A bênção da frota bacalhoeira em 1947
À bênção da frota bacalhoeira que ontem se realizou em Belém
presidiu o Rev. mo Bispo de Helenópole e assistiram membros
do Governo e entidades oficiais
Com o já habitual esplendor e solenidade, realizou-se ontem, de manhã, no histórico e glorioso templo de Santa Maria de Belém, a bênção dos lugres bacalhoeiros que horas depois começaram a partir para os bancos da Gronelândia e da Terra Nova.
Presidiu Sua Ex.ª Rev.ma o sr. Bispo de Helenópole que celebrou missa no templo dos Jerónimos, tendo, no final lançado a bênção ritual aos lugres. O sr. D. Manuel Trindade Salgueiro chegou à igreja de Belém, pouco depois das 10 horas da manhã, acompanhado pelo beneficiado José Correia da Cunha.
Aguardavam o prelado à porta do templo Mons. Gonçalo Nogueira, prior de Santa Maria de Belém; rev. Armando da Anunciação, capelão da frota bacalhoeira; comandante Henrique Tenreiro, presidente da Comissão Central das Casas dos Pescadores; Engº. Higino de Queiroz, presidente da Comissão Reguladora do Comércio do Bacalhau; Otero Salgado, presidente do Grémio dos Armadores de Bacalhau, capitães dos vários lugres da frota, alunos das Casas de Pescadores, etc.
Após receber os cumprimentos dos presentes, o sr. Bispo de Helenopole seguiu processionalmente para a capela-mor do templo, onde depois de breve oração ao Santíssimo Sacramento se paramentou a fim de dar início ao Santo Sacrifício, acolitado pelos Revs. Mons. Gonçalo Nogueira, beneficiados Correia da Cunha, Marques Ferreira e Paulo Marques e Rev. Armando da Anunciação.
Na capela-mor tomaram lugar a Srª Embaixatriz de Inglaterra, os Srs. Ministros da Marinha e da Economia e subsecretários de Estado das Corporações, Previdência Social e do Comércio e Indústria, Major-general da Armada, Superintendente Geral da Armada, Director dos Serviços Marítimos, capitão do porto de Lisboa, muitos oficiais da Armada, capitães e oficiais dos vários lugres bacalhoeiros, directores dos vários Grémios de Pesca, representantes de Casas dos Pescadores de todo o País, armadores da pesca do bacalhau, etc.
A guarda de honra ao altar-mor foi feita por alunos das Escolas de Pescadores do Bom Sucesso e de Cascais. No transepto tomaram lugar os pescadores da frota e suas famílias. Às lavandas serviram ao sr. Bispo de Helenópole alguns dos tripulantes dos lugres. Ao «elevar a Deus» a fanfarra da Escola de Pescadores tocou uma marcha de continência.
Depois à comunhão acercaram-se da sagrada mesa os alunos da Escola de Pescadores, capitães, oficiais e membros da frota e muitas pessoas da família destes.
Presidiu Sua Ex.ª Rev.ma o sr. Bispo de Helenópole que celebrou missa no templo dos Jerónimos, tendo, no final lançado a bênção ritual aos lugres. O sr. D. Manuel Trindade Salgueiro chegou à igreja de Belém, pouco depois das 10 horas da manhã, acompanhado pelo beneficiado José Correia da Cunha.
Aguardavam o prelado à porta do templo Mons. Gonçalo Nogueira, prior de Santa Maria de Belém; rev. Armando da Anunciação, capelão da frota bacalhoeira; comandante Henrique Tenreiro, presidente da Comissão Central das Casas dos Pescadores; Engº. Higino de Queiroz, presidente da Comissão Reguladora do Comércio do Bacalhau; Otero Salgado, presidente do Grémio dos Armadores de Bacalhau, capitães dos vários lugres da frota, alunos das Casas de Pescadores, etc.
Após receber os cumprimentos dos presentes, o sr. Bispo de Helenopole seguiu processionalmente para a capela-mor do templo, onde depois de breve oração ao Santíssimo Sacramento se paramentou a fim de dar início ao Santo Sacrifício, acolitado pelos Revs. Mons. Gonçalo Nogueira, beneficiados Correia da Cunha, Marques Ferreira e Paulo Marques e Rev. Armando da Anunciação.
