O naufrágio do “Vestris”
2ª Parte
Postal ilustrado da Companhia Lamport & Holt
Identificação do vapor “Vestris”
Identificação do vapor “Vestris”
Armador: Liverpool, Brazil & Riverplate Steam Navigation Co., Ltd. - (Lamport & Holt Line) - Liverpool
Nº Oficial: 131451 - Iic.: H.W.N.K. - Registo: Liverpool
Construtor: Workman, Clark & Co., Ltd., Belfast, 09.1912
Arqueação: Tab 10.494,00 tons - Tal 6.623,00 tons
Dimensões: Pp 151,03 mts - Boca 18,53 mts - Pontal 8,75 mts
Propulsão: Do construtor, 1:Qe - 8:Ci - 1.243 Nhp - 13,5 m/h
Passageiros: Max 610 = 1ª/280 - 2ª/130 - 3ª/200
Nº Oficial: 131451 - Iic.: H.W.N.K. - Registo: Liverpool
Construtor: Workman, Clark & Co., Ltd., Belfast, 09.1912
Arqueação: Tab 10.494,00 tons - Tal 6.623,00 tons
Dimensões: Pp 151,03 mts - Boca 18,53 mts - Pontal 8,75 mts
Propulsão: Do construtor, 1:Qe - 8:Ci - 1.243 Nhp - 13,5 m/h
Passageiros: Max 610 = 1ª/280 - 2ª/130 - 3ª/200
O paquete naufragou na posição 37º25’N 70º33’O, ao largo de Hampton Roads, Norfolk, no Estado americano da Virgínia, no dia 12 de Novembro de 1928. Em resultado do sinistro foram contabilizadas 112 vítimas.
Impressionantes narrativas dos sobreviventes
Cenas pavorosas e tétricas
Cenas pavorosas e tétricas
Rio de Janeiro, Dezembro de 1928 – Quando o “Southern Cross” atracou ao cais do porto, uma chusma de repórteres invadiu o navio. Havia, no Rio, a maior ansiedade em ouvirem-se, da boca dos sobreviventes da horrorosa catástrofe, os relatos, os pormenores de como o naufrágio se dera. Muitos dos passageiros do “Vestris” destinavam-se ao Rio. Muitos viviam aqui; alguns eram brasileiros, como essa desventurada jovem Iracema Cabral – de quem até hoje não houve mais notícias.
O primeiro náufrago a ser entrevistado foi o engenheiro Paulo Dana, da Radio Corporation of America. Eis o que ele disse textualmente a um redactor do jornal «O Globo»:
- O naufrágio do “Vestris”, foi um assassínio em alto mar, como muito bem classificaram os jornais norte-americanos. A causa principal de tudo foi ter ficado aberta uma das portas da carvoaria, o que não foi percebido em Nova York, quando o navio meteu carvão. Quando foi notada a falta, já o compartimento da carvoaria estava completamente cheio de água.
- O comandante teve muito tempo de evitar o naufrágio. Assim não procedeu, no entanto, porque desejou fazer economias de algumas centenas de dólares, que a Lamport teria que pagar ao navio que prestasse os primeiros socorros ao “Vestris”. A sua consciência acusou a sua falta. A sua morte, que foi de um bravo marinheiro, demonstrou bem que a sua consciência o acusava de uma grave falta.
- Ao deixar o porto de Nova York, sábado, 10 de Dezembro, às 4 horas e meia da tarde, o “Vestris” inclinava-se um tanto para estibordo. À medida que o vapor navegava, a inclinação aumentava. A quatro horas de viagem, desencadeou-se um fortíssimo temporal, ameaçador, horrível, parecendo, na sua fúria, querer arrebentar o navio, cuja marcha teve de ser reduzida.
