A tragédia da barca "Bahiana"
(continuação)
Desenho de uma barca sem correspondência ao texto
Características do navio
Características do navio
Armador: Joaquim Lourenço Alves e outros
Nº Oficial: N/t - Iic: H.B.J.V. - Porto de registo: Porto
Arqueação: Tab 305,291 m3
Dimensões: Informação indisponível
Propulsão: À vela
Nº Oficial: N/t - Iic: H.B.J.V. - Porto de registo: Porto
Arqueação: Tab 305,291 m3
Dimensões: Informação indisponível
Propulsão: À vela
O navio consta do registo de navios portugueses até 1872, não havendo notícia de ter sofrido qualquer sinistro ou naufrágio nos anos que se seguiram. Porém, porque não está presente nas páginas do registo referente ao ano de 1875, é presumível a possibilidade de eventual abandono por motivo de inavegabilidade, sendo considerado sem rasto.
Barca “Bahiana"
Sr. Redactor,
Muito me obsequeia V. se fizer publicar no seu jornal a seguinte carta que n’esta data dirijo ao Sr. José dos Santos Lessa Júnior, capitão da barca "Bahiana".
De V., etc., Joaquim Duarte de Mattos, S.C., 20 de Maio de 1868
Illmº Sr. José dos Santos Lessa Júnior,
Conceda-me que não deixe passar despercebido seu grande feito, empregando o mais louvável dos zelos para trazer a bom porto a barca "Bahiana" do seu commando.
Dizer que esta barca ficou raza dos mastros grande e do traquete, e auxiliada apenas pelo mastro da gata, único que foi poupado pelo temporal que o assaltou na latitude N. 40º57’ e longitude O. 25º55’ do meridiano de Greenwich, que apesar da distancia em que tal fatalidade se deu V.S.ª recusou os espontâneos socorros que lhe foram oferecidos por três navios de diferentes nações, inclusive por um vapor inglez, que generosamente se prestou a recolher a tripulação e a deita-la em Londres, para onde navegava; que prosseguiu a sua derrota em quasi completo estado de innavegabilidade, gastando no trajecto d‘aquella paragem para o Porto 15 dias; é o suficiente para fazer o elogio de V.S.ª como denodado capitão da barca «Bahiana», propriedade do Sr. Joaquim Lourenço Alves e de V.S.ª.
Honra, pois, a quem tão bem sabe comprehender o sagrado dever de conservar e entregar o que se lhe confia, sujeitando-se a toda a classe de trabalhos, e pondo em risco a própria vida! Se os grandes feitos merecem de todos admiração e louvor, subido é o merecimento de V.S.ª, por seus valiosos serviços, trazendo a bom porto atravez de tantas difficuldades o navio e o seu importante carregamento.
À sua tripulação coube também boa parte de tão admirável feito, pelo valor com que se houveram os bravos marinheiros, coadjuvando o empenho do seu digno capitão, esquecendo-se acharem-se no largo Oceano, e n’uma embarcação na situação mais critica que de um para outro momento mais precária se poderia tornar, e talvez em occasião de não ter generosos salvadores!
Não me leve V.S.ª a mal o dizer-lhe que, na minha opinião, bem merecem capitão e tripulantes da «Bahiana», por tão assignalada coragem, das companhias seguradoras, remuneração condigna de seu alto serviço.
De mim, Sr. capitão Lessa Júnior, acceite por tão brilhante acção os mais cordeaes respeitos e a mais profunda admiração, e solicitando a sua permissão para que publique esta carta pela imprensa, rogo-lhe me conceda também o prazer de assignar-me
De V.S.ª, amigo muito dedicado, Joaquim Duarte de Mattos,
S.C., no Porto, 20 de Maio de 1868.