Na capela-mor tomaram lugar a Srª Embaixatriz de Inglaterra, os Srs. Ministros da Marinha e da Economia e subsecretários de Estado das Corporações, Previdência Social e do Comércio e Indústria, Major-general da Armada, Superintendente Geral da Armada, Director dos Serviços Marítimos, capitão do porto de Lisboa, muitos oficiais da Armada, capitães e oficiais dos vários lugres bacalhoeiros, directores dos vários Grémios de Pesca, representantes de Casas dos Pescadores de todo o País, armadores da pesca do bacalhau, etc.
A guarda de honra ao altar-mor foi feita por alunos das Escolas de Pescadores do Bom Sucesso e de Cascais. No transepto tomaram lugar os pescadores da frota e suas famílias. Às lavandas serviram ao sr. Bispo de Helenópole alguns dos tripulantes dos lugres. Ao «elevar a Deus» a fanfarra da Escola de Pescadores tocou uma marcha de continência.
Depois à comunhão acercaram-se da sagrada mesa os alunos da Escola de Pescadores, capitães, oficiais e membros da frota e muitas pessoas da família destes.
A alocução do sr. Bispo de Helenópole
Terminada a missa o sr. Bispo de Helenópole paramentado de pluvial, mitra e báculo tomou lugar no faldistório de onde dirigiu a sua alocução aos pescadores:
«Mais uma vez – comentou o sr. D. Manuel Trindade Salgueiro – tudo se apresta para a largada dos lugres para os bancos da Gronelândia e da Terra Nova. Uma nova campanha de pesca vai começar.
Como já um dia disse, Pescadores de Portugal, a Economia Nacional tem necessidade do vosso esforço abnegado e forte; as vossas famílias têm necessidade do vosso sacrifício de cada dia e de cada hora; Vós próprios tendes necessidade material e moral dessa labuta ingente que não podeis dispensar.
Na realidade vós não podeis viver sem o mar. E até mesmo quando em horas de revolta e tempestade fazeis o propósito de não voltar ao mar breve vos chega a nostalgia daquele amigo de todas as horas e decorridos dias, quando muito umas semanas eis que de novo sentis a atracção do abismo.
E a propósito o sr. Bispo de Helenópole evoca a figura do velho e glorioso arrais Ançã que alquebrado de anos e privações ia até à beira-mar, fazendo fala com a mão olhando a extensão infinita. Quantas recordações, quantas lembranças não desfilariam naqueles diálogos mudos. O velho arrais já não podia ir ao mar mas dir-se-ia que a sua alma continuava no Mar, como o Mar continuava na sua alma.
E o sr. D. Manuel Trindade Salgueiro continuou:- A nossa epopeia marítima nasceu dessa atracção pelo Mar. Já se escreveu que Portugal nesga de território vive entre dois azuis religiosos: o azul do céu e o azul do Mar.
Para iniciar a vossa árdua e quantas vezes heróica tarefa vai realizar-se dentro de pouco a procissão do Mar, a procissão dos lugres. E eu estou vendo em espírito aquelas outras procissões dos nossos pescadores, homens fortes e tisnados cultuando e glorificando o Senhor Jesus dos Navegantes prestando preito e veneração aos santos da sua devoção, procissões ordeiras, magnificas de respeito e esplendor.
É diferente agora esta procissão que vai sulcar as águas. Não terá o mesmo método, a mesma ordem das outras que se realizam em terra porque são fortes os ventos, alterosas e bravias as correntes, mas será uma procissão singular. De dia caminhará sob a luz acariciante do sol criador, de noite será alumiada pelos potentes holofotes de bombordo e estibordo.
E esta procissão inigualável é também uma procissão de penitência. Os que partem levam na alma, no coração, as imagens queridas dos pais, das mães, dos filhos, das esposas, dos irmãos, das irmãs, das noivas, enfim das pessoas queridas. Os que partem levam saudades, os que ficam saudades têm. É uma hora de esperança a da partida mas, também, uma hora amarga de dor.