- Ao amanhecer de Domingo mais se fazia sentir a inclinação e não amainava a tempestade. Os móveis todos de bordo, inclusive o piano, deslocaram-se e a gente mal se podia conter de pé. Apenas umas seis pessoas conseguiram ir à mesa para as refeições. Não obstante a situação do navio, não se notava temor entre os passageiros. Somente às 10 horas de segunda-feira, foi que o comandante Carey determinou que o telegrafista pedisse socorro. O comandante tardou em fazê-lo, pensando que ainda podia salvar o navio e na esperança de que não tardaria a cruzar-se com o “Voltaire”, da mesma Companhia – a Lamport & Holt – em viagem para Nova York, de regresso dos portos sul-americanos. Este, porém, devido à tormenta, teve uma das hélices quebradas e, assim, obrigado a atrasar a viagem.
- Foi atirada ao mar a carga mais pesada, no entanto, sem resultados práticos, porque a inclinação aumentava e a água já invadia o navio, tendo chegado mesmo ao meu camarote e aos dos outros passageiros. Não se sabe ao certo como e por onde entrava a água. A suposição era e é que ela vinha de baixo e encontrava fácil passagem pela porta lateral exterior, pela qual o navio havia recebido o fornecimento do carvão.
- Esta porta, segundo consta, foi mal fechada, quando o “Vestris” largou e, naquele momento, perigando a situação do navio, era impossível tentar fecha-la porque o carvão ali acumulado, junto à mesma, era uma barreira intransponível!
- O que me causou impressão foi que, ao contrário do que é de supôr, os passageiros não se deixaram dominar pelo pavor, não houve mesmo pânico, e o embarque nos botes de salvamento foi feito com relativa calma, sob a direcção dos oficiais. Todos, já munidos de coletes salva-vidas, ao receberem ordens para tal, dirigiram-se para os botes que lhes foram designados.
- O bote em que eu devia embarcar, ao ser descido dos turcos, bateu fortemente de encontro às chapas do navio, recebendo avarias, que foram concertadas ali mesmo pelos tripulantes, com uma simples folha-de-Flandres. Não oferecia, portanto, segurança a pequena embarcação e pensei em não tomar lugar nela. Mas não havia outro recurso e, no interior da mesma me arranjei da melhor maneira, com 31 pessoas, dentre as quais 10 mulheres, duas crianças e quatro negros, que não faziam outra coisa senão rezar e exclamar: «Deus não abandonará os seus filhos». Os botes começaram a ser descidos à água às 13 horas. Aparecera, então, o sol, mas o mar continuava revolto.
- A embarcação em que eu me encontrava, cerca de meia hora depois de estar na água, virou. Com dificuldades inauditas, conseguimos voltá-la e nela embarcar novamente. Fizemo-lo três vezes. Já então, de 31 pessoas que éramos, estávamos reduzidos a quatro apenas. As outras haviam encontrado a morte sob a embarcação, pois não pudemos tornar a endireita-la, exaustos que estávamos. Foi nessa ocasião, que vi uma perna aparecer debaixo do barco, de onde eu conseguira safar-me, depois de ferido no pescoço.
- O naufrágio do “Vestris”, foi um assassínio em alto mar, como muito bem classificaram os jornais norte-americanos. A causa principal de tudo foi ter ficado aberta uma das portas da carvoaria, o que não foi percebido em Nova York, quando o navio meteu carvão. Quando foi notada a falta, já o compartimento da carvoaria estava completamente cheio de água.
- O comandante teve muito tempo de evitar o naufrágio. Assim não procedeu, no entanto, porque desejou fazer economias de algumas centenas de dólares, que a Lamport teria que pagar ao navio que prestasse os primeiros socorros ao “Vestris”. A sua consciência acusou a sua falta. A sua morte, que foi de um bravo marinheiro, demonstrou bem que a sua consciência o acusava de uma grave falta.
- Ao deixar o porto de Nova York, sábado, 10 de Dezembro, às 4 horas e meia da tarde, o “Vestris” inclinava-se um tanto para estibordo. À medida que o vapor navegava, a inclinação aumentava. A quatro horas de viagem, desencadeou-se um fortíssimo temporal, ameaçador, horrível, parecendo, na sua fúria, querer arrebentar o navio, cuja marcha teve de ser reduzida.