Jornal "Comércio do Porto", sábado, 23 de Maio de 1868
Barca "Bahiana"
Dizer que esta barca ficou raza dos mastros grande e do traquete, e auxiliada apenas pelo mastro da gata, único que foi poupado pelo temporal que o assaltou na latitude N. 40º57’ e longitude O. 25º55’ do meridiano de Greenwich, que apesar da distancia em que tal fatalidade se deu V.S.ª recusou os espontâneos socorros que lhe foram oferecidos por três navios de diferentes nações, inclusive por um vapor inglez, que generosamente se prestou a recolher a tripulação e a deita-la em Londres, para onde navegava; que prosseguiu a sua derrota em quasi completo estado de innavegabilidade, gastando no trajecto d‘aquella paragem para o Porto 15 dias; é o suficiente para fazer o elogio de V.S.ª como denodado capitão da barca «Bahiana», propriedade do Sr. Joaquim Lourenço Alves e de V.S.ª.
Honra, pois, a quem tão bem sabe comprehender o sagrado dever de conservar e entregar o que se lhe confia, sujeitando-se a toda a classe de trabalhos, e pondo em risco a própria vida! Se os grandes feitos merecem de todos admiração e louvor, subido é o merecimento de V.S.ª, por seus valiosos serviços, trazendo a bom porto atravez de tantas difficuldades o navio e o seu importante carregamento.
À sua tripulação coube também boa parte de tão admirável feito, pelo valor com que se houveram os bravos marinheiros, coadjuvando o empenho do seu digno capitão, esquecendo-se acharem-se no largo Oceano, e n’uma embarcação na situação mais critica que de um para outro momento mais precária se poderia tornar, e talvez em occasião de não ter generosos salvadores!
Não me leve V.S.ª a mal o dizer-lhe que, na minha opinião, bem merecem capitão e tripulantes da «Bahiana», por tão assignalada coragem, das companhias seguradoras, remuneração condigna de seu alto serviço.
De mim, Sr. capitão Lessa Júnior, acceite por tão brilhante acção os mais cordeaes respeitos e a mais profunda admiração, e solicitando a sua permissão para que publique esta carta pela imprensa, rogo-lhe me conceda também o prazer de assignar-me
De V.S.ª, amigo muito dedicado, Joaquim Duarte de Mattos,
S.C., no Porto, 20 de Maio de 1868.
Jornal "Comércio do Porto", sábado, 23 de Maio de 1868
Barca "Bahiana"
Snr. Redactor,
Rogo-lhe o obséquio de fazer inserir no seu acreditado jornal a cópia da carta que dirigi ao Ill.mº Snr. Joaquim Duarte de Mattos, pelo que me confesso agradecido.
De V.S.ª, etc., José dos Santos Lessa Júnior, Porto, 23 de Maio de 1868
De V.S.ª, etc., José dos Santos Lessa Júnior, Porto, 23 de Maio de 1868
Ill.mo snr. Joaquim Duarte de Mattos,
Penhorado com a honrosa expressão da carta de V.S.ª de 20 do corrente, permitta-me que lhe responda, e que como amigo lhe tribute os meus mais sinceros agradecimentos.
O facto que V.s.ª n’ella assignala, praticado por a tripulação da barca portugueza «Bahiana» do meu commando, não foi mais que a imperiosa obrigação do seu dever.
Se não acceitei os valiosos auxílios que vários navios me offereceram, quando eu no alto mar, depois de um violento temporal, me achei com o meu navio desarvorado, foi porque, resolvido a não o abandonar, enquanto o mar me conservasse duas táboas unidas, entendia que era alli o meu lugar, e crente que Deus nos levaria ao porto de nosso destino esperávamos salvar-nos ou morrer com a «Bahiana».
Devo dizer a V.s.ª que esta minha resolução foi logo abraçada pelos meus bravos marinheiros, e que se d’isto me resulta algum louvor, por certo que a maior parte pertence à corajosa tripulação da «Bahiana». Foi assim que só com duas pobres velas que nos haviam ficado da tormenta navegamos por espaço de 15 dias, não poupando esforços e trabalhos, sempre com esperança de vermos a cada momento surgir-nos no horizonte a desejada terra da nossa pátria.
Essa esperança do marinheiro quasi náufrago tornou-a Deus em realidade, e hoje que vejo o meu navio seguro no porto do seu destino, considero-me feliz por ver que a nossa resolução fôra coroada com tão bom êxito.
Renovando os meus agradecimentos e os de toda a tripulação pelas benévolas expressões da sua carta, creia-me sempre seu sincero amigo e obrigado.