Procissão de penitência, primeiro pela viagem que pode ser tormentosa, depois pela dureza da faina, desde o levantar ferro ao levantar o peixe com as mãos enregeladas, curtindo o frio agreste e cortante da Gronelândia e da Terra Nova, o regresso ao navio, a salgagem, a luta de semanas que em certo modo é uma luta heróica.
Procissão de penitência, mas procissão religiosa. O Mar já por si é uma imagem do próprio Deus. Nem sequer o compreendemos mas existe, como existe Deus. Deus existe, está presente em toda a parte, mas parece que nessa amplidão imensa do mar se sente mais forte a sua presença invisível, mas sempre real.
Procissão religiosa! Quem nasceu nas terras da beira-mar, terras por excelência de fé, não pode esquecer, por um momento sequer, essa cerimónia chocante que é sempre a despedida dos que se lançam à faina do mar das imagens da sua devoção: o Senhor Jesus dos Navegantes, a Senhora da Encarnação, a Senhora da Nazaré, a Senhora da Esperança.
Talvez rezem pouco. Mas toda a sua vida é já uma oração constante. Por isso esta nova campanha tinha de começar por uma cerimónia religiosa. Há pouco coloquei na patena as vossas intenções no sacrifício que ofereci por vós ao Senhor. E era bem que esta cerimónia se realizasse neste templo, onde todas as pedras velhinhas de séculos nos falam de glória de um passado magnífico e heróico de gente do mar.
Foi daqui, destas paragens, da antiga praia do Restelo, que saíram os navegadores em procissão para as caravelas que haviam de dar mundos ao mundo».
E o sr. D. Manuel Trindade Salgueiro, terminou: «Depois será o regresso. Ter-se-ão desfeito as dores logo transformadas em alegrias. E bom seria que nessa hora se realizasse um ofício de acção de graças. Dentro em pouco começará esta nova e singular procissão: velas desfraldadas, motores roncando e depois o caminho largo do Mar imenso. E eu digo como na liturgia quando se iniciam as procissões: “Ide e caminhai em paz”. Mas ainda acrescentarei: “E regressai em bem. Ide em paz na graça do Senhor e voltai com alegria sob as bênçãos de Deus».
«Mais uma vez – comentou o sr. D. Manuel Trindade Salgueiro – tudo se apresta para a largada dos lugres para os bancos da Gronelândia e da Terra Nova. Uma nova campanha de pesca vai começar.
Como já um dia disse, Pescadores de Portugal, a Economia Nacional tem necessidade do vosso esforço abnegado e forte; as vossas famílias têm necessidade do vosso sacrifício de cada dia e de cada hora; Vós próprios tendes necessidade material e moral dessa labuta ingente que não podeis dispensar.
Na realidade vós não podeis viver sem o mar. E até mesmo quando em horas de revolta e tempestade fazeis o propósito de não voltar ao mar breve vos chega a nostalgia daquele amigo de todas as horas e decorridos dias, quando muito umas semanas eis que de novo sentis a atracção do abismo.
E a propósito o sr. Bispo de Helenópole evoca a figura do velho e glorioso arrais Ançã que alquebrado de anos e privações ia até à beira-mar, fazendo fala com a mão olhando a extensão infinita. Quantas recordações, quantas lembranças não desfilariam naqueles diálogos mudos. O velho arrais já não podia ir ao mar mas dir-se-ia que a sua alma continuava no Mar, como o Mar continuava na sua alma.
E o sr. D. Manuel Trindade Salgueiro continuou:- A nossa epopeia marítima nasceu dessa atracção pelo Mar. Já se escreveu que Portugal nesga de território vive entre dois azuis religiosos: o azul do céu e o azul do Mar.
Para iniciar a vossa árdua e quantas vezes heróica tarefa vai realizar-se dentro de pouco a procissão do Mar, a procissão dos lugres. E eu estou vendo em espírito aquelas outras procissões dos nossos pescadores, homens fortes e tisnados cultuando e glorificando o Senhor Jesus dos Navegantes prestando preito e veneração aos santos da sua devoção, procissões ordeiras, magnificas de respeito e esplendor.
