sexta-feira, 27 de março de 2015

História trágico-marítima (CXLIII)


O naufrágio do vapor “Irwin”

Cerca das 11 horas e meia da manhã de ontem, por informação fornecida pelo capitão do vapor “Thames”, soube-se na cidade que a sete milhas ao norte do porto de Leixões se encontrava um vapor encalhado. Igual comunicação foi feita pelo sr. Emmerson, capitão do vapor de pesca inglês “Cornelian”.
O vapor “Lidador”, que se emprega na fiscalização da pesca na costa e que vinha de Viana do Castelo com destino ao rio Douro aproximou-se do vapor naufragado, no intuito de lhe prestar auxílio. Como a bordo desse vapor viesse o sr. F.B. Moreton, filho do rev. Moreton recolheu-o a bordo.
Também seguiu para ali o rebocador “Lusitânia”, a fim de prestar qualquer auxílio de que o vapor carecesse. Quando o “Lusitania” regressou, o respectivo comandante declarou que o vapor encalhado era o “Irwin”, de 598 toneladas de registo, pertencente à praça de Newport.
O sinistro deu-se às 6 horas da madrugada, devido à densa névoa, indo o “Irwin” de encontro a umas pedras na praia de Vila Chã, sofrendo rombos desde a proa até meio do navio. Tanto o porão da proa como a casa da máquina e da caldeira foram invadidas pela água.
A tripulação tem permanecido a bordo por o mar se conservar calmo. No entanto os escaleres estão sempre de prevenção para serem lançados à água, no caso de a tripulação correr perigo. O “Irwin”, que pertence à firma T. Pugsley, de Newport, procedia dali conduzindo cerca de 1.200 toneladas de carvão, consignado à firma J.H. Andresen, Sucessores, da praça do Porto.
Os rebocadores “Mars” e “Águia” também foram até quase junto do vapor encalhado, a fim de prestar qualquer auxílio, não chegando, porém, a prestá-lo, por haver poucas probabilidades de salvar o “Irwin”, pois que os rombos sofridos são grandes, tendo até entrado por um deles a ponta de uma rocha. Próximo do vapor naufragado também estiveram inúmeros barcos de pesca.
Para Vila Chã, a tomar as previdências de uso em tais casos, partiu, por parte da Alfândega, o sr. Joaquim Lobo de Ávila, chefe da delegação de Leixões.
O “Irwin”, que foi construído em 1883, é comandado pelo sr. W. Humphrey e empregava-se no transporte de carvão para o Porto e no de toros de pinheiro daqui para Newport e Cardiff. Uma parte do vapor está debaixo de água.
(In jornal “Comércio do Porto”, terça, 11 de Setembro de 1906)

Características do navio
Nº Oficial: N/s - Iic: N/s - Porto de registo: Newport
Armador: T. Pugsley & Co., Newport
Construtor: Kish, Boolds & Co., Sunderland, 20.03.1883
Arqueação: 989,00 tons
Dimensões: Pp 67,10 mts - Boca 9,60 mts
Propulsão: 1 motor compósito

