transportar uranio. Em qualquer dos casos, consegue-se perceber que o afundamento do “Corte Real” nesta fase é já um mal menor, até porque o armador desta feita, até é beneficiado em função do novo regime de seguros instituído pelo Governo.

O vapor “Corte Real”
1934-1941
Armador: Companhia de Navegação Carregadores Açoreanos,
Ponta Delgada

Foto do vapor "Corte Real" no porto de Nova Iorque
Imagem da Photoship.Uk

Nº Oficial: 949 - Iic.: C.S.A.G. - Porto de registo: Ponta Delgada
Cttor.: A. Vuijk & Zonen, Capelle a/d Ijssel, Holanda, 06-1922
ex “Peursum”, Stoomvaart Mij Oostzee N.v., Amsterdão, Holanda
Arqueação: Tab 2.043,85 tons - Tal 1.211,78 tons
Dimensões: Ff 90,41 mt - Pp 86,26 mt - Bc 12,25 mt - Ptl 5,86 mt
Propulsão: Sulzer, 1922, Holanda – 1:Te – 267 Nhp
Equipagem: 36 tripulantes

O vapor português “ Corte Real ” foi afundado por um submarino
alemão, tendo os náufragos sido recolhidos por um barco de pesca
O vapor português “Corte Real”, da Companhia dos Carregadores Açoreanos, que saiu do Tejo no dia 7 de Outubro para o Porto, foi torpedeado. A bordo seguiam de Lisboa os seguintes passageiros: Dª Odete da Piedade Barros, de Faro, de 20 anos, e sua filha, a menina Aldina Ferraz Violante; Dª América Ferreira da Silva, de Lisboa, e sua filha, a menina Maria Celeste Silva, de 4 anos. No Porto embarcaram mais dois passageiros: J. Ean de Lawillarde Reni, francês e Charles Cante Bufuwer, americano.
O navio foi afundado por um submarino alemão cerca das 13 e trinta horas de Domingo, depois do comandante do submarino ter consultado a bordo a documentação do barco português, e de ter dito ao capitão do “Corte Real”, sr. José Narciso de Matos Júnior, para afundar o navio, que se dirigia para a América do Norte.
Foi tentado o afundamento do navio pelo processo da abertura das válvulas, mas não foi possível metê-lo no fundo desta maneira.
Depois dos passageiros e os 36 tripulantes terem ido para as baleeiras de bordo, do submarino começaram a ser disparados tiros de canhão. Como o navio também não se afundasse desta forma, foi lançado um torpedo.
O “Corte Real”, dos Carregadores Açoreanos, foi afundado, e o submarino, depois de ter recolhido a bordo as senhoras e as crianças, lançou um cabo e rebocou as duas baleeiras durante vinte milhas, largando os náufragos, que andaram 24 horas à deriva.
Ontem, de manhã, os náufragos foram recolhidos por um barco de pesca do porto de Faro, de nome “A Deus”, que os conduziu à barra do Tejo. Depois o barco dos pilotos foi buscá-los e levou-os para a Capitania do porto de Lisboa.
Dos 36 tripulantes são do Norte os seguintes: contra-mestre José Cândido Gonçalves, marinheiro; Francisco Luzia e o criado João dos Santos Lauro, todos de Ílhavo; fogueiros José da Costa e Álvaro Pereira, chegador Jaime Ernesto, paioleiro António Miranda, marinheiro António Marques e o cozinheiro João Marques Ferreira, todos de Vila Nova de Gaia.
(In jornal “Comércio do Porto”, terça, 14 de Outubro de 1941)

O torpedeamento do vapor português “Corte Real”
O mestre do caíque “A Deus” conta como
salvou os náufragos e os trouxe até ao Tejo
O mestre João Matos” do caíque “A Deus”, que transportou os náufragos do vapor português “Corte Real”, após o torpedeamento de que este foi vítima por parte de um submarino alemão, declarou à imprensa:
- «Fundeei para a pesca eram 10 horas. Às 4 e meia, vi dois sinais, dois clarões no ar, provocados por náufragos. O coração deu-me um baque e pressenti desgraça. Fiz-me de vela e tomei o rumo de Sudoeste, a ver se descobria alguma coisa. Avistei duas baleeiras. Corri para elas e eram 6 horas quando tomei contacto com os náufragos.»
Entraram para o seu barco?
- «Só algum pessoal passou para o “A Deus”. O outro ficou em uma das baleeiras, inclusivamente o capitão. Prendi a baleeira a reboque e, como não havia vento, larguei o bote a motor, que usamos para lançar as redes. Foi este bote que rebocou o meu caíque e a baleeira. Valeu-nos estar o mar calmo, como está hoje, aqui, no Tejo. Senão o salvamento teria sido mais difícil e tinha de perder-se a baleeira que conseguiu salvar-se.»
Vieram sempre rebocados?
- «Não. Às 11 horas, entrou o vento e meti o bote a motor dentro do barco. Dei de comer aos náufragos que vinham no meu barco e, por duas vezes, perguntei ao capitão se queria que lhes desse alguma coisa. Mas ainda levavam conservas e não quiseram nada. Quando chegamos ao Cabo Raso é que avistamos o aeroplano.»
O mestre pediu auxílio, como se diz?
- «Não, senhor. Não pedi qualquer auxílio. Estávamos na Guia, perto de Cascais, já não precisava de auxílio. Trouxera os náufragos até ali, melhor podia trazê-los da Guia para cá. Foi às 4 e meia que apareceu o gasolina dos pilotos, entre a Guia e a Ponta do Tamanco. Tinha perguntado ao capitão do “Corte Real” onde queria saltar e, como ele me tinha dito que ficava em Cascais, ia já a aproximar-me de terra para o deixar. O capitão desejava que fosse o meu caíque que o trouxesse até Lisboa, visto que já o tinha trazido até ali. Mas, já da parte de dentro de S. Julião, por indicação do gasolina dos pilotos, a que prontamente obedeci, os náufragos transitaram do meu para aquele barco.»
O socorro aos náufragos trouxe-lhe prejuízos, foi perguntado ao mestre João Matos?
- «E grandes. Perdemos toda a pesca, tivemos de deitar fora todo o isco. Os 25 homens de bordo sofreram um considerável prejuízo. Mas cumpriram bem o se dever de portugueses e já essa consolação nos conforta.»

O Estado-maior Naval, onde ontem compareceu o comandante do “Corte Real”, sr. capitão José Marques Júnior, está a elaborar o processo do incidente, extensa documentação que será depois remetida às entidades do Ministério da Marinha, às quais compete informar o Governo.
A companhia armadora do “Corte Real” é a primeira empresa a beneficiar do novo regime de seguros de guerra instituído pelo Governo, após o torpedeamento do “Ganda”.
(In jornal “Comércio do Porto”, quarta, 15 de Outubro de 1941)

1 comentário:

Berto Garcia disse...

Muy bonito trabajo Saludos desde la Luz http://bermaxofotos.blogspot.com/