O bordo livre
O conceito de bordo livre resultou da necessidade de estabelecer uma linha de flutuação máxima a que o navio pudesse operar em condições de segurança, dotando-o, por um lado, de adequada reserva de flutuabilidade, por outro, assegurando a eficiência da sua estrutura para operar ao referido calado.
Bordo livre é a distância vertical da face superior do convés à borda, incluindo revestimento, à linha de flutuação máxima, medido a meio navio. Em certos navios, nomeadamente nos tipos “shelter-decker” (infelizmente já não se veem muitos) e de passageiros, o bordo livre legal pode ser medido não em relação ao convés, mas sim a um pavimento inferior, ficando neste caso o bordo livre real em excesso do mínimo legal.
A obrigatoriedade de atribuição de bordo livre é estabelecida para todos os navios, excepto navios de guerra, navios de comprimento inferior a 24 metros, barcos de recreio e navios de pesca. Não sendo abrangidos pela Convenção, para estes últimos o bordo livre deve ser tal que o navio em todas as condições de serviço previstas:
a) Cumpra o critério IMCO de estabilidade;
b) Apresente segurança adequada para o pessoal;
c) Disponha de meios estanques que impossibilitem a entrada de água para os espaços fechados.
História
A necessidade de estabelecer uma linha de flutuação máxima para um navio remontará aos primórdios da navegação comercial. Dum lado o interesse económico a pressionar os armadores a carregar os navios o mais possível; do outro, a segurança do navio, tripulação e carga, a pressionar no sentido inverso.
Na ausência de quaisquer normas, a solução do problema era deixado à intuição e experiencia dos capitães. A intensificação da navegação comercial depressa levou à necessidade de serem estabelecidas normas que impedissem os navios de ser carregados exageradamente: são conhecidos os inúmeros naufrágios de navios portugueses no comércio da Índia.
Esta necessidade começou então a ser timidamente atacada, e neste contexto é interessante referir o primeiro regulamento conhecido sobre linhas de carga: “… mando aos mestres que fizeram as ditas naus, assim neste reino, como na Índia, ponham quatro cavilhas, duas de cada banda em proa e em popa, nas partes onde lhes parecer, para que até ali se carregue a dita nau e se meta debaixo de água não passando da dita cavilha e sinal…” (sistema dos Regimentos, tomo 6º, pág.23, de Fevereiro de 1604, no regimento sobre se não carregarem as naus da Índia).
Posteriormente a Inglaterra veio a liderar o processo: a primeira atribuição de bordo livre conhecida, entrou no Livro de Registo da Lloyds em 1774, sem no entanto haver referencia a quaisquer regras para a sua determinação. As etapas seguintes, nas primeiras décadas do seculo XIX, consistiram em estabelecer regras que exprimiam o bordo livre em função da altura do porão: 2 a 3 polegadas por pé de altura do porão.
Mais tarde, em 1867 a Institution of Naval Architects reconheceu o interesse de incluir o comprimento como parâmetro interveniente no cálculo do bordo livre. Uma Comissão Real Britânica coordenada por Samuel Plimsoll abordou o problema em 1874, estabelecendo normas definidas para atribuição do bordo livre, normas estas que foram tornadas Lei. Os desenvolvimentos sequentes fundamentaram-se nos princípios seguintes: (i) existência de um volume de reserva acima da linha de água, numa proporção mínima do volume imerso; (ii) altura mínima da “plataforma” exposta; (iii) construção solida do navio e meios eficazes de fecho de todas as aberturas expostas.
O assunto passou a constituir matéria de Lei para os diversos países, sendo a breve trecho evidente a necessidade de estabelecer critérios uniformes. É esta necessidade que está na base da Convenção de Linhas de Carga de 1930, que foi o culminar de um longo processo de tentativas de uniformização.
A evolução da construção naval, tanto no aspecto do projecto como de produção, aumentou significativamente a integridade dos navios à intempérie.
Assim, nova Convenção sobre Linhas de Carga teve lugar em Londres, em Março de 1966. Esta Convenção foi subscrita por Portugal, e está concretizada na Lei interna do País através do decreto-lei nº 49.209 de 26 de Agosto de 1969. Actualmente as Sociedades Classificadoras são também entidades reconhecidas pelas autoridades para atribuição dos bordos livres.
(In Cabral, José Paulo F. Saraiva, Arquitetura Naval (estabilidade, cálculos, avaria e bordo livre), Centro do Livro Brasileiro, Lisboa, Abril de 1979
Na ausência de quaisquer normas, a solução do problema era deixado à intuição e experiencia dos capitães. A intensificação da navegação comercial depressa levou à
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