É diferente agora esta procissão que vai sulcar as águas. Não terá o mesmo método, a mesma ordem das outras que se realizam em terra porque são fortes os ventos, alterosas e bravias as correntes, mas será uma procissão singular. De dia caminhará sob a luz acariciante do sol criador, de noite será alumiada pelos potentes holofotes de bombordo e estibordo.
E esta procissão inigualável é também uma procissão de penitência. Os que partem levam na alma, no coração, as imagens queridas dos pais, das mães, dos filhos, das esposas, dos irmãos, das irmãs, das noivas, enfim das pessoas queridas. Os que partem levam saudades, os que ficam saudades têm. É uma hora de esperança a da partida mas, também, uma hora amarga de dor.
Procissão de penitência, primeiro pela viagem que pode ser tormentosa, depois pela dureza da faina, desde o levantar ferro ao levantar o peixe com as mãos enregeladas, curtindo o frio agreste e cortante da Gronelândia e da Terra Nova, o regresso ao navio, a salgagem, a luta de semanas que em certo modo é uma luta heróica.
Procissão de penitência, mas procissão religiosa. O Mar já por si é uma imagem do próprio Deus. Nem sequer o compreendemos mas existe, como existe Deus. Deus existe, está presente em toda a parte, mas parece que nessa amplidão imensa do mar se sente mais forte a sua presença invisível, mas sempre real.
Procissão religiosa! Quem nasceu nas terras da beira-mar, terras por excelência de fé, não pode esquecer, por um momento sequer, essa cerimónia chocante que é sempre a despedida dos que se lançam à faina do mar das imagens da sua devoção: o Senhor Jesus dos Navegantes, a Senhora da Encarnação, a Senhora da Nazaré, a Senhora da Esperança.
Talvez rezem pouco. Mas toda a sua vida é já uma oração constante. Por isso esta nova campanha tinha de começar por uma cerimónia religiosa. Há pouco coloquei na patena as vossas intenções no sacrifício que ofereci por vós ao Senhor. E era bem que esta cerimónia se realizasse neste templo, onde todas as pedras velhinhas de séculos nos falam de glória de um passado magnífico e heróico de gente do mar.
Foi daqui, destas paragens, da antiga praia do Restelo, que saíram os navegadores em procissão para as caravelas que haviam de dar mundos ao mundo».
E o sr. D. Manuel Trindade Salgueiro, terminou: «Depois será o regresso. Ter-se-ão desfeito as dores logo transformadas em alegrias. E bom seria que nessa hora se realizasse um ofício de acção de graças. Dentro em pouco começará esta nova e singular procissão: velas desfraldadas, motores roncando e depois o caminho largo do Mar imenso. E eu digo como na liturgia quando se iniciam as procissões: “Ide e caminhai em paz”. Mas ainda acrescentarei: “E regressai em bem. Ide em paz na graça do Senhor e voltai com alegria sob as bênçãos de Deus».
Condecoração de dois pescadores
Seguidamente o sr. Ministro da Marinha condecorou junto do altar-mor e na presença do sr. Bispo de Helenópole os pescadores José Matias de Oliveira e Benjamim Alexandre Branco, ambos do lugre “Hortense” que na campanha passada, nos mares da Terra Nova arriscaram a vida para salvar um companheiro em perigo.
Por último organizou-se, de novo o cortejo que conduziu sob o pálio aquele prelado até à porta principal dos Jerónimos, donde o sr. D. Manuel Trindade Salgueiro lançou a bênção do ritual aos 32 lugres que embandeirados em arco se encontravam entre as praças do Império e Afonso de Albuquerque. Às varas do pálio pegaram sempre os capitães e oficiais da frota bacalhoeira.
(In jornal “Comércio do Porto”, segunda, 21 de Abril de 1947)
Por último organizou-se, de novo o cortejo que conduziu sob o pálio aquele prelado até à porta principal dos Jerónimos, donde o sr. D. Manuel Trindade Salgueiro lançou a bênção do ritual aos 32 lugres que embandeirados em arco se encontravam entre as praças do Império e Afonso de Albuquerque. Às varas do pálio pegaram sempre os capitães e oficiais da frota bacalhoeira.
(In jornal “Comércio do Porto”, segunda, 21 de Abril de 1947)
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