José dos Santos Lessa Júnior Porto, 22 de Maio de 1868 (274)
Jornal "Comércio do Porto", Domingo, 24 de Maio de 1868
O facto que V.s.ª n’ella assignala, praticado por a tripulação da barca portugueza «Bahiana» do meu commando, não foi mais que a imperiosa obrigação do seu dever.
Se não acceitei os valiosos auxílios que vários navios me offereceram, quando eu no alto mar, depois de um violento temporal, me achei com o meu navio desarvorado, foi porque, resolvido a não o abandonar, enquanto o mar me conservasse duas táboas unidas, entendia que era alli o meu lugar, e crente que Deus nos levaria ao porto de nosso destino esperávamos salvar-nos ou morrer com a «Bahiana».
Devo dizer a V.s.ª que esta minha resolução foi logo abraçada pelos meus bravos marinheiros, e que se d’isto me resulta algum louvor, por certo que a maior parte pertence à corajosa tripulação da «Bahiana». Foi assim que só com duas pobres velas que nos haviam ficado da tormenta navegamos por espaço de 15 dias, não poupando esforços e trabalhos, sempre com esperança de vermos a cada momento surgir-nos no horizonte a desejada terra da nossa pátria.
Essa esperança do marinheiro quasi náufrago tornou-a Deus em realidade, e hoje que vejo o meu navio seguro no porto do seu destino, considero-me feliz por ver que a nossa resolução fôra coroada com tão bom êxito.
Renovando os meus agradecimentos e os de toda a tripulação pelas benévolas expressões da sua carta, creia-me sempre seu sincero amigo e obrigado.
José dos Santos Lessa Júnior Porto, 22 de Maio de 1868 (274)
Jornal "Comércio do Porto", Domingo, 24 de Maio de 1868
Conclusão
Decorridos todos estes anos sobre este acontecimento, que não é invulgar, sou de parecer que o texto do livro publicado no post anterior, merece uma pequena análise, na convicção de, ainda que de forma especulativa, tentar entender o desfecho desta aventura.
Começo por discordar do título escolhido, por concluir que a história possui uma forte dimensão dramática, mas não tragédia, porque apesar da violência retratada por força da tempestade, não houve vítimas e o navio apesar das avarias sobreviveu ao naufrágio.
Não se entende também qual o motivo para o autor do livro, jornalista e escritor de mérito reconhecido, tentar camuflar a evidência de seu pai ser o principal interveniente, daí resultando o conhecimento de pormenores vividos apenas por quem se encontrava a bordo, e que são de suma importância, como é o caso do capitão ter tido necessidade de estar armado, para se fazer respeitar, obrigando a tripulação em pânico a fazer cumprir as ordens por si emanadas.
Para terminar, uma última nota para chamar a atenção sobre o comportamento do capitão Santos Lessa Júnior, considerando ser simultâneamente co-proprietário da barca "Bahiana", o que justifica ter resistido até ao limite para salvar o navio, face à provável inexistência de seguro, e mesmo quando é sugerido às empresas de seguros remunerar condignamente a tripulação, está apenas a ser lembrado o empenho posto no salvamento das mercadorias transportadas.
Começo por discordar do título escolhido, por concluir que a história possui uma forte dimensão dramática, mas não tragédia, porque apesar da violência retratada por força da tempestade, não houve vítimas e o navio apesar das avarias sobreviveu ao naufrágio.
Não se entende também qual o motivo para o autor do livro, jornalista e escritor de mérito reconhecido, tentar camuflar a evidência de seu pai ser o principal interveniente, daí resultando o conhecimento de pormenores vividos apenas por quem se encontrava a bordo, e que são de suma importância, como é o caso do capitão ter tido necessidade de estar armado, para se fazer respeitar, obrigando a tripulação em pânico a fazer cumprir as ordens por si emanadas.
Para terminar, uma última nota para chamar a atenção sobre o comportamento do capitão Santos Lessa Júnior, considerando ser simultâneamente co-proprietário da barca "Bahiana", o que justifica ter resistido até ao limite para salvar o navio, face à provável inexistência de seguro, e mesmo quando é sugerido às empresas de seguros remunerar condignamente a tripulação, está apenas a ser lembrado o empenho posto no salvamento das mercadorias transportadas.
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