- Ao amanhecer de Domingo mais se fazia sentir a inclinação e não amainava a tempestade. Os móveis todos de bordo, inclusive o piano, deslocaram-se e a gente mal se podia conter de pé. Apenas umas seis pessoas conseguiram ir à mesa para as refeições. Não obstante a situação do navio, não se notava temor entre os passageiros. Somente às 10 horas de segunda-feira, foi que o comandante Carey determinou que o telegrafista pedisse socorro. O comandante tardou em fazê-lo, pensando que ainda podia salvar o navio e na esperança de que não tardaria a cruzar-se com o “Voltaire”, da mesma Companhia – a Lamport & Holt – em viagem para Nova York, de regresso dos portos sul-americanos. Este, porém, devido à tormenta, teve uma das hélices quebradas e, assim, obrigado a atrasar a viagem.
- Foi atirada ao mar a carga mais pesada, no entanto, sem resultados práticos, porque a inclinação aumentava e a água já invadia o navio, tendo chegado mesmo ao meu camarote e aos dos outros passageiros. Não se sabe ao certo como e por onde entrava a água. A suposição era e é que ela vinha de baixo e encontrava fácil passagem pela porta lateral exterior, pela qual o navio havia recebido o fornecimento do carvão.
- Esta porta, segundo consta, foi mal fechada, quando o “Vestris” largou e, naquele momento, perigando a situação do navio, era impossível tentar fecha-la porque o carvão ali acumulado, junto à mesma, era uma barreira intransponível!
- O que me causou impressão foi que, ao contrário do que é de supôr, os passageiros não se deixaram dominar pelo pavor, não houve mesmo pânico, e o embarque nos botes de salvamento foi feito com relativa calma, sob a direcção dos oficiais. Todos, já munidos de coletes salva-vidas, ao receberem ordens para tal, dirigiram-se para os botes que lhes foram designados.
- O bote em que eu devia embarcar, ao ser descido dos turcos, bateu fortemente de encontro às chapas do navio, recebendo avarias, que foram concertadas ali mesmo pelos tripulantes, com uma simples folha-de-Flandres. Não oferecia, portanto, segurança a pequena embarcação e pensei em não tomar lugar nela. Mas não havia outro recurso e, no interior da mesma me arranjei da melhor maneira, com 31 pessoas, dentre as quais 10 mulheres, duas crianças e quatro negros, que não faziam outra coisa senão rezar e exclamar: «Deus não abandonará os seus filhos». Os botes começaram a ser descidos à água às 13 horas. Aparecera, então, o sol, mas o mar continuava revolto.
- A embarcação em que eu me encontrava, cerca de meia hora depois de estar na água, virou. Com dificuldades inauditas, conseguimos voltá-la e nela embarcar novamente. Fizemo-lo três vezes. Já então, de 31 pessoas que éramos, estávamos reduzidos a quatro apenas. As outras haviam encontrado a morte sob a embarcação, pois não pudemos tornar a endireita-la, exaustos que estávamos. Foi nessa ocasião, que vi uma perna aparecer debaixo do barco, de onde eu conseguira safar-me, depois de ferido no pescoço.
O vapor "Southern Cross" que transportou náufragos para o Brasil
- Num esforço, consegui puxar a perna e salvei, assim, da morte, uma jovem, camareira de bordo, miss Clara Ball. O “Vestris” foi lentamente adernando para um dos lados. Quando este já tocava a água, cerca de 40 pessoas, que ainda se achavam no convés, porque não quiseram embarcar nos botes, atiraram-se ao mar. Vi, no meio delas, o comandante Carey, que nadou alguns momentos, desaparecendo em seguida.
- Mais alguns momentos e o “Vestris”, já completamente deitado sobre um dos lados, submergiu em menos de 30 segundos. Passado pouco tempo, não distinguia mais ninguém. Ao meu lado estava apenas a senhora Ball, que, como eu, estava com colete salva-vidas, segurando-se ao estrado de madeira do bote em que tínhamos estado. Ela demonstrou-se corajosa e somente se queixou de fortes dores pelo corpo.
- Veio a noite, e de indescritível horror era a nossa situação. Sentimos sede, muita sede, e como então chovesse, abríamos a boca, levantando-a para cima, a fim de colher as gotas de água caídas do céu. Receamos que um tubarão nos atacasse e me comesse uma das pernas ou mesmo as duas e também as da minha companheira de infortúnio. Não sentíamos frio, porque na zona onde nos encontrávamos, a água do mar é morna, devido a ser atravessada pela corrente do golfo do México. Eu e a camareira expandíamos a nossa indignação contra o comandante Carey, recriminando-o por não ter pedido socorro, logo que a situação do navio se tornou perigosa.
- À meia-noite, provavelmente, distinguimos luzes ao longe e nos reanimamos, cheios de esperança. Ao amanhecer, porém, o desânimo apoderou-se de nós, quando nada vimos, nem perto nem longe. Seriam talvez 9 horas, quando passou distante um navio de guerra, que soubemos, depois de salvos, tratar-se do “Wyoming”. Só mais tarde o “American Shipper” apareceu. Rasguei a camisa que vestia e com ela acenei na direcção do navio salvador.
- O estrado de madeira, ao qual nos segurávamos, já estava todo quebrado, recorrendo a um esforço continuo para detê-lo. Com a aproximação do “America Shipper”, munidos que estávamos do colete salva-vidas, pusemo-nos a nadar. Em breve, o navio chegava próximo de nós. Estávamos completamente exaustos e não tínhamos mais forças nem para subir para bordo do “American Shipper”. Foi preciso que nos içassem como carga, dentro de uma rede de corda. Foi nesse momento que vimos, com horror, o cadáver de um homem a ser comido por dois tubarões.
- Estávamos, enfim, salvos e cercados de todo o conforto possível, ali a bordo. Foi, então, que lastimei, pesaroso, ter perdido os meus tacos de pólo e um presente que trazia para a minha noiva!
- Mais alguns momentos e o “Vestris”, já completamente deitado sobre um dos lados, submergiu em menos de 30 segundos. Passado pouco tempo, não distinguia mais ninguém. Ao meu lado estava apenas a senhora Ball, que, como eu, estava com colete salva-vidas, segurando-se ao estrado de madeira do bote em que tínhamos estado. Ela demonstrou-se corajosa e somente se queixou de fortes dores pelo corpo.
- Veio a noite, e de indescritível horror era a nossa situação. Sentimos sede, muita sede, e como então chovesse, abríamos a boca, levantando-a para cima, a fim de colher as gotas de água caídas do céu. Receamos que um tubarão nos atacasse e me comesse uma das pernas ou mesmo as duas e também as da minha companheira de infortúnio. Não sentíamos frio, porque na zona onde nos encontrávamos, a água do mar é morna, devido a ser atravessada pela corrente do golfo do México. Eu e a camareira expandíamos a nossa indignação contra o comandante Carey, recriminando-o por não ter pedido socorro, logo que a situação do navio se tornou perigosa.
- À meia-noite, provavelmente, distinguimos luzes ao longe e nos reanimamos, cheios de esperança. Ao amanhecer, porém, o desânimo apoderou-se de nós, quando nada vimos, nem perto nem longe. Seriam talvez 9 horas, quando passou distante um navio de guerra, que soubemos, depois de salvos, tratar-se do “Wyoming”. Só mais tarde o “American Shipper” apareceu. Rasguei a camisa que vestia e com ela acenei na direcção do navio salvador.
- O estrado de madeira, ao qual nos segurávamos, já estava todo quebrado, recorrendo a um esforço continuo para detê-lo. Com a aproximação do “America Shipper”, munidos que estávamos do colete salva-vidas, pusemo-nos a nadar. Em breve, o navio chegava próximo de nós. Estávamos completamente exaustos e não tínhamos mais forças nem para subir para bordo do “American Shipper”. Foi preciso que nos içassem como carga, dentro de uma rede de corda. Foi nesse momento que vimos, com horror, o cadáver de um homem a ser comido por dois tubarões.
- Estávamos, enfim, salvos e cercados de todo o conforto possível, ali a bordo. Foi, então, que lastimei, pesaroso, ter perdido os meus tacos de pólo e um presente que trazia para a minha noiva!
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