domingo, 20 de fevereiro de 2011

História Tragico-Marítima (IV)


O naufrágio do vapor “Bacchante”,
na barra do rio Douro a 28 de Março de 1857

Cópia do anúncio do naufrágio
(Jornal "O Comércio do Porto", de 28 de Março de 1857

A barra do Porto acaba de sorver mais uma embarcação. O vapor inglês “Bacchante” quando no sábado vinha a entrar na barra bateu nas pedras de Felgueiras e pouco depois estava submergido, sem que tempo houvesse para salvar coisa alguma, a não ser a correspondência do consignatário e o manifesto da carga, que o comandante e o irmão daquele cavalheiro com muito risco puderam ainda ir tirar. A tripulação que constava de 24 pessoas e um passageiro que vinha a bordo, salvaram-se no bote do vapor! Consta que as catraias não se quiseram aproximar ao “Bacchante”, com receio que ele caísse sobre elas. O vapor encontrava-se pilotado.
Procedente de Londres, trazia uma carga valiosa, na qual constava perto de 3.000 sacas de arroz, uns 100 fardos de linho, alguma farinha, etc. Não existia dinheiro a bordo. Na ocasião do naufrágio o vento era de rumo noroeste (brando) e o mar estava pouco agitado. As partes telegráficas que da Foz foram transmitidas à Associação Comercial, no sábado a respeito do vapor foram as seguintes:
11 horas e 30 minutos: Apareceu a oeste o vapor “Bacchante”
2 horas e 30 minutos: O vapor “Bacchante” vindo para entrar, bateu nas pedras de Felgueiras e foi ao fundo.
2 horas e 40 minutos: O vapor “Bacchante” desfez-se em pedaços – saíram 7 catraias para o lugar do naufrágio.
4 horas e 15 minutos: Salvou-se toda a gente do vapor.
5 horas e 45 minutos: A mala das cartas que vinha no “Bacchante” perdeu-se, salvando-se apenas a correspondência do consignatário.
A parte que o piloto dirigiu à Associação Comercial é a seguinte; Ontem tendo sido chamado à barra o vapor “Bacchante”, procedente de Londres, com vários géneros aconteceu que ao vir de sul para norte a procurar o canal de «Entre as Lages», este não obedeceu de pronto; o piloto supra que se achava a bordo mandou imediatamente parar e andar com toda a força para trás, porém como levasse tempo primeiro que parasse, veio bater nas pedras de Felgueiras, chamadas «Ponta do dente» e com a agitação do mar ali se arrombou e foi ao fundo, salvando-se toda a tripulação. – Foz, 29 de Março de 1857 (ass.) Manuel Luiz Monteiro.
A praça do Porto e a imprensa estão cansadas de pedir os possíveis melhoramentos na barra. A sua voz até hoje ainda não foi escutada e já descremos que o seja. Esses terríveis escolhos têm sido a causa de tanta desgraça e de tão grandes perdas, estão aí como um padrão para atestar a nossa vergonha e quão pouco os governos se têm interessado por nós. Este tema de obras da barra já está estafado, tem-se dito tudo quanto se pode se pode dizer, mas são tão frequentes as ocasiões que se dão para clamar, que não podemos dispensar-nos de pedir mais uma vez ao governo que faça alguma coisa. Se há obra em Portugal que mereça mais pronta atenção é por certo a barra do Porto. A inércia neste caso é um crime, que cada dia se agrava mais.
No sábado ainda chegamos a dar à última hora notícia deste naufrágio nas folhas que não tinham saído do prelo. O correio porém já tinha sido expedido e em parte da cidade andava-se já fazendo a entrega do jornal.
In (Jornal “O Comércio do Porto”, de 29 de Março de 1857)

Anúncio do regresso do vapor a Londres
(Jornal "O Comércio do Porto, de 20 de Março de 1857)

O naufrágio do “Bacchante”
No lugar competente publicamos uma carta da Foz, que ontem nos dirigiram e em que se nos diz que não fomos muito exactos na notícia do naufrágio deste navio, relativamente ao salvamento dos náufragos. Não fomos testemunhas do naufrágio, escrevemos por informações e todas elas eram concordes em que as catraias nenhuns serviços haviam prestado, não se aproximando do vapor com receio de que caísse sobre elas – esta era a voz pública, na praça não corria outra coisa e até muito mais; entendemos por isso que não devíamos omitir esta circunstância na notícia. Folgaremos pois que ela não seja exacta e que os pilotos da Foz, para honra da sua corporação, se justifiquem das censuras que geralmente lhes fazem.
In (Jornal "O Comércio do Porto, de 1 de Abril de 1857

A efeméride 50 anos depois
(Jornal "O Comércio do Porto", de 7 de Abril de 1907

Mais uma vez a barra do Douro viu-se fechada por um casco atravessado no canal de navegação, situação que se repetiu ao longo dos anos. Como aconteceu com muitos navios, houve necessidade de recorrer à utilização de explosivos, de forma a destruir os vapores naufragados, evitando um extenso avolumar de trafego, ora desviado para o norte de Espanha, ou sujeito a longas demoras ancorados junto à barra, com o inconveniente de serem obrigados a suportar condições de tempo adversas.

Provavel imagem do vapor "Westminster", em 1909, naufragado
na barra do Douro, também atravessado no canal de navegação.
Imagem de autor desconhecido - colecção de Francisco Cabral

A confirmar-se ser realmente o vapor "Westminster", a água que inundou os porões foi parcialmente retirada, de forma a permitir a reflutuação. Já a navegar foi levado pela corrente para o largo, encalhando mais tarde a sul, na areia do Cabedelo. Ali pode ser reparado e reflutuado, voltando ao serviço comercial.

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