Ainda o naufrágio
Acerca do naufrágio do vapor inglês “Irwin” na praia de Vila Chã há a acrescentar os seguintes pormenores:
Eram 5 horas da madrugada de ante-ontem (10 de Setembro) quando aquele vapor, nas alturas da Póvoa de Varzim, começou a sentir dificuldade em avançar, por causa da densa cerração que o envolvia.
Ao chegar à praia de Vila Chã, o capitão sr. W. Humphrey, aliás homem muito experimentado nas lides do mar, fez encaminhar o vapor em direcção àquela praia, julgando tomar o rumo da entrada do rio Douro. De repente deu-se um choque violentíssimo de encontro aos cachopos. O maquinista chegou a inverter a marcha do vapor para evitar o encalhe, mas não o conseguiu. O “Irwin” tem a proa voltada para terra e a ré um pouco inclinada para estibordo.
O passageiro sr. F.B. Moreton foi recolhido a bordo do rebocador “Lidador”, bem como as suas bagagens, incluindo uma bicicleta.
Os numerosos barcos de pescadores de Fão, que rodearam o vapor naufragado, receberam da tripulação os mantimentos que este tinha a bordo.
O casco do “Irwin” considera-se completamente perdido. A casa Garland, Laidley & Cª. foi incumbida de retirar de bordo o carregamento, que consta de 1.200 toneladas de carvão. A descarga começou ontem a ser feita, seguindo para ali, para esse fim, uma fragata rebocada pelo vapor “Mars”.
Ante-ontem à noite a tripulação abandonou o “Irwin”, mas voltou ontem de manhã para bordo, onde também esteve o sr. Andresen, que foi para ali no rebocador “Águia”.
O sr. W. Humphrey, que há cerca de 17 anos comandava o “Irwin” e é natural do Norte da Escócia, esteve nos escritórios dos srs. J.H. Andresen, Sucessores, onde lhe foi entregue uma carta que lhe era dirigida. O sr. Humphrey também esteve no departamento marítimo do norte e no consulado Inglês, onde explicou o que dera origem ao naufrágio.
Na praia fronteira ao ponto onde se encontra encalhado o “Irwin” está postada uma força de 15 praças da guarda-fiscal, sob o comando de um cabo, para evitar o extravio dos salvados. Tanto o vapor como a carga parece que estão seguros em Companhias estrangeiras.
O “Irwin”, que ainda há pouco recebera algumas reparações, já há cerca de ano e meio, quando saía a barra do rio Douro, ao fim da tarde, encalhou na restinga do Cabedelo, conseguindo safar cinco horas depois.
(In jornal “Comércio do Porto”, quarta, 12 de Setembro de 1906)

Ainda o naufrágio do “Irwin”
O vapor “Irwin”, encalhado em frente da praia de Vila Chã, sete milhas ao norte do porto de Leixões, continua na mesma posição, tendo sido ontem retirada de bordo grande quantidade de carvão do carregamento que conduzia.
A tripulação conservou-se ainda parte do dia a bordo do vapor, retirando de tarde para o Porto, ficando hospedada no Hotel Malhão, à rua do Comércio do Porto.
O capitão está tratando de elaborar o relatório acerca do naufrágio.
(In jornal “Comércio do Porto”, quinta, 13 de Setembro de 1906)

Ainda o naufrágio
O vapor inglês “Irwin”, que há dias, encalhou numas pedras em frente à praia de Vila Chã, continua na mesma posição, tratando-se presentemente de retirar de bordo a carga, apetrechos, mobiliário, etc.
Como o mar se tem conservado bonançoso, cerca de 20 trabalhadores conseguiram retirar do vapor naufragado para uma fragata 40 toneladas de carvão, aproximadamente, sendo depois essa barcaça rebocada pelo vapor “Mars”, ambas pertencentes à casa Garland, Laidley & Cª.
Este trabalho de descarga tornou-se bastante dificultoso, em virtude da água ter invadido o porão da ré e não haver fundo suficiente para as fragatas poderem aproximar-se convenientemente do porão da proa. Sobe já a 100 toneladas a quantidade de carvão retirado de bordo do “Irwin”.
Por volta da uma hora da tarde, em consequência da baixa-mar, a fragata que estava a ser carregada teve de ir para junto da ré do vapor, sendo tomada então a resolução de proceder ao salvamento dos instrumentos, peças de metal e bagagens, demorando este trabalho até depois das 5 horas. Após isto todo o pessoal retirou de bordo, indo o imediato e o primeiro engenheiro para a praia de Vila Chã e vindo o resto da tripulação na fragata para o rio Douro.
Presume-se que venha de Inglaterra um técnico para verificar se o “Irwin” poderá ou não ser posto a flutuar.
(In jornal “Comércio do Porto”, sexta, 14 de Setembro de 1906)


O vapor “Irwin”
Na delegação aduaneira de Leixões realizou-se ontem, efectivamente, a arrematação, em hasta pública, do visto e não visto da carga e casco do vapor “Irwin”, que há tempos naufragou em frente à praia de Vila Chã.
A carga não vista (carvão) foi arrematada pelo sr. Alfredo José da Silva, pela quantia de 110$000 réis; e o casco, visto e não visto, pelo sr. António Guedes, por 356$000 réis.
(In jornal “Comércio do Porto”, sexta, 21 de Setembro de 1